Crise e seca põem fim ao “crescimento chinês” da Argentina
Os tempos de crescimento ''asiático'' ficaram definitivamente para trás. Depois de seis anos crescendo a um ritmo médio de 8,5% (60% de expansão acumulada desde a crise de 2001), números preliminares indicam que a economia argentina fechou 2008 com menos
Publicado 06/02/2009 10:30
A crise internacional explica parte da reversão, mas não toda. Na verdade, o PIB argentino já vinha se desacelerando desde o início de 2008, por causa da alta da inflação e pela queda da produção e exportação agrícola.
Ao contrário do que aconteceu com o Brasil, a Argentina não sofreu tanto com a falta de crédito decorrente desta crise que se gerou dentro do sistema financeiro dos países centrais. É que, devido à moratória da dívida externa declarada em 2002, o país perdeu o acesso ao mercado de crédito. O isolamento evitou, portanto, o contágio da crise pela bancarrota dos grandes bancos americanos e europeus, mas, por outro lado, é um dos maiores empecilhos para um aumento dos investimentos produtivos no país.
A crise bateu forte em alguns dos setores mais importantes da economia argentina como o automobilístico e o agropecuário. Além de geradores de divisas, eles contribuem com grande parte do caixa do governo, o que indica um risco ao equilíbrio das contas públicas.
''A queda dos preços das commodities é o canal de transmissão da crise para a Argentina'', definiu Diego Coatz, economista da União Industrial Argentina (UIA).
Seca
À queda forte dos preços internacionais dos principais produtos de exportação (trigo, milho, soja e girassol) se somou a mais grave seca em 50 anos. Estima-se que a perda de produção este ano chegará a 30% da safra de grãos.
As exportações agropecuárias, que no ano passado totalizaram US$ 28 bilhões, representam 40% das exportações totais da Argentina. O setor ainda contribui com cerca de 14% da arrecadação do Tesouro, através do pagamento de direitos de exportações de grãos, carnes e laticíneos.
A perda de receitas com as exportações compromete o ajuste fiscal do governo, que necessita um superávit primário mínimo de 30 bilhões de pesos (aproximadamente US$ 8,5 bilhões) para cumprir com todas as suas obrigações, calcula Melconian. Dados oficiais divulgados na terça-feira pela Afip, a Receita Federal argentina, mostraram que a arrecadação tributária em janeiro cresceu 11% comparado a janeiro de 2008, o menor ritmo desde abril de 2006.
Do total arrecadado, de 24,1 bilhões de pesos, só a seguridade social registrou aumento expressivo (70%) graças à estatização do sistema privado aprovada em novembro pelo Congresso. O valor arrecadado com o Imposto de Renda subiu apenas 0,2%, enquanto o IVA (imposto sobre comércio de bens e serviços) caiu 0,3% e os impostos sobre o comércio exterior (direitos sobre exportações e importações) caíram nada menos que 25%.
Estímulo ao consumo
Na tentativa de conter os efeitos da crise internacional, a presidente Cristina Kirchner optou por estimular o consumo para manter a atividade econômica doméstica, receita que vem sendo aplicada desde 2004 quando o ex-presidente (e marido de Cristina) Néstor Kirchner assumiu o poder. Desde dezembro foram lançados diversos programas de incentivo tributário e creditício para aquisição de automóveis, geladeiras, fogões e equipamentos de calefação.
Segundo entidades ligadas aos fabricantes, os incentivos estão funcionando relativamente bem para a linha branca, mas os resultados com automóveis são fracos. Também foram lançados programas de obras públicas no valor de US$ 21 bilhões, medidas para proteger a economia da concorrência de importados, crédito às micro e pequenas empresas e um plano para trazer de volta ao sistema oficial dinheiro da poupança de argentinos que está no exterior ou guardado ''debaixo do colchão''.
Enrique Mantilla, presidente da Câmara de Exportadores da República Argentina (Cera), diz que o único incentivo às exportações nos pacotes recentes foi a licitação entre os bancos de US$ 50 milhões em recursos da seguridade social para pré-financiamento a juros subsidiados. Dado o valor das exportações, diz Mantilla, isso é praticamente nada.
Na área cambial, enquanto Chile, México e Brasil desvalorizaram suas moedas entre 20% e 30%, o peso argentino desvalorizou-se apenas 15% frente ao dólar desde o início da crise. A alta da inflação, somada ao atraso no ajuste cambial, fez com que o câmbio real (descontada a inflação) ficasse 10% a 15% acima do que a indústria considera como ''câmbio de equilíbrio'', calcula Coatz.
Fonte: Valor Econômico