Emilio Guerrero: As saídas possíveis em Honduras
Se alguma coisa fica clara depois de uma semana e meia de golpe é que estamos diante de uma espécie de empate a favor de Micheletti. Esse contrassentido dialético foi se ordenando em uma acelerada sucessão de passos que instalaram um ''status quo'' em
Publicado 13/07/2009 15:51
Zelaya não pôde voltar ao poder em Tegucigalpa [capital de Honduras], apesar de sua decisão indeclinável, das crescentes mobilizações internas e do apoio do sistema hemisférico de Estados. A ronda dupla do avião que não pôde aterrissar em Tegucigalpa foi apenas o sinal de uma relação de forças que não deu para ser imposta na terra.
O governo ditatorial não conseguiu ganhar nenhum apoio, exceto o de Israel, de uma minoria da população e de si mesmo diante do espelho de sua própria condição de classe. Mas obteve uma posição política de força na constituição imediata de um governo de fato 32 horas depois da porretada militar.
Esse governo se apoia em três poderes de Estado: o Congresso Nacional, a Corte Suprema e as Forças Armadas. E conta com o respaldo de cinco forças que foram decisivas para a queda do presidente Manuel Zelaya: três das cinco empresas multimídia, a Igreja, duas das três câmaras empresariais de Honduras, a Base Militar de Soto Cano e as multinacionais de medicamentos que controlam 82% desse mercado.
A expressão argumental desse estado de coisas foi dada pelos próprios chefes em disputa quando aceitaram a mediação do Prêmio Nobel e presidente da Costa Rica, Oscar Arias. Isso sim, assegurando, cada um por seu lado, que ninguém cederia em nada. Isso se traduz em que Zelaya continua fora, e o golpe continua dentro.
O governo dos Estados Unidos, por mais que quisesse, não apoia esse golpe. Simplesmente não o controla, nem lhe é útil em seu objetivo latino-americano atual. Tal atitude não retira nada de sua natureza de nação opressora e só acrescenta pontos ao pragmatismo de sua condição imperialista.
Desta vez, os EUA preferiram apostar na busca de um acordo o mais cordial possível com os novos atores do continente: Unasul, Alba, PetroCaribe, Brasil desafiando ao G-8 e outros velhos esquemas como o G-Rio.
Suas mãos estão muito ocupadas com a incontrolável recessão internacional, com a nova ofensiva militar contra um Talibã que parece inexpugnável, com a necessidade de uma saída ordenada do Iraque, com o desafio coreano-iraniano e com a urgência de uma Rússia forte que o ajude a controlar a sempre desobediente Eurásia. Não são os únicos fatores de risco, mas sim maiores do que o de um governo amigo de Chávez na pequena Honduras.
Entre as coisas que o sistema imperialista aprendeu em seus primeiros 100 anos de atuação sobre o mundo, uma delas foi retroceder para avançar.
Em contradição com o previsto, a crise hondurenha se tornou latino-americana desde o primeiro dia. Nesse ponto começa a peremptória necessidade norte-americana de lhe dar uma saída a seu favor, mesmo que sacrificando relações com vários (ou muitos) de seus amiguinhos hondurenhos.
Não é a primeira vez que vemos isso na história contemporânea. É uma questão de cálculo, de interesse geopolítico, o que, para os impérios, sempre vale mais do que qualquer amigo.
Desse mapa de ilações complexas, nascem os indícios que levam às possíveis respostas à pergunta de aonde Honduras vai. A mais perigosa das saídas em curso é a que pede uma intervenção dos EUA em Honduras. Esse pedido tem base social em uma parte dos seguidores da classe média de Zelaya, como se pode verificar em faixas que pedem isso nas marchas, algo que lembra o Panamá de 1989.
Esse sentimento equívoco alimenta o objetivo de Washington e de vários governos da OEA: reinstalar Zelaya no governo mediante um pacto controlado pelos EUA com o governo de Micheletti. Estabelecer uma transição até a culminação do mandato presidencial em dezembro de 2009.
A isso se associam a reunião com Hillary Clinton e as declarações de três chefes empresários no dia 06, e a declaração da Corte Suprema do dia 08 de julho, anunciando que o Congresso poderia conceder uma anistia ao presidente deposto.
Se isso ocorrer, mesmo que Manuel Zelaya volte a se sentar em Tegucigalpa, seria um desempate, mas a favor dos Estados Unidos. A outra saída está para ser vista.
*Modesto Emilio Guerrero é escritor e jornalista venezuelano.