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Relações sino-americanas, um fogo de artifício que não explodiu

O Diário do Povo, órgão do Partido Comunista da China, acompanha com atenção a imprensa dos Estados Unidos. Neste sábado, sua versão online reproduziu na íntegra este artigo de Steve Chapman, enviado a Pequim, publicado no Chicago Tribune

Quando você acende com fogo de artifício, não existe nenhum grande choque em vê-lo explodir. A surpresa vem quando você acende e não acontece nada.

Ao longo da última década, esta tem sido a história dos Estados Unidos com a China. Apesar da abundância de pólvora e fósforos, não houve explosão.

Por um longo tempo, os americanos viram os chineses como uma ameaça à segurança, e não sem razão. Combatemo-nos um ao outro na Guerra da Coreia – conhecida aqui em Pequim como ''A Guerra de Resistência à América'' – e a China ajudou o inimigo a nos levar à ruína no Vietnã.

O regime comunista de Mao Tsetung ofereceu armas e incentivo aos ''movimentos de libertação'' ao redor do globo. Ainda na década de 1990, depois que Mao se fora, os neoconservadores (dos EUA) previam uma nova Guerra Fria com um  Pequim ansiosa por ajustar velhas contas.

Não é difícil perceber por que a China pode fazer suar frio. Após três décadas de rápido crescimento, ela agora possui a terceira maior economia da Terra. É governada por um regime autoritário com uma ficha ruim em matéria de direitos humanos.

Como qualquer um que tenha assistido à cerimônia de abertura dos Jogos Olímpicos de 2008 podem atestar, o país possui uma enervante capacidade de direcionar seus efetivos para um objectivo específico. Com 1,3 bilhão de habitantes, a China traz à mente o comentário atribuído a Joseph Stálin: ''Às vezes, quantidade quer dizer em si qualidade''.

Uma preocupação mais específica é que a China tem  aumentado muito o seu orçamento militar, que hoje excede US$ 100 bilhões por ano. Há suspeitas de que hackeou os computadores do Pentágono.

A China não faz segredo de que está constantemente preparando para uma possível guerra conosco em relação a Taiwan. E há os recentes incidentes em que navios chineses assediaram belonaves americanas em águas internacionais, no que parecia ser um deliberado teste do nosso novo presidente.

A China é, sem dúvida, uma força que se deve levar em conta – mas esta não deve ser exagerada. Ainda hoje, ela gasta menos de um quarto do que os Estados Unidos em defesa militar. Ainda não possui um único porta-aviões, o instrumento essencial para projeção de poder no exterior.

Preparar-se para a possibilidade de uma guerra com os EUA não é a mesma coisa que desejá-la ou perseguí-la. Pode ser apenas um ato de prudência. Uma consequência de ser uma superpotência messiânica é que fazemos alguns países temerem sua inclusão em nossa lista de alvos.

Os preparativos da China realmente não podem parecer suspeitos em uma nação rodeada por adversários históricos – Rússia, Índia e Vietnã -, bem como duas instáveis  potências nucleares, o Paquistão e a Coreia do Norte. Ou para um país que escapou há apenas duas gerações de sua invasão pelo Japão Imperial. Afinal, os EUA gastam mais em defesa militar do que todo o resto do mundo, e isto quando todos os nossos inimigos estão a meio mundo de distância.

A maioria, se não de todos os esforços militares da China sem dúvida estariam acontecendo mesmo que os EUA não existissem. Ela se comporta como uma potência emergente normal – não o tipo de Estado ideologicamente orientado, expansionista, representado pela antiga União Soviética.

Mas, evidentemente, mesmo potências emergentes normais podem precipitar conflitos com potências estabelecidas, já que exigem mais respeito e um maior papel mundial. Mas até agora a China parece estar fazendo um esforço para não provocar rupturas.

Outrora inimiga declarada da ordem internacional, a China aderiu à Organização Mundial do Comércio, enviou forças de paz a países africanos, cultivada estreitos laços com Taiwan e tentou nos ajudar a dissuadir a Coreia do Norte de seguir o caminho da energia nuclear. Ultimamente, envia navios de combate à pirataria ao longo da costa da Somália.

Xiaoming Zhang, professor  da Escola de Estudos Internacionais da Universidade Pequim, disse-a mim e outros  jornalistas convidados: ''A China deseja ter um status quo de potência, não de potência revolucionária''. Os governantes do país dizem a mesma coisa. Um livro branco publicado no ano passado, declara: ''A China persegue uma política de defesa nacional de natureza puramente defensiva''.

Gente prudente não tomará declarações assim ao pé da letra, seja qual for o governo que as faça. Mas neste caso, não há diferença visível entre a retórica de Pequim e sua conduta. Então, talvez eles signifiquem aquilo que dizem.

Na maior parte das vezes – não sempre, mas em geral – os chineses têm se portado como se pensassem que o país pode assegurar melhor sua prosperidade e segurança, através da prudência, contenção, cooperação multilateral e de um senso de limite quanto ao poder militar.

Não admira que o pessoal de Washington esteja desconcertado.

Fonte: http://spanish.people.com.cn