País está amadurecendo, diz Tarso sobre combate à corrupção
Ao comentar as ações de combate à corrupção no País, o ministro da Justiça, Tarso Genro, afirmou nesta quarta-feira que o Brasil está "amadurecendo democraticamente". "Hoje, um policial federal ou um fiscal do Tribunal de Contas sabe que não vai ter sobre ele uma tutela política para poupar companheiros", disse, ao participar de entrevista a emissoras de rádio durante o programa Bom Dia, Ministro
Publicado 02/09/2009 16:03
Tarso acredita que os agentes que combatem a corrupção no País têm "autonomia legal" para desenvolver suas funções. Ele avaliou que a Polícia Federal está mais aparelhada e a Controladoria-Geral da União (CGU), mais organizada. "A taxa de corrupção nunca será extinta, mas vai ser drasticamente reduzida no País", afirmou.
Para o ministro da CGU, Jorge Hage, esta é a primeira vez que o Brasil vê seus órgãos de combate à corrupção trabalharem "articuladamente". "O País deu passos gigantescos em termos de se organizar para enfrentar a corrupção, que é um crime como tantos outros", disse.
Veja abaixo a transcrição, na íntegra, do programa Bom Dia Ministro.
Ou clique aqui para ouvi-lo:
02/09/2009 – Bom Dia, Ministro com os ministros da Justiça, Tarso Genro e da Controladoria Geral da União, Jorge Hage
APRESENTAÇÃO: KÁTIA SARTÓRIO
Na pauta do programa de hoje as ações do Ministério da Justiça e da CGU que desenvolvem no combate a corrupção, entre elas, o combate as fraudes em compras públicas e a regulamentação dos grupos de interesse no Brasil mais conhecidos como os lobistas. Os ministros da Justiça, Tarso Genro e da Controladoria Geral da União Jorge Hage, vão conversar ao vivo com âncoras de emissoras de rádio de todo o país. Lembrando aos companheiros dessas emissoras, que participam conosco dessa rede de rádio, que pelo caráter especial da nossa edição de hoje, nós teremos espaço apenas para uma pergunta por emissora.
APRESENTADORA KÁTIA SARTÓRIO: Ministro da Justiça, Tarso Genro, a avaliação que o senhor fez da Conferência Nacional de Segurança Pública, que terminou nesse final de semana aqui em Brasília foi positiva?
MINISTRO: Na nossa opinião é que sim, eu acho que todos os participantes da conferência, foi em torno de 2.500 delegados, 500 pessoas convidadas. Observadores internacionais de aproximadamente dez países, que fizeram um intenso debate sobre as questões mais relevantes da Segurança Pública no nosso país. Estas decisões que são feitas coletivamente, elas nunca são devidamente valorizadas num primeiro momento, são até criticadas, porque a democracia é um processo difícil, um processo complexo. Mas é o mais nobre dos processos, para tomar resoluções sobre políticas públicas importantes. Eu vou dar um exemplo concreto, que se originou desta conferência. Lá na conferência nós tivemos como princípio a manutenção da atual estrutura constitucional das polícias, ou seja: polícia civil, polícia judiciária dos estados e da União, polícias militares, Polícia Rodoviária Federal e Polícia Federal. Isto foi um princípio que teve uma votação arrasadora, a manutenção, mas ao mesmo tempo nas diretrizes se pronunciou a conferência, para que as guardas municipais pudessem ter algum tipo de atividade policial e se integrasse num sistema único de segurança pública em funções policiais.
O quê que nós temos que fazer agora? Nós temos que trabalhar um projeto de lei
para compatibilizar essa decisão desta diretriz da conferência, com a manutenção da estrutura constitucional atual. Como se pode fazer isso? Através de uma lei especial, que remeta para a lei que institui o Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania, para que as guardas municipais passem a ter uma atuação não policial no sentido típico, mas sejam capacitadas para desenvolver programas preventivos de segurança pública a partir das funções que elas exercem nos municípios. Ou seja, elas sairiam daquela posição atual, que são guardas apenas de bens públicos municipais e passariam a ter funções preventivas integradas numa visão, de um sistema único de segurança pública. Esse tipo de decisão, e foram várias decisões dessa natureza, que serão compatibilizados agora, com a estrutura constitucional existente, mas fazendo essas corporações avançarem para funções novas, como aliás já estão fazendo dentro do Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania, que foi aprovado praticamente por unanimidade.
RÁDIO CAPITAL AM-SÃO PAULO (SP) /CID BARBOSA: A informação que temos é de que as ações conjuntas, para o combate à corrupção e às fraudes em compras, está ainda em fase de elaboração, fase final. Eu quero saber o seguinte: o projeto contempla também as licitações de obras públicas? E outra coisa, porque o Sistema de Compras é tão vulnerável à corrupção? Por exemplo, nós vemos casos inacreditáveis de produtos, que qualquer um sabe que custam R$ 10, R$ 20 a unidade, por exemplo, serem adquiridos pelo governo por R$50, R$ 70. O grande inimigo do cofre é quem deveria zelar por ele?
