Ação do Araguaia demora e 50% dos autores morreram
Vinte e sete anos depois de aberta, a ação judicial que pretende obrigar a União a apresentar documentos sobre o conflito e apontar a localização das sepulturas dos militantes de esquerda mortos na guerrilha do Araguaia (1972-1975) permanece insolúvel.
Publicado 09/02/2009 19:01
Quando a ação foi proposta, em 19 de fevereiro de 1982, o presidente era o general João Figueiredo (1918-1999), a moeda, o cruzeiro e a novela que fazia sucesso, “Elas por Elas”.
A ação foi proposta por 22 pessoas, cujos nomes constam até hoje dos registros judiciais por onde a ação passeou -Justiça Federal de primeira instância no Distrito Federal, Tribunal Regional Federal e Supremo Tribunal Federal.
Segundo levantamento feito pela Folha a partir de dados da comissão de familiares de mortos e desaparecidos, dos 22 autores, 11 morreram. Eram mães e pais de parte dos militantes do Araguaia -foco guerrilheiro criado pelo PCdoB com a intenção de enfrentar a ditadura militar. Morreram no conflito cerca de 60 guerrilheiros.
A maioria dos pais morreu antes mesmo de comemorar a sentença de primeira instância de 2003, proferida pela juíza Solange Salgado, que reconheceu o direito de eles terem acesso aos documentos. A vitória, porém, teve gosto passageiro, já que a União recorreu e o caso foi parar no STJ (Superior Tribunal de Justiça) e, de lá, no STF (Supremo Tribunal Federal). Pelo menos cinco anos de demora na tramitação do processo se devem a recursos protocolados pela AGU (Advocacia Geral da União) já no governo de Lula. No início deste ano, a ação transitou em julgado, não cabendo mais recurso.
Sem informação
Seis anos antes da primeira decisão da juíza, em 1997, morreu o bancário Edwin Costa, aos 87, de enfisema pulmonar. Era pai de Walkíria Costa, estudante de Patos de Minas (MG), dada como desaparecida no Araguaia aos 26 anos.
Sua irmã, Waléria, aguarda o desfecho da ação, mas disse não ter recebido informações suficientes do advogado do caso, o ex-deputado federal Luiz Eduardo Greenhalgh (PT-SP), reclamação que surgiu nas conversas com outros familiares.
Waléria, 55, disse não ter muitas esperanças de ver o governo revelar seus arquivos. “Acho que, enquanto estivermos vivos, eles vão ocultar a verdade. Estão nos esperando morrer primeiro”, disse ela.
Os autores originais da ação demonstram cansaço com a demora. “Não estamos sendo informados por nenhum órgão competente”, disse a costureira aposentada Maria Leonor Pereira Marques, 80, mãe do militante do PCdoB Paulo Roberto Pereira Marques. Funcionário do Banco de Minas Gerais, Marques desapareceu aos 24 anos no dia de Natal de 1973, após um ataque do Exército a um acampamento da guerrilha.
Nos anos 90, Maria Leonor propôs uma ação de indenização e recebeu apenas R$ 98 mil, em uma única parcela, pelo desaparecimento do filho.
Por e-mail, o advogado Greenhalgh negou que as famílias não estejam recebendo dados sobre a ação judicial. Citou como exemplo a última petição a que deu entrada, em 11 de julho, e que teria sido copiada para três dos familiares. “Dessa iniciativa demos ciência aos familiares. (…) Assim, não é verdade que os parentes não têm sido suficientemente informados do processo e sobre isso não há que se fazer intrigas”, afirmou o advogado.
A AGU informou na semana passada que quer fazer cumprir a ordem da juíza. Peticionou na ação, contudo, para obter uma nova citação e só então promover a abertura dos arquivos. O procurador da República Rômulo Moreira Conrado disse no processo que a União já teve tempo para organizar os documentos. Pediu que os dados sejam entregues em 15 dias, sob pena de multa diária de R$ 10 mil. O juiz substituto da 1ª Vara Federal não havia decidido sobre o pedido do procurador até sexta. O processo está “concluso para despacho” do juiz titular desde 24 de novembro de 2008.
Com informações da Folha de S. Paulo