Cabo Anselmo, o traidor, reaparece em SP e quer anistia

Um dos personagens mais mais vis e infames da história recente do Brasil, cabo Anselmo, deu ontem (30) o último passo para voltar a ser José Anselmo dos Santos, seu nome de batismo. Vivendo clandestino e sem documentos oficiais há 45 anos, quando foi preso e expulso da Marinha, Anselmo fez na 8ª Vara da Justiça Federal de SP exame para comparar suas impressões digitais com as que constam em documentos disponibilizados pela Força.

Cano Anselmo em foto de 1999

Este é o último passo do processo em que a União foi forçada, em dezembro, a apresentar dados que durante anos foram considerados desconhecidos. A Marinha disponibilizou ficha "individual datiloscópica" e um "prontuário de identificação".

A cópia de sua certidão de nascimento não foi encontrada nos arquivos da corporação nem no cartório de Itaporanga d'Ajuda, no interior de Sergipe, onde ele nasceu e foi registrado -por isso a perícia.

Em pouco mais de 40 minutos, Anselmo tirou suas impressões digitais. A conclusão -que vai dizer se a pessoa que fez a perícia é o cabo Anselmo- vai ser apresentada em 30 dias. Só depois ele poderá retirar novamente carteira de identidade, CPF e título de eleitor, e passará a ser o último dos beneficiados pela Lei de Anistia. Mas o homem que ficou conhecido como o grande traidor da esquerda, não quer apenas voltar a ter uma "vida normal". Ele também quer dinheiro. Aos 67 anos, Anselmo diz passar por dificuldades financeiras e, após reaver os documentos, ele espera receber uma indenização por parte do Ministério da Justiça, onde protocolou, em março de 2004, o pedido de reparação junto à Comissão de Anistia. Anselmo também se acha no direito de pleitear a indenização dada pelo governo aos perseguidos pela ditadura militar, entre os quais estão os familiares dos ativistas mortos, jornalistas, sindicalistas e opositores ao regime pós-64 que não puderam exercer a profissão ou sofreram perdas em função da condição política. Paulo Abrão, presidente da comissão, diz esperar a liberação dos documentos para o processo entrar em pauta.

"Estou tomando porrada há muito tempo", reclamou Anselmo à Folha de S. Paulo. "Esse pessoal da esquerda ainda inventa muita mentira", disse, tentando desqualificar as já muito conhecidas histórias sobre sua conduta de traidor durante o período da ditadura.

Trajetória manchada de sangue

Líder do protesto de marinheiros, evento que desencadeou a crise do término do governo de João Goulart, em 1964, Anselmo foi expulso da Marinha logo depois do golpe militar pelo crime de motim e revolta. Chegou a ser preso, mas fugiu e exilou-se no Uruguai e depois em Cuba, onde teria feito treinamento de guerrilha. Voltou ao Brasil em 1970 e ligou-se como membro atuante no movimento guerrilheiro. Acabou preso pelo famigerado delegado Sérgio Paranhos Fleury, do Dops, de quem depois tornou-se protegido.

Nesse momento, a história muda e o militar passa a ser acusado de ter atuado como agente duplo infiltrando-se em grupos de esquerda. Logo depois da sua prisão, Anselmo teria mudado de lado e aceitado trabalhar para o regime, passando a trair seus antigos companheiros, entregando-os às forças legais. Infiltrou-se em grupos armados como a VPR, sendo envolvido no estouro de aparelhos de guerrilha e na prisão, tortura e morte de militantes comunistas.

Numa de suas chacinas, morreu sua esposa, com seu auxílio, a paraguaia Soledad Barret Viedma, que estava grávida do próprio há cinco meses e que Anselmo entregara aos órgãos repressivos. Soledad apareceu morta ao lado do feto.

O primeiro a escrever sobre Cabo Anselmo foi Marco Aurélio Garcia, atual chefe da assessoria especial do presidente Lula.

Depois de ter sido acusado de traidor, Anselmo desapareceu entre 1972 e 1973, quando então foi dado como morto, ou pelas forças de segurança da ditadura militar ou justiçado pelos guerrilheiros.

A dúvida desapareceu a partir do momento em que o Cabo Anselmo foi entrevistado pelo jornalista Octavio Ribeiro (Pena Branca), com sua publicação pela Revista Isto É, na edição de 28 de março de 1984.

Posteriormente foi entrevistado pelo jornalista Percival de Souza, em 1999.

Só reapareceu em 2004, para entrar com o pedido de Anistia. Há quem diga que o Serviço de Inteligência da Marinha lhe garantiu proteção, por ter sido agente duplo ajudando nas investigações, concedendo-lhe nova identidade.

Com informações da Folha de S. Paulo e Wikipedia
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