MINISTRO JORGE HAGE: Na verdade a coordenação, articulação entre a CGU e o Ministério da Justiça, não está em fase preliminar, ela já está consolidada desde o início do atual governo. Uma das primeiras diretrizes implementadas por nós na CGU foi exatamente um trabalho articulado com várias áreas do Ministério da Justiça, com a Polícia Federal por um lado, com a Secretaria de Assuntos Legislativos de outro, com a Secretaria Nacional de Justiça de outro. E agora mais recentemente é com a Secretaria de Direito Econômico. Este é, digamos assim, o aspecto mais recente da intensificação dessa colaboração com vistas a coibir a participação de empresas cartelizadas nas licitações públicas, justamente para somarmos ai a expertise a experiência e o manancial de informações da SDE Secretaria Direito Econômico do Ministério da Justiça, que trabalha na área de combate a carteis, digamos assim, como fornecedores de toda a população. E nós que temos o problema nos carteis, como fornecedores ao poder público. A soma de esforços ai é que é um esforço recente. O outro esforço recente de colaboração entre nós e o Ministério da Justiça é na área da elaboração do projeto, que cria novas formas de repressão a empresas que cometem ilícitos em sua relação com o poder público e ai já não apenas ilícitos referentes a licitações, mas toda a sorte de ilícitos. Porque essa nova lei agora? Porque nós estamos de um lado o Brasil, está devedor perante a OCDE que é a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico que reúne os países mais industrializados do mundo, e que o Brasil está em vias de passar a integrar, nós somos já signatários da convenção contra o suborno transnacional.
O Brasil é devedor da elaboração de um marco legal, que preencha uma lacuna de ordem jurídica. Qual é essa lacuna? É que nós não temos uma norma que permita atingir diretamente o patrimônio da empresa. Nós temos como atingir o patrimônio do empresário, mas não temos como atingir o patrimônio da empresa por um lado, por outro, nós não temos normas que permita punir uma empresa brasileira, por ter cometido suborno nas suas relações com outros governos de outros países, e o Brasil hoje é um ator global, o Brasil hoje tem um protagonismo mundial. As empresas brasileiras atuam no mundo inteiro. Temos grandes empresas brasileiras que atuam internacionalmente. Então o Brasil é devedor dessa lei. Então nós estamos elaborando junto com o Ministério da Justiça uma norma que vai prever a punição na esfera administrativa e eu enfatizo isso, porque a punição administrativa é muito mais rápida e célere do que a punição pela via judicial, que como você sabe no Brasil, um processo judicial nunca chega ao fim quando ele é voltado contra os crimes contra administração, contra o Sistema Financeiro, porque essa gente pode pagar os melhores escritórios de advocacia, que não deixa o processo terminar nunca e no Brasil só se admite a condenação após o trânsito em julgado. Então a punição administrativa é a forma de você evitar essa sensação de impunidade que havia no Brasil.
MINISTRO TARSO GENRO: São diversas as origens desta colaboração da CGU com o Ministério da Justiça, nós estamos na verdade num processo de aperfeiçoamento extremo, que já entra nessas relações mais complexas, que deriva inclusive da grande inserção internacional que o Brasil tem hoje, quer do ponto de vista político, quer do ponto de vista econômico, por exemplo, o Ministério da Justiça sugere à CGU, que a CGU faça uma investigação especial, em uma determinada licitação em um município. Ou a CGU levanta uma informação e passa para a Polícia Federal ou para o Ministério da Justiça, para passar à Polícia Federal, para fazer uma investigação à respeito de uma fraude em uma licitação. Outra situação é a formação de um cartel, um cartel de empresas articulado para distribuir os benefícios de uma licitação, criando a partir desta relação um preço artificial. E tem aquela pura e simples corrupção, manipulação dos editais, que a CGU eventualmente levanta porque ela faz a fiscalização da utilização correta das verbas públicas e isso aí se transforma em um inquérito policial. Então a colaboração é uma colaboração estreita e a CGU é o mais importante órgão institucional organizado do país para combater a corrupção. Porque ela tem as condições de semear informações, receber e ao mesmo tempo comunicar, à partir do seu trabalho técnico aos órgãos de investigação da União, as fraudes das licitações, as corrupções, a até as suspeitas para as pessoas serem, à partir disso, investigadas e, eventualmente até absolvidas.
RÁDIO BAND NEWS-RIO DE JANERO (RJ)/ POLIANA BRETAS: Ministro Tarso Genro, falando um pouco sobre o sistema prisional, a Secretaria Estadual da Administração Penitenciária, aqui do Rio, tem enfrentado fugas em presídios do estado. A Justiça determinou o fechamento da Polinter do Brejão, na Zona Norte, mas a decisão não foi cumprida por falta de vagas em outras unidades. O Estado ainda enfrenta disputas na Justiça para não permitir o retorno de presos perigosos de penitenciárias federais. Essa não é uma realidade só aqui do Rio de Janeiro. Então, o que fazer para enfrentar esses problemas no Sistema Prisional em todo o país? Ainda mais que a população carcerária cresce e os presídios não acompanham esse crescimento. Os mutirões judiciários ajudam. E ainda para o ministro Tarso Genro, o Ministério está elaborando agora um levantamento sobre gastos do Pronasci nos estados e municípios. Há uma data para a divulgação desse relatório, e o porquê dessa pesquisa?
MINISTRO TARSO GENRO: O sistema prisional ordinário, comum no país, é de responsabilidade dos estados. A União tem uma estrutura de quatro penitenciárias de segurança máxima, funcionando regularmente, muito bem equipadas e controladas. Estamos iniciando a construção da quinta, agora em Brasília. O que a União pode fazer para socorrer os estados? Propor uma política de desenvolvimento de investimentos na área penitenciária, propor um padrão – esse padrão é o novo Plano Diretor do sistema Prisional, e oferecer recursos para que os estados utilizem o sistema prisional. E, é exatamente isso que nós estamos fazendo. Qual é o problema que existe? O problema que existe é um problema que deriva exatamente dos estados. Os municípios não querem oferecer terrenos para a construção de penitenciárias e prisões.
