Irmãos Aniceto & Orquestra de Câmara Eleazar de Carvalho lançam DVD

Que feição pode ter o encontro da cultura popular com a música de concerto? A resposta está no DVD Irmãos Aniceto & Orquestra de Câmara Eleazar de Carvalho, que será lançado hoje (3), logo mais à noite, no Theatro José de Alencar. De um lado, a banda cabaçal que surgiu no século XIX na cidade do Crato com o agricultor José Lourenço da Silva, que fabricava os próprios instrumentos de sopro e percussão, como pífanos, zabumba, caixa e pratos de metal. Do outro, a orquestra cearense fundada em 1996, dedicada à formação de plateia para música de concerto, com repertório que abrange obras do barroco, do clássico e do romântico, além de compositores modernos e contemporâneos. No DVD, banda cabaçal e orquestra trocam figurinhas e dividem o mesmo show. Na noite de lançamento, a plateia poderá conferir a apresentação ao vivo.

Capitaneado pela Secretaria de Cultura do Estado (Secult), o registro audiovisual é lançado mais de um ano depois das gravações, que ocorreram nos dias 29 de fevereiro, 1° e 2 de março de 2008, no mesmo palco. O concerto já existia há dez anos. No IV Festival de Música da Serra da Ibiapaba, em 2007, o governador Cid Gomes teve a ideia de gravar o espetáculo. Ao custo de R$ 450 mil, o DVD é dirigido pelo cineasta carioca Sérgio Rezende (Zuzu Angel e Onde Anda Você), o que gerou, à época, polêmica entre os realizadores cearenses de audiovisual. A queixa era por conta dos critérios de escolha do diretor, baseados, em princípio, no gosto pessoal do governador. Com tiragem de 3.000 exemplares, a distribuição do DVD será divida em três cotas: uma para o Governo do Estado (que repassará exemplares gratuitamente para equipamentos culturais e bibliotecas), outra para os Irmãos Aniceto e uma última para a Orquestra de Câmara Eleazar de Carvalho (estas duas serão comercializadas ao público).

No DVD, a orquestra abre o concerto com a música considerada hino do nordeste brasileiro: Asa Branca, de Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira, composta em 1947. Depois é a vez de executar Mulher Rendeira, de Radamés Gnattali, canção que é cercada pela lenda de que teria sido feita por Lampião. É somente na terceira música que sobe ao palco do Theatro josé de Alencar a banda cabaçal dos Irmãos Aniceto com a Marcha de Chegada. Mestre Antonio (primeiro pífano), Mestre Raimundo (segundo pífano), José Vicente (caixa), José Adriano (zabumba), José Joval (pratos) e Cícero (caixa) chegam, aparentemente acanhados, de chinelos de couro nos pés, calças azuis, camisa de botão amarela e chapéu na cabeça.

A partir daí, começa o diálogo bonito de ver e ouvir entre o erudito e o popular. Os Aniceto tocam e a orquestra acompanha, numa mistura harmoniosa de sons de flautas com pífanos, zabumba e violinos, pratos e violoncelos. São nove músicas tocadas em conjunto, entre elas, composições do grupo cabaçal, como Forró do Mestre Antônio, Baião Velho e Forró Pesado. Com qualidade de imagem cinematográfica, as câmeras, ora estáticas ora em movimento, fecham a imagem em detalhes nas mãos dos músicos da orquestra, passeiam pelos pés dos Aniceto, depois abrem uma panorâmica do palco iluminado em contraste com a plateia na penumbra. Em outros momentos, a câmera “voa” sobre a audiência, noutras se “esconde” por detrás dos músicos. Um dos recursos mais recorrentes na gravação é uma câmera que se move sobre um carrinho (travelling) mostrando o palco de ponta a ponta.

O momento mais animado da apresentação está por vir. A orquestra se despede e o palco é todo dos Aniceto. Muda o cenário, muda a iluminação. Uma espécie de cortina com enormes flores e fitilhos desce por detrás dos Aniceto (numa bonita cenografia assinada por Fernando Mello). O lugar se torna mais colorido e claro. Nesse momento, os Aniceto parecem mais soltos, mais à vontade no palco. Eles mostram sua faceta “moleque”: dançam, cantam, representam e fazem graça. Começam com Marcha Estradeira, depois vêm com Baião Trancelim, numa dança, como sugere o título, toda entrelaçada, em seguida tocam a Dança do Marimbondo. “Agora vamos mostrar como o agricultor briga com as abelhas na roça”, anuncia José Adriano, com sua zabumba nos braços. Depois é a vez de Severino Brabo e Briga de Galo. Essas duas com direito a malabarismos e luta com facões. Até que a apresentação chega ao fim com Quilariô (um das poucas cantadas) e Marcha Saideira.

Além do show, o DVD conta com a opção de extras. Neles há fotos, uma biografia dos Aniceto assinada pelo diretor musical do grupo Calé Alencar e apenas um documentário de cerca de 30 minutos Os Aniceto (e não três como havia sido divulgado anteriormente pela Secult). Gravado na cidade do Crato, onde vive a família Aniceto, o vídeo traz depoimentos dos integrantes a respeito da história da banda e do dia-a-dia simples de agricultores. “A gente só faz assinar o nome. Quem é da roça não aprende a ler porque a roça come”, conta Mestre Raimundo. Entre as histórias mais curiosas, está a que dá conta do dia em que o patriarca da família e fundador da banda, José Lourenço da Silva, – que, segundo os filhos, viveu até os 104 anos, – brigou sozinho com uma onça. Vale a pena conferir.

SERVIÇO

Lançamento do DVD da Orquestra de Câmara Eleazar de Carvalho e Irmãos Aniceto – Hoje (3), a partir das 18h30min, no Theatro José de Alencar (Praça José de Alencar, s/n – Centro). Na ocasião, será apresentado o concerto com a orquestra e a banda cabaçal ao vivo. Entrada franca (sujeita à capacidade do teatro: 750 assentos). O DVD será vendido no local pelo valor de R$15. Informações: 3101 2567.