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SP: Moradores de Heliópolis protestam contra morte de adolescente

Moradores da segunda maior favela do país atearam fogo em pelo menos dois carros no início da noite desta terça-feira (1/9), em protesto contra a morte da adolescente de 17 anos, vítima de uma bala perdida durante uma perseguição policial realizada ontem. Conam denuncia que violência policial em favelas tem sido constante em São Paulo.


Ana Cristina de Macedo voltava da escola pela estrada das Lágrimas, em Heliópolis, zona sul de São Paulo, na noite desta segunda-feira (31/8), quando foi atingida por um tiro no pescoço durante troca de tiros entre guardas civis de São Caetano do Sul (Grande São Paulo) e os suspeitos de roubar um Ford Ka. Ela foi socorrida e encaminhada para um hospital da região, mas não resistiu aos ferimentos e morreu. A jovem morava com a mãe e uma filha de um ano e oito meses.

Os protestos começaram pouco