Às vezes o Estado tem projetos , mas não tem licença ambiental ou não tem uma estrutura sanitária adequada ou às vezes o projeto errado. Em terceiro lugar, ás vezes os municípios não têm estrutura técnica, sequer, dos estados para propor projetos para investimentos na área prisional. Então, é uma questão que hoje abrange praticamente todos os estados do país. E nós só podemos vencer através de uma relação de colaboração estreita da União com os estados. A União tem dinheiro, tem dinheiro em caixa, inclusive, para construir as chamadas penitenciárias de segurança média voltadas para jovens apenados. Inclusive para separar os jovens apenados daquele sistema tradicional, que em última análise, é uma escola de criminalidade. Isso alguns estados estão aproveitando, outros não. Mas, na verdade é a primeira vez que a União federal se articula com os estados de maneira profunda, mudando uma política – que é uma política nefasta, que é essa política tradicional das penitenciárias onde só com as pessoas, sem nenhum tipo de critério – e a partir daí nós temos que fazer uma mudança estrutural. Não só na capacidade de investimentos dos estados. Na capacidade técnica de usar os recursos mas também na natureza das penitenciárias que devem ser construídas para que o sistema prisional seja desafogado. Qual é a outra pergunta que eu esqueci?
APRESENTADORA KÁTIA SARTÓRIO: Pronasci.
RÁDIO BAND NEWS – RIO DE JANERO (RJ)/POLIANA BRETAS: Sobre a pesquisa dos gastos dos municípios e estados das verbas do Pronasci.
MINISTRO TARSO GENRO: Estamos fazendo na verdade um adiantamento de trabalho que a CGU faz quando convocada, ou faz ordinariamente, e que o Tribunal de Contas faz em um determinado momento. Eu estou determinando que a minha equipe de controle interno, do Ministério da Justiça, vá aos estados para fazer verificações e preliminares para ver se os estados e os municípios estão utilizando de forma adequada os recursos do Pronasci. Aqueles estados ou municípios que não estiverem utilizando de maneira adequada, nós já vamos cortar os recursos que seriam disponibilizados em 2009. Isto não impede, pelo contrário,isso vai oferecer dados para que a CGU faça a sua investigação, faça o seu trabalho de sindicância e o Tribunal de Contas também. Esse trabalho deverá ficar pronto ainda, até o final do mês de setembro. E, ele é um trabalho, evidentemente, que é feito de maneira localizada em alguns pontos, que nós achamos que são os pontos mais críticos de investimentos do Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania.
RADIO CHAPECÓ-SANTA CATARINA (SC)/FÁBIO SCHARDONG: Os ministros falam sobre a corrupção, sobre o combate à fraude em compras públicas, entre outros assuntos, nesta manhã. Eu pergunto o que isso representa em números para o país? Qual prejuízo aos cofres públicos se há um levantamento nesse sentido. E, se há também uma espécie de ranking por assim dizer onde a corrupção, nessa área se faz mais presente seja por estado ou por região aqui no território brasileiro?
MINISTRO JORGE HAGE: Nós não temos muita simpatia com estas estimativas, que às vezes são divulgadas por alguns setores, a respeito do quanto custa, quanto representa para o país, o volume de recursos desviados através dessas fraudes. Na verdade ninguém tem esse número preciso. O que há são as estimativas sem muita base cientificamente defensável. O que nós podemos dizer é que há determinadas áreas, sim, que são mais frágeis, mais sujeitas a este tipo de fraude que outras. Nós criamos, inclusive, na Controladoria recentemente, uma nova unidade denominada Observatório da Despesa Pública. Que, fazendo uso do que há de mais moderno em matéria de tecnologia de ponta, com o que há de mais moderno no softwares para trabalhar grandes massas de dados, fazendo mineração de dados. Nós temos feito um trabalho que tem dado algumas indicações muito importantes para orientar, para focar ainda mais as diretorias. Esse trabalho é o seguinte: nós pegamos a base de dados do compra net, que é o sistema de compras eletrônica do governo federal. Você sabe que o governo brasileiro é um dos mais avançados do mundo em matéria do uso do chamado governo eletrônico. Uso do que há de moderno na tecnologia para as atividades da administração pública, particularmente no caso das compras. Pegamos o compras net que tem dado, desde 1998.
São 11 anos de informações preciosas que simplesmente não vinham sendo devidamente utilizadas. E, o nosso observatório, com esse tipo de softwares que eu me referi, identifica, já está fazendo isso há alguns meses, quais as fraudes mais recorrentes que se repetem, identifica quando há o mesmo modus operandi de um determinado tipo, digamos, ou de conluio entre participantes de uma licitação, ou fracionamento indevidos de licitação, ou comparecimento das mesmas empresas sendo que uma delas comparece sempre para perder naquele tipo de item, e para vencer em outro – o chamado rodízio. Situações onde se faz uma compra sem licitação, à pretexto de inexigibilidade por ser um fornecedor exclusivo, e, na verdade encontramos quatro ou cinco fornecedores exclusivos. Essa montanha de dados tem sido utilizada, e, ela serve para identificar por região, por órgão, por tipo de produto, onde se repetem os problemas e aí a auditoria atuando preventivamente vai focar em cima daquele órgão em cima daquela região. Ainda falando em termos regionais, Fábio, eu aproveito para lhe dizer que o município de Chapecó foi um dos 60 municípios sorteados , na semana passada, pela CGU, para o programa de fiscalização mediante sorteios públicos e a nossa equipe está aí em Chapecó desde de anteontem , segunda-feira, devem ter chegado aí os nossos técnicos, nosso auditores, para verificar a aplicação de todos os recursos federais feita nos últimos anos no município de Chapecó. Eles devem, passar está semana aí e se necessário mais uma semana e depois nos trazer essas informações.
