Por que a gasolina é tão cara no RN?

Para dirigir 70 km por dia, o advogado Tiago Protásio gasta R$ 600 com gasolina todos os meses. Ele é apenas mais um consumidor com um acervo de perguntas não respondidas. Com uma produção de 11 milhões de litros de petróleo por dia, os potiguares se p

Mas já imaginou pagar apenas R$ 0,80 pelo litro do combustível? Esse é o preço de produção do petróleo da maior empresa petrolífera do Brasil, a Petrobras. O problema é que desde que o petróleo é extraído do poço até chegar como gasolina no tanque do carro, o processo é longo, oneroso e a carga tributária não é pequena. Quase metade do que o consumidor paga pela gasolina é revertido somente em impostos.


 


Depois de processada na refinaria, a gasolina pura sai a R$1,51 para as distribuidoras do Nordeste, que vendem a gasolina final (misturada ao álcool) por R$ 2,13 para os postos do Rio Grande do Norte. Uma vez na bomba, incidirá ainda o imposto de renda, os custos operacionais e pessoais do posto e o valor pago pelo transporte. Além, claro, do lucro do comerciante.


 


Mas nenhum dos envolvidos explica o alto preço no RN. Entre transportes, impostos, produção, concorrência desleal e cartelização, as acusações vêm de todos os lados. A Petrobras informa que não entende porque os revendedores do RN comercializam a gasolina a tal preço. A Secretaria Estadual de Tributação garante que a culpa não é do ICMS (imposto estadual sobre a gasolina). Os comerciantes atribuem aos impostos, a culpa pelo alto preço. E o consumidor continua sem entender.


 


Para esclarecer as divergências, a reportagem mostra os caminhos do petróleo ao consumidor, os impostos taxados sobre o preço da gasolina e os argumentos dos revendedores no Rio Grande do Norte.


 


Exploração segue caminho sinuoso


 


O processo de exploração, produção, refino e revenda do petróleo não é simples, nem curto. O Rio Grande do Norte é responsável apenas pelo início do processo. Ou seja, aqui são executadas as etapas de exploração e produção do petróleo. E alguém  precisa custear a despesa de levar a matéria-prima e trazer a gasolina pronta: o consumidor.


 


O petróleo potiguar é explorado atualmente por 11 empresas, sendo a Petrobras a maior em todo o Brasil. A Unidade de Negócio de Exploração e Produção do Rio Grande do Norte produz em 62 campos, metade localizada no mar. O maior campo produtor terrestre do RN é também o maior do país: o Canto do Amaro, em Mossoró, com uma produção diária de 23 mil barris de petróleo. O preço do barril varia constantemente, custando hoje uma média de US$ 72 (dólares).


 


Segundo o gerente de engenharia de produção da Petrobras, Fernando Ribeiro, o procedimento pode durar até quatro anos, na terra, e muito mais tempo no mar. Essa exploração, entretanto, não é aleatória. As empresas só têm permissão para agir em lotes leiloados pela Agência Nacional do Petróleo (ANP). Fernando Ribeiro explica que essa compra é feita ‘às cegas’. “O petróleo só pode existir nas áreas de bacias sedimentares, então nós compramos lotes com esse tipo de formação. Mas ali tanto pode haver milhões de litros, como não ter nada”.


 


O engenheiro explicou passo a passo como o petróleo retirado do poço chega aos tanques dos automóveis. “Primeiro, é feita uma análise sísmica no local para saber se ali pode realmente existir o petróleo. E, mesmo quando a resposta é positiva, as chances de não encontrarmos nada é muito alta”.


 


Nos poços em que existe petróleo, o percurso pode enfim começar. Através de oleodutos espalhados entre as áreas de exploração, a matéria-prima é encaminhada primeiro para estação coletora, onde é armazenada, e mais tarde para a estação de tratamento de Guamaré, onde começa a produção.


