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Índia: o novo império contra-ataca

No momento em que a crise econômica mergulha o planeta no pessimismo, a Índia transpira uma sensação de autoconfiança. A primeira vista, isto parece paradoxal, mas na realidade reflete uma dramática transformação que o milagre econômico dos últimos 15

Em algum momento em meados da década de 1990, a Índia alicerçou as bases para sua transformação: de uma sociedade agrícola, condenada a competir com países igualmente pobres e, em consequência disso, a se submeter às chantagens dos poderosos, em uma usina de geração de talentos.


 


Em antítese com a China, que baseou seu florescimento econômico sobre a força de suas mãos, a Índia decidiu investir em seus miolos, e não demorou a colher os frutos desta opção. Nos últimos cinco anos, é a segunda economia mais velozmente desenvolvida, atrás de sua imbatível competidora, disputando uma posição entre as grandes potências do planeta.


 


Suas universidades estão entre as melhores do mundo, e os ali diplomados são avaliados após uma competição particularmente dura – basta lembrar que a Índia é um país com mais de 1 bilhão de habitantes -, conformando uma nata de engenheiros, médicos, economistas e cientistas em informática carismáticos.


 


As empresas do Ocidente não demoraram para perceber a vantagem que a sintonia entre um alto nível educacional e um baixo custo de mão-de-obra proporcionaria. Rapidamente, começaram a transferir suas atividades para a Índia, criando inúmeros postos de trabalho de salários elevados para a realidade do país.


 


Esta tendência foi fortalecida graças à veloz Internet. As redes de fibras ópticas garantiram altas velocidades de transmissão, encurtando as distâncias no mundo. Assim, uma empresa norte-americana poderia ter escritórios na Índia, encarregando aos seus funcionários ali trabalhando uma grande parcela de suas atividades, e mantendo seu contato diário com eles através da Internet.


 


Os talentos anglófonos do país constituíram o alvo ideal para o capital ocidental, que baseado em Bangalore – o novo Silicon Valley -, criou no sudeste da Índia um centro mundial de prestação de serviços em todos os setores da atividade empresarial.


 


Hoje, Motorola, HP, Cisco Systems e outros gigantes da tecnologia apoiam-se em grupos de jovens indianos para desenvolver suas atividades, e deslumbrantes aplicações multimídia às novas gerações de seus equipamentos. Ao mesmo tempo, empresas indianas especializadas no setor financeiro prestam serviços a grandes nomes de Wall Street, como o Goldman Sachs e outros.


 


O império contra-ataca


 


A confiança que as empresas do Ocidente depositaram na Índia funcionou com liberdade até para o capital doméstico: a aquisição da Jaguar pela indústria automobilística indiana Tata Motors, em março deste ano, por 1,15 bilhão de libras esterlinas, tornou-se emblemática para um país que apenas em 1947 derrubava o domínio colonialista britânico.


 


Assim, o mundo começou a se habituar com marcas como as das indústrias automobilísticas Tata e Mahindra & Mahindra, do gigante da informática Infosys e do rei do aço Lakshmi Mittal. Este modelo de crescimento teve como resultado, nos últimos 10 anos, a saída de 200 milhões de indianos da miséria.


 


A classe média da Índia correspondia a apenas 8% de sua população (65 milhões de habitantes) em 1980, mas em 2000 o percentual atingia 22% (220 milhões de habitantes). De acordo com as últimas avaliações, deve ter atingido 32% da população (368 milhões de habitantes). A mais confiável testemunha destas mudanças cósmicas é o… ouro! O preço do metal foi lançado nas alturas nos últimos anos, o que está intimamente ligado às… noivas indianas!


 


Um costume que quer que as noivas se enfeitem para seus casamentos com jóias de ouro, da cabeça aos pés, tornou a Índia o maior comprador de ouro no mundo. Cerca de 20% da demanda mundial por ouro provém da Índia, com 60% desta demanda sendo destinada à “indústria doméstica de casamentos”.


 


Infelizmente, contudo, o surgimento dos novos-ricos indianos não impulsionou às alturas somente o preço do ouro, mas também o dos alimentos. Apesar da crise econômica, o preço do açúcar aumentou 30% nos últimos meses, o das aves 33%, o do arroz 16%, o dos grãos 25% e o do trigo 7%.


 


Entretanto, este não é o único problema. O bem-estar da Índia tropeça em suas sérias deficiências em rodovias, aeroportos e portos, além da escassez de água potável para seus habitantes.


 


O país dispõe de uma rede ferroviária antiga e ultrapassada, lembrança do colonialismo britânico, e enfrenta sérios problemas energéticos. Cerca de 40% da produção agrícola apodrece nos campos ou na cadeia de transporte, por causa não das condições atmosféricas mas da deterioração do sistema viário.


 


A indústria de informática proporciona trabalho a apenas 1,6 milhão de pessoas, mas centenas de milhões de trabalhadores permanecem longe dos benefícios econômicos da suposta globalização, apodrecendo em favelas de dimensões gigantescas como em Mumbai e na vizinha Calcutá.


 


O novo governo parece conhecer a situação, e programou investimentos mamutes num orçamento de US$ 330 bilhões, até 2012, para a construção de rodovias, usinas de geração de energia elétrica, escolas, hospitais, portos e aeroportos. Sua ambição é que, após a conclusão do programa, surja uma nova Índia, que durante sete décadas pós-Independência possa finalmente disputar um lugar ao sol para todos os seus cidadãos.


 


Bollywood Movies


 


A Meca cinematográfica da Índia, iniciada no princípio do século, continua bombardeando o cinema com as mais exageradas e fantasmagóricas películas jamais vistas. Aqui, em Mumbai, são produzidas anualmente 1.000 películas, e Bollywood (junção das palavras Mumbai e Hollywood) talvez seja a maior indústria cinematográfica do planeta em atividade – mais por excesso de nacionalismo.


 


“A indústria cinematográfica está intimamente ligada com a imagem que temos de nosso país, e os indianos não podem sequer pensar que o cinema é algo que veio ao nosso país do exterior”, declara um produtor, fornecendo exatamente o estigma de união de um povo inteiro com o falso reflexo dos desejos e anseios. Os ocidentais, por seu lado, podem ficar satisfeitos com os empréstimos cada vezes maiores a partir de Hollywood e as contratações de diretores e artistas indianos.