MNISTRO TARSO GENRO: Uma observação rápida, mas eu acho que é importante de falar. O Brasil tem melhorado no chamado ranking dos países que são apontados dentro de uma gradação dentro de países que tem maior ou menor corrupção. Até por que nunca se combateu tanto a corrupção no país. É por isso que aparece todos os dias no jornais, antes não aparecia, porque o combate era um combate que existia, com boa vontade de todas as autoridades, mas não havia um esquema estruturado dentro do Estado brasileiro como existe hoje, CGU, Polícia Federal, Ministério da Justiça, relação permanente com o Tribunal de Contas, para combater a corrupção em todo o território nacional de maneira indistinta, independentemente de quem é o prefeito, quem é o governador, de quem é a autoridade que está sendo investigada. Mas, essa melhora do Brasil não tem muito significado, porque essas instituições que produzem a lista de países mais corruptos nunca produziram uma lista de países corruptores.
E neste nexo de causalidade entre a corrupção que vem do cenário internacional e as relações jurídicas e políticas internas é o elo mais importante da corrupção no país. As grandes corrupções do país vem desta relação de uma relação de corrupção que é importada daqui pra dentro a partir dos interesses ilegítimos de determinados grupos econômicos, determinados instituições que não respeitam a legalidade brasileira. Essa corrupção do cotidiano de fraude em licitação, edital mal feito,por favorecimento, essa aí tem um combate frontal, está reduzindo eu diria radicalmente no país. A grande corrupção que é a corrupção sistêmica da globalização patrolada sobre os países da periferia e que por dentro dela passam sistemas de corrupção que também nós estamos presenciando através das informações dos jornais essa é que nos estamos alcançando agora, com essas ações estruturais essas relações de colaboração profunda que a Controladoria Geral da União está estabelecendo com o Ministério da Justiça, através da Secretaria de Direito Econômico.
RÁDIO EMISORA RURAL-PETROLINA (PE)/MARCELO DAMASCENO: O deputado Ciro Gomes algum tempo atrás para a revista Caros Amigos falava de um centro clandestino que comanda as ações e tem uma influência muito grande do ponto de vista político e mais o que nós estamos tratando agora econômico aqui no Brasil. Preventivamente o quê essas medidas que estão sendo adotadas pelo governo federal na direção dos corruptores, isso venha dar uma segurança ao contribuinte que vê o seu dinheiro saindo pelo ralo. Nós temos uma Suécia na hora de arrecadar e temos aí um Haiti na hora de distribuir essa arrecadação em retorno social. Gostaríamos de algumas palavras dos dois ministros sobre isso em linhas gerais.
MINISTRO JORGE HAGE : Em primeiro lugar eu não concordo que nós tenhamos um Haiti aqui no lado da distribuição dos resultados da aplicação do dinheiro público, não. Pelo contrário, o Brasil é hoje um dos países reconhecidos por ter conseguido atingir um nível maior transparência para o cidadão, no que se refere a destinação do dinheiro público sobretudo para a sua aplicação nas áreas sociais. O Brasil, talvez, seja o país do mundo que divulga na internet a maior quantidade e no maior nível de detalhe de programas monumentais, como o programa Bolsa Família. Cada cidadão brasileiro em qualquer município do Brasil pode saber o nome e quantos reais cada beneficiário do Bolsa Família recebe a cada mês. Se ele quiser mais do que isso ele pode se inscrever também no sistema push no site do CGU e receberá no seu email a informação de cada centavo que for repassado para qualquer programa federal no seu município. O Brasil é um país que já tem um sistema sofisticado de acompanhamento de gastos públicos, e na aérea de prevenção, voltada mais para o lado corruptor como você se referiu. O Brasil está caminhando rapidamente para preencher como eu disse há pouco, as últimas lacunas do seu sistema normativo.
Nós temos hoje já um cadastro que expõem para todos os níveis federativos, o nome, CPF, todos os detalhes das empresas que foram surpreendidas em algum ato de corrupção que é o Cadastro Nacional de Empresas Inidôneas e Suspensas que já contam com mais de mil empresas. Estão todas divulgadas no site do CGU e não somente aquelas que foram, digamos assim, pilhadas no ato corruptor pelo próprio governo federal, mas, também pro governo estaduais. Já temos uma dezena de governos estaduais que aderiram ao Cadastro e nos mandam as suas bases de dados de modo que se dê efetividade, a previsão legal de que quando uma empresa é declarada inidônea por um ente federativo, ela não deve poder fornecer para nenhum outro ente federativo, antes isso não existia. Uma empresa fosse declarada inidônea pelo governo de Pernambuco, ela continuava vendendo aos outros 26 estados brasileiro e a União também, porque eu não sabia o que o outro fazia . Isso hoje já não existe. De modo que eu não diria, até mesmo pelo fato de que o Brasil tenha sido chamado a expor a sua experiência em inúmeros eventos internacionais, este mês eu terei que comparecer a dois eventos internacionais, exatamente mostrando os avanços do Brasil. O ministro Tarso Genro com freqüência também vai para fora do país para as mesmas finalidades, tudo isso mostra que o Brasil está muito longe de poder ser comparado a qualquer outra dessas repúblicas.
MINISTRO TARSO GENRO: Todo o grande programa de transferência de renda é um programa que suporta erros, suporta algumas deficiências, isso é natural. Como em todo o país do mundo, seja na Suíça, seja na Inglaterra, seja no Brasil. Aqui no Brasil quando iniciou o Bolsa Família, o próprio programa foi impugnado, por um programa que era mero paternalismo, distributivismo paternalista. Depois esse programa adquiriu um respeito internacional por todas as entidades internacionais que tratam do assunto e todos os governos importantes do mundo, independentemente da sua colocação politica, então o programa começou a ser absorvido por uma certa parte da elite brasileira que se contrapunha à esse programa, porque até não entendia a necessidade que as pessoas tinham de ter alguns reais para comer. Mas, aí quando o programa começou a operar apareceram como evidentemente envolve 12 milhões de pessoas aproximadamente, de famílias, eles apresentam algumas deficiências e aí essas deficiências passaram a ser apontadas como elementos para neutralizar o programa, neutralizar inclusive o seu prestígio.
Teve até um jornalista que publicou um texto e eu fiquei abismado com esse texto porque ele estava indignado, porque uma família que estava recebendo o Bolsa Família comprou uma pequena geladeira, e aí ele mostrou aquela geladeira como uma distorção fundamental do Programa Bolsa Família, porque aquilo ali anulava a importância do programa, então você veja a mentalidade da pessoa que faz uma matéria como essa. Ela está sonegando o direito de uma pessoa ter um bem de consumo que foi construído, que foi concebido, ainda o século 19. E achando que isso aí é um excesso, anulava a importância do Bolsa Família porque uma família pobre que certamente reuniu a sua renda e passou a ter a possibilidade de comprar uma geladeira. A ideia é que o povo brasileiro no seu conjunto, com o programa distributivo como este possam chegar a ter geladeira, possam chegar a ir a escola, possam chegar a ter alimentação suficientemente digna, então é um programa na verdade que inicia uma ruptura com a pobreza absoluta e é assim que tem que ser compreendido, isso é uma grande vantagem pra um país como o Brasil, que tem um nível de pobreza ainda vergonhoso para todos nós.
RÁDIO MEGA-CAMPO GRANDE(MT)/RAFAELA GIBE: A corrupção não é um fato novo, já acontece faz muito tempo e não falo só no meio público, mas no político em geral. Essa atitude já trouxe e continua trazendo muitos prejuízos para todo mundo e a minha curiosidade é a seguinte: Por que essas ações de combate à grande corrupção estão sendo pensadas, estruturadas e vão ser realizadas fortemente somente agora?
MINISTRO TARSO GENRO: A Polícia Federal, que está sob minha jurisdição, está sempre no centro dessa questão da luta contra a corrupção no país. Eu acho que é porque o país está amadurecendo democraticamente. A partir da Constituição de 88, houve um processo de republicanização do estado brasileiro, que era um estado parcamente republicano autocrático antes. Com a Constituição de 88 ele avança. E aí os órgãos de controle e a qualidade de serviço público começam a melhorar com todas as indas e vindas que teve nesse período e com todas as tentativas que tivemos de esvaziar inclusive as funções públicas do Estado brasileiro.
Hoje, um policial federal, um fiscal do Tribunal de Contas, um quadro da Controladoria Geral da União quando vai fazer um trabalho , ele sabe que não vai ter sobre ele uma tutela política para poupar companheiro, para ele poupar pessoas que sejam das relações daqueles que detêm o eventualmente o poder de Estado. Isso está comprovado na sociedade brasileira. Nós tivemos episódios muito concretos em relação a isso, onde inclusive o próprio presidente da República deu um exemplo que é histórico pra esse país e que até hoje não foi suficientemente valorizado por determinados setores minoritários da opinião pública, quando o presidente encarou com absoluta naturalidade que fosse feita uma diligência da Polícia Federal numa pessoa das suas relações familiares, sem tomar qualquer atitude protetiva. Isto é um exemplo de dignidade pública, de responsabilidade republicana, que ecoa na sociedade brasileira. Hoje, os agentes públicos brasileiros que lutam contra a corrupção têm autonomia legal para desenvolver suas funções.
Esse combate à grande corrupção, que já teve grandes momentos aqui no Brasil vai continuar. Porque a Polícia Federal está cada vez mais aparelhada, seus quadros são cada vez mais responsáveis, a CGU está cada vez melhor organizada, o Tribunal de Contas está cada vez mais aparelhada. Então a taxa de corrupção que nunca será extinta, obviamente que a corrupção sempre vai acompanhar a própria existência do Estado, ela vai ser drasticamente reduzida cada vez mais no país em função dessas mudanças democráticas e do caráter que o presidente Lula emprestou ao seu mandato na luta que se trava nesse fronte.
MINISTRO JORGE HAGE: Complementando o que o ministro Tarso já mencionou, eu quero dizer que o Brasil, pela primeira vez, está vendo seus órgãos trabalharem articuladamente. Não apenas a CGU, o Ministério da Justiça e o TCU como já mencionamos hoje, mas vários outros órgãos. O Coafe, que é o Conselho de Controle das Atividades Financeiras do Ministério da Fazenda. O Coafe no atual governo passou a ter uma articulação direta com a CGU, de forma que ele nos comunica todas as operações atípicas ou suspeitas de todos os clientes da rede bancária do país que sejam agentes públicos. Se um agente público federal fizer um depósito ou uma retirada em dinheiro, ou fizer uma compra de um imóvel de valor um tanto incompatível com seu perfil de cliente, o banco é obrigado a comunicar isso ao Coafe. Hoje, o Coafe comunica isso à CGU e ao Ministério da Justiça e ao Ministério Público de forma automática. Este é mais uma linha de articulação. Firmamos um convênio com a Receita Federal, de modo a podermos acompanhar a evolução patrimonial dos servidores públicos, sobretudo dos ocupantes de altos cargos estratégicos e cargos em comissão, que já era obrigados a entregar a declaração de bens quando tomam posse e quando saem. Só que essas declarações ficavam só enchendo armários nos órgãos públicos. Ninguém fazia nada com elas, até porque, nas dimensões da Administração Pública no Brasil é impossível trabalhar com isso em papel. Hoje isto se faz por meios eletrônicos. De modo que são vários aspectos que fazem com que o Brasil nos últimos anos tenha dados passos gigantescos em termos de organizar-se o Estado para enfrentar a corrupção, que é um crime como tantos outros.
RÁDIO CULTURA-FOZ DO IGUAÇU (PR)/CIDA COSTA: Uma colocação importante: o que se faz aqui na nossa fronteira, as ações por parte do governo na infraestrutura, de melhorar a nossa segurança, na fronteira do Brasil com o Paraguai, Brasil com a Argentina tem sido muito grande. Lavagem de dinheiro: nós tivemos muitas prisões aqui, há um tempo atrás se falou muito disso: o que aconteceu com a lavagem de dinheiro nessas fronteiras? Mudou alguma coisa?
MINISTRO TARSO GENRO: Nós temos um programa de instalação nos laboratórios de lavagem de dinheiro em todo país, um programa que é comandado pela Secretaria Nacional de Justiça, através do titular Romeu Tuma Júnior. O quê esses laboratórios fazem? Eles na verdade constituem um centro de inteligência que se relaciona hora com o Ministério Público, hora com a Polícia Federal, hora com a Polícia Civil dependendo da natureza da ação que se desenvolve nas regiões. Se articula com a Coafe, com a própria Controladoria Geral da União, quando ela passa alguma informação, ou necessita de alguma informação. Trata-se na verdade de um software que consegue perseguir um recurso que é depositado num determinado banco e que é capilarizado pela rede financeira internacional, perseguir sua destinação verificando todo trânsito que ele faz no sistema financeiro internacional e as pessoas que se relacionam com estes recursos.
Estes laboratórios de lavagem de dinheiro estão dentro deste processo internacional através do Incla, mencionado pelo Jorge Hage e tem uma finalidade estruturante. Ou seja, não adianta somente combater o crime e prender o criminoso. É necessário atacar seus recursos e o ataque aos seus recursos significa a capacidade de persecução desses seu valores nesta ramificação internacional e a relação dos destinatários que estão envolvidos na rede criminosa. Os laboratórios de lavagem de dinheiro são hoje os instrumentos fundamentais de combate a esse tipo de delito, principalmente esses delitos transacionais, esses delitos internacionais que dão suporte ao crime organizado, inclusive financiam suas atividades.
RÁDIO 96 FM-PALMAS(TC)/RUBENS GONÇALVES: Aqui em Palmas, por recomendação da Controladoria Geral da União, mais de R$ 300 milhões em obras federais foram bloqueados, recursos do PAC. Temos também aqui problemas na ferrovia Norte-Sul. Com relação à elaboração desse projeto de lei que está sendo elaborado para coibir essa prática de corrupção na execução da Administração Pública? Em 93, quando foi criada a lei 8.666, a lei de licitações, acreditava-se que era um passo importante para o combate a esse tipo de coisa e não aconteceu. Essa lei, essa nova lei, esse projeto efetivamente vai melhorar? O problema não seria o cumprimento de lei e não a falta de uma nova lei?
MINISTRO JORGE HAGE: Vamos começar rapidamente mencionando a sua referência inicial. A CGU não bloqueia a transferência de recursos, não recomenda a paralisação de obras a não ser em situações extremas, como a que tivemos há alguns meses atrás, aliás, no ano passado, por ocasião da operação João de Barro com a Polícia Federal, porque ali já se havia detectado a existência de um gigantesco esquema corruptor e para que o inquérito pudesse avançar mais e pudéssemos nos apropriar dos dados e informações e das provas, foi necessário suspender a transferência de recursos durante dois meses, mas isso foi logo em seguida liberado. O que a CGU procura fazer nesses casos é recomendar ao órgão que retenha a parcela de recursos necessária para compensar aquela parte eventualmente (inaudível), mas sem paralisar a obra.
O próprio Tribunal de Contas da União tem caminhado também nessa direção, atendendo aos apelos do próprio presidente da República, no sentido de que a paralisação de obras às vezes é mais prejudicial do que correr-se até algum risco com a sua continuidade, mas tudo depende evidentemente em cada caso concreto. Na área do Tocantins nós tivemos alguns problemas realmente relacionados à Valec recentemente. Mas passando agora à parte principal da sua pergunta: de fato o Brasil em muitas situações dependeu muito mais de uma melhor aplicação das leis existentes do que da criação de novas normas legais. Mas esse não é o caso no tocante a essa questão da responsabilização da pessoa jurídica, esse projeto de lei que nós mencionamos no início. É que a lei 8666 foi muito bem-vinda em 1993 e nós já estamos tirando tudo que ela pode dar. Ou seja, estamos aplicando sim as penas ali previstas, que são apenas a multa, a suspensão e a declaração de inidoneidade. Já temos mais de mil empresas divulgadas no site da CGU, punidas com as penas mais graves. Ou seja, suspensão e declaração de inidoneidade, sem contar as multas que são em quantidade infinitamente maior. A 8.666 só permite este tipo de pena, não permite o ressarcimento aos cofres públicos, não permite a extinção da empresa até no limite, não permite atingir o patrimônio da empresa, não permite, como eu disse, punir a empresa pelo suborno transnacional. Tudo isso representa realmente lacunas normativas. Por isso, nós precisamos também de novas normas nessa área.