 


Só depois de separado do gás e da água existentes em sua composição, o óleo puro é finalmente enviado às refinarias. Ao todo, existem 13 refinarias no Brasil, incluindo a do município de Guamaré, que deve ficar pronta em 2011. Mas o petróleo produzido aqui é encaminhado apenas para a Refinaria de Mataripe, na Bahia, e uma pequena parte para a Refinaria de Manaus.


 


É nesse ponto que é feita a transformação. Depois de passar por diversas torres de processamento e de refino, cerca de 20% daquele petróleo é transformado em gasolina pura e está pronto para ser fornecido às distribuidoras. Como a legislação federal brasileira proíbe a comercialização da gasolina pura, a distribuidora precisa acrescentar em torno de 25% de álcool anidro (desidratado) para, só então, espalhar o combustível entre os postos credenciados.


 


A última etapa é que todos conhecem. Essa é a hora de colocar a mão no bolso e pagar aos revendedores os privilégios de andar de carro.


 


Os impostos pagos pelo motorista


 


Segundo dados da Petrobras, quase 50% do que pagamos quando “compramos” a gasolina é custo de impostos. São eles: a CIDE (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico), o PIS (Programa de Integração Social) e a COFINS (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social), que representam 14% do preço final, além do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços), que representa 29%. O consumidor arca ainda com o custo sobre a adição do álcool anidro (7%).


 


Mas nem todos são taxados de forma neutra em todo o Brasil. Como o ICMS é estadual, o percentual pago pelo revendedor sobre o preço final do produto varia entre os estados. No RN, essa taxa é de 25% sobre a gasolina pura.


 


Segundo dados da Agência Nacional de Petróleo (ANP), os potiguares consomem uma média de 26.500.000 litros por mês. Com um custo médio de R$2,61 por litro, os gastos mensais com gasolina no RN chegam na casa dos R$70 milhões. Considerando que o revendedor compra a gasolina à distribuidora por R$2,13 e que 25% do que ele paga é ICMS, o estado arrecada por mês em média R$14 milhões só com esse imposto.


 


Para o consumidor João Pereira Dantas, o motivo para o alto custo dos impostos é uma administração governamental inadequada. “Eu morei no Japão e lá, que falam que o custo de vida é alto, o combustível é muito mais acessível do que aqui. Para mim, isso tudo não passa de uma questão política”, acredita.


 


Mas os especialistas da Secretaria Estadual de Tributação (SET) do RN garantem que esse não é o motivo. Segundo eles, o percentual de ICMS sobre a gasolina não tem altas variações entre os estados da federação. “Dizer que o que encarece o produto é sempre o imposto já é uma questão psicológica do brasileiro”, disse o subcoordenador da Suscomex da SET, Abraão Padilha.


 


Quanto à CIDE Combustíveis, o direcionamento é dividido. Depois de tirada a parte do Governo Federal, cerca de 30% do que é arrecadado é rateado entre todos os estados da federação. Segundo o auditor fiscal da SET, Derance Amaral, o RN conseguiu aumentar a participação no percentual depois que identificou uma discrepância de um milhão de litros na divulgação feita pela Agência Nacional do Petróleo (ANP) do total consumido no estado. A conquista, entretanto, não vai baratear a gasolina. “Esse valor vai contribuir para a arrecadação do estado, mas não tem influência no preço que os postos cobram”, explicou.


 


Outro problema é a sonegação fiscal. Segundo Derance Amaral, as informações dos revendedores não batem com os dados fornecidos pelas distribuidoras. “Os postos estão dizendo que venderam menos do que compraram. Porque assim eles pagam menos impostos e podem vender o litro mais barato”, acredita o auditor fiscal.


 


20% do petróleo vira gasolina


 


Do petróleo podem ser produzidos diversos tipos de derivados, dentre plástico, gás de cozinha, querosene para aviação, óleo lubrificante, asfalto, entre outros. Atualmente, apenas 20% do petróleo que é recebido pelas refinarias é transformado em gasolina.