RÁDIO VERDES MARES-FORTALEZA(CE)/NILTON SALES: Estou lendo uma nota que foi tirada da internet: os consumidores que sofrem com o descumprimento de serviços contratados junto a suas operadoras de telefonia ou de internet podem reincidir o contrato sem qualquer ônus, a despeito de prazo, de fidelização, ainda em vigor. Isso é o que determina uma nota técnica divulgada ontem pelo Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor do Ministério da Justiça. Agora, eu pergunto ao senhor: como é que eu devo fazer para pedir o cancelamento da assinatura sem ter que ligar para a operadora?
MINISTRO TARSO GENRO: Você pode fazer através de uma comunicação registrada em cartório, que faz a prova da sua comunicação. A partir dessa comunicação está rescindido. Isto, na verdade, é um dos problemas que vêm sendo enfrentados por esse processo de regulamentação dos call centers. Veja que a sua pergunta encerra uma outra indagação. Por que as empresas ainda não se adaptaram ao decreto? Eu não posso simplesmente telefonar e a partir do telefone fazer a rescisão desse contrato. Precisamente porque algumas empresas estão resistindo a esse tipo de regulamentação que foi feita pelo Ministério da Justiça, através de um decreto do sr. presidente da República. Eu quero dizer que a situação é uma situação intermediária. Muitas empresas que já se adaptaram, os serviços melhoraram. Outras melhoraram pouco, outras foram totalmente indiferentes à regulamentação prolatada pelo decreto presidencial. Essas que são indiferentes estão sendo duramente multadas. São multas, algumas de R$700 mil e outras estão sendo alvo de uma ação judicial de indenização por dano moral, proposta pelo Ministério da Justiça com recursos vultuosíssimos que reverterão para o Fundo de Proteção ao Consumidor.
Essa é uma batalha na verdade que é recente e está começando. Mas é importante nós salientarmos para que a gente não passe uma visão pessimista para a sociedade. Nós estamos agora, neste momento, encomendando uma pesquisa, estamos publicando um edital para encomendar uma pesquisa, para verificar quais os efeitos desse decreto presidencial, nós temos que dizer que muitas empresas se adaptaram perfeitamente e nós vamos publicar, inclusive, proximamente, a lista das empresas que se adaptaram para orientar o consumidor nas suas escolhas. Isso vai prejudicar evidentemente aqueles que não se adaptaram à lei, mas isso é um jogo com um concorrencial, eu diria legítimo, porque o Estado tem que informar o consumidor da melhor possibilidade que ele tem para fazer os seus contratos, dentro de uma regulamentação que é feita pelo próprio Estado. Essa é a situação atual. Eu recomendaria, modestamente, que os senhor fizesse uma comunicação registrada em cartório para que a partir disso, o senhor pudesse tomar, inclusive, providências judiciais indenizatórias contra essa empresa que não tem lhe atendido através do seu call center.
RÁDIO CLUBE-BELÉM (PA)/NONATO CAVALCANTE: A controladoria geral da União e o Ministério da Justiça estão elaborando um Projeto de Lei que visa ampliar o rol de punições a empresas privadas pilhadas na prática de corrupção quanto da execução de contratos com a Administração Pública. Eu gostaria que o ministro Tarso, aí, o doutor Jorge falassem sobre essa pretensão efetiva da perseguição a essa prática de corrupção.
MINISTRO JORGE HAGE: Esse projeto vem para cobrir uma lacuna, ou seja, nós não temos hoje, no Brasil, aparato legal, instrumento legal e adequado para aplicar às empresas determinadas espécies de penalidades, de modo a desencorajar a prática de ilícitos. A única possibilidade que existe na esfera administrativa é a declaração de inidoneidade ou a suspensão da empresa, ou a aplicação da multa. Mas isso é pouco, isso não resolve tudo. Não temos forma de atingir o patrimônio da empresa, a não ser que consigamos na via judicial provar a culpa ou dolo do agente público numa ação de improbidade administrativa, e daí, por via oblíqua e indireta, alcançar a empresa corruptora como terceiro beneficiado nesta relação.
Então, é algo complicado, é algo difícil, porque pressupõe a prova da culpa, ou seja, responsabilidade subjetiva de um agente público, para daí apanhar-se a empresa na condição de terceiro beneficiado ou terceiro interessado. Você sabe que isso não é fácil e que o processo judicial no Brasil lamentavelmente não termina nunca. Por quê? Porque o Brasil é o país do mundo que oferece aos réus a maior possibilidade de recursos de incidentes processuais e de chicanas protelatórias, que não deixam um processo chegar ao fim. Isto resulta em quê? Na sensação de impunidade que a população sente. Por quê? Porque não adianta acionar na Justiça, porque se o réu for endinheirado e puder pagar bons escritórios, o seu processo nunca termina. O quê que nós precisamos? Precisamos de instrumentos legais, que permitam a você alcançar o patrimônio da empresa diretamente. Primeiro, alcançar o patrimônio, segundo, fazê-lo diretamente, através da responsabilidade objetiva, que não depende da prova da culpa, não depende da prova de ela ter conseguido efetivamente sucesso no seu objetivo ílicito, não precisa isso. São essas normas que o Brasil não tem. Além do quê, como eu já disse antes, nós não temos ainda, não atendemos ainda à exigência da convenção de que o Brasil é signatário da OCDE, sobre suborno transnacional, que é o suborno de funcionários de governos estrangeiros ou de organismos internacionais por empresas brasileiras que atuam no exterior.
Tudo isso, esse projeto vem atender. Além disso, há um projeto do deputado Henrique Fontana, que já tramita no Congresso Nacional, que visa a responsabilidade criminal da pessoa jurídica, mas isso já abre um outro tipo de problema, porque é algo extremamente controvertido do ponto de vista jurídico, se tem cabimento no nosso sistema constitucional responsabilizar criminalmente a empresa, a pessoa jurídica. O empresário, sem dúvida. Mas a pessoa jurídica. Então nós estamos caminhando junto com o Ministério da Justiça para a responsabilidade administrativa e civil, que é o que mais interessa, que é o ressarcimento dos cofres públicos.
RÁDIO GLOBO-TERESINA (PI)/YANTOK SILVA: O que se vê muito no Brasil é o expediente de lobistas em várias instituições. Os ministros já pensaram, por exemplo, numa regulamentação do lobby no Brasil?
MINISTRO TARSO GENRO: Essa questão é uma das questões provavelmente mais controversas para ser enfrentada pelo projeto democrático. Por que o lobby, objetivamente, existe sobre o Estado, em todas as suas esferas não há a menor dúvida que existem grupos de influência. Esses grupos de influência podem exercer sobre o Estado uma influência legítima, como podem exercer sobre o Estado uma influência corruptora. Não é novidade pra nenhum ministro que lida com interesses econômicos do Estado ou que tenha algum tipo de função fiscalizatória, ele receber, por exemplo, em seu gabinete, pessoas remetidas por deputados, ou por partidos ou por senadores, de maneira totalmente lícita e transparente, que vêm fazer um determinado pleito. Determinado pleito que diga respeito, por exemplo: aquele edital que está sendo redigido em tal ministério, ele tem que ser fiscalizado, no meu caso, por exemplo, tem que ser avaliado pela Polícia Federal, por que aquilo ali pode ser uma notícia de um crime. O edital ele está sendo redigido para proteger tais ou quais empresas. Isto é um lobby, é uma influência, é uma forma de se reportar ao Estado que é totalmente legal, totalmente legítima e é necessária, inclusive. Muitos processos criminais começam por informações como essas, por investigações na CGU, investigações no próprio Tribunal de Contas.
Agora existe um outro processo que é o processo de criação de normas legais para proteger determinados setores. Esta influência pode ser uma influência também legítima, onde os setores econômicos e os setores do mundo do trabalho vão para cima dos deputados, para cima dos senadores, para discutir um determinado conceito legal, que vai ter influência na sua atividade econômica ou nos direitos dos trabalhadores. Qual é a esfera gris, qual é a zona gris que está aí? A zona gris, que requer uma atenção do Estado, e por isso, na minha opinião, o lobby deve ser regulamentado de maneira exaustiva e com consequências penais muito duras, é quando essas influências são utilizadas para distorcer o interesse público que deve estar retratado em uma determinada lei e ela visa proteger um interesse econômico específico de um grupo empresarial, de uma empresa ou de uma pessoa física, distorcendo portanto a finalidade do processo Legislativo, realizando uma pressão que vai determinar uma ilegalidade, porque vai determinar um trato desigual, em uma determinada circunstância, a grupos empresariais ou a grupos do mundo do trabalho, ou até internamente entre as empresas e entre os trabalhadores, que, em última análise, estão sempre atentos ao que ocorre no Congresso. Eu sou favorável sim, a que nós tenhamos uma dura regulamentação do lobby e que possamos separar, colocar de uma maneira bem clara, em um sistema informativo bem eficiente, bem transparente, aquilo que é legítimo como lobby, como movimentação de influência, feita de maneira aberta e conhecida da sociedade, para que nós possamos tirar da clandestinidade, inclusive, ou penalizar duramente, essas influências que se dão nessa zona gris, que em última análise, é onde se realiza o delito. E, muitas vezes se estabelecem os compromissos políticos que vão gerar deformações no estado de direito.
MINISTRO JORGE HAGE: O Tarso já respondeu muito bem a pergunta e eu queria só acrescentar uma palavra. De um lado, nós temos que reconhecer que é absolutamente legítima a pressão dos interesses, dos grupos de interesse, inclusive em questões que nada têm propriamente de interesse econômico, a discussão, por exemplo, de pesquisas com células-tronco. São questões que diferentes grupos sociais têm o direito. É inerente à democracia se manifestar. Seja perante o Executivo, seja o Judiciário, seja o Legislativo. De outro lado, nós temos a necessidade premente de dar maior transparência a esse jogo de influência. E é exatamente isso que o projeto visa: equilibrar, de um lado distinguindo o lobby legítimo do lobby criminoso, e de outro dando transparência para que toda a população saiba o que está acontecendo.
APRESENTADORA KÁTIA SARTÓRIO: Ministro Tarso Genro, rapidamente, inclusive tem um seminário internacional – que vocês começaram e vai até sexta-feira, aqui em Brasília, discutindo todos esses temas. Inclusive o combate à corrupção, a lavagem de dinheiro. Não é isso?
MINISTRO TARSO GENRO: A extinção de domínios é um dos elementos dessa luta que o Jorge mencionou e que se refere a levar para o nível de uma ação civil a possibilidade de extinguir o domínio de um determinado bem obtido de maneira criminosa. Atualmente os mecanismos judiciais e jurídicos são insuficientes para que o estado possa inclusive interromper o ciclo de acumulação criminosa que se dá fundamentalmente através do processo penal. Essa ação civil, ela daria mais rapidez, uma capacidade maior de incidência do Estado e favoreceria a interrupção da acumulação criminosa, que certamente sempre gera outros delitos.
APRESENTADORA KÁTIA SARTÓRIO: Ministros, Tarso Genro e Jorge Hage, eu gostaria de agradecer mais uma vez a participação dos senhores nesse programa especial Bom Dia, Ministro de hoje e convidá-los a voltarem sempre que puderem.
Fonte: Agência Brasil