 


Atualmente, a frota de carros movidos a gasolina no Rio Grande do Norte, mesmo que também utilize outros combustíveis, é de 564.443 veículos. O consumo da gasolina no estado aumentou em 81.638.000 litros nos últimos nove anos. Em 2009, de janeiro a abril, o consumo de gasolina já representa 34% do consumo total do ano de 2008.


 


Mas apesar do crescimento no consumo deste combustível, o gerente de engenharia de produção da Petrobras, Fernando Ribeiro, acredita que a produção desse combustível será substituída na sua totalidade pelo álcool. “Por ser combustível fóssil, em poucos anos a gasolina vai perder lugar para o álcool, que é renovável. Se hoje mais da metade dos carros fabricados já é flexpower, daqui a pouco todos vão ser”, acredita o engenheiro.


 


Os revendedores não partilham da mesma opinião. Para o presidente do Sindpostos/RN, Ismar Medeiros, o álcool por ser um produto sazonal não substituirá por completo a gasolina.


 


Tributos encarecem o combustível


 


Ao todo, o Rio Grande do Norte conta com cerca de 550 postos de combustíveis. Hoje, o valor de pauta que o Governo dedica ao RN (preço que o Estado estima que será cobrado pela gasolina) é de R$2,57 pelo litro, já com todos os impostos e margem de lucro dos revendedores.


 


O presidente do Sindipostos/RN (Sindicato do Comércio Varejista de Derivados de Petróleo), Ismar Medeiros, garante que a causa dos altos preços é a carga tributária. Segundo ele, o custo de todos os impostos que incidem sobre a gasolina é em média R$0,97. Com a soma do imposto de renda, o custo chega a R$1,40.


 


Para ser dono de posto, é preciso ter dinheiro na mão. O revendedor faz investimentos altos para poder vender o combustível. Depois de fazer o pedido à distribuidora, ele precisa pagar previamente os impostos e o transporte para só então poder receber o produto.


 


Quando chega ao posto, a gasolina é testada por uma pessoa especializada, que mede a quantidade de álcool misturado e a densidade do combustível para detectar se existe alguma adulteração. “Pelo menos é assim que deve ser feito, mas não sei se todos cumprem essa exigência”, disse Ismar.


 


Além disso, ele aponta o transporte como outra etapa encarecedora. “Antes a distribuidora fazia a mistura do álcool logo em Santos Reis, onde é descarregada. Agora, a mistura tem que ser feita em Guamaré, então a gasolina tem que ir e voltar e fica o custo de um transporte a mais”, explicou.


 


Os valores costumam ser menores nos bairros de periferia de Natal. Muitos consumidores preferem abastecer na zona Norte, Felipe Camarão e Alecrim porque, geralmente, o valor é mais acessível. As explicações dos revendedores são muitas. Ele pode decidir fazer uma promoção relâmpago, ou comprou a gasolina mais barata da refinaria ou teve um menor custo com o transporte. Outros aconselham ainda a abrir o olho na hora de abastecer: a gasolina pode estar adulterada ou estar acontecendo sonegação fiscal.


 


Se por um lado, o cartel preocupa, por outro, a diferença de números confunde o consumidor. É comum encontrar em Natal, postos do mesmo bairro, e às vezes da mesma rua, com diferença de até R$0,40 na gasolina. Se um baixa o preço, alegando promoção, os outros baixam alegando necessidade de concorrência. Uma proprietária de posto que não quis se identificar contou que precisa reduzir o preço da gasolina por obrigação do mercado. “Eu não posso dizer porque aquele posto baixou o preço dele, mas eu tenho que baixar aqui quando tem essas promoções surpresas para não perder a clientela. E o prejuízo sempre é grande”, disse.


 


Ismar Medeiros garantiu que não existe cartelização nos postos do estado. Segundo ele, o sindicato não tem conhecimento dos preços que os outros revendedores cobram pelo comércio.


 


Fonte: Tribuna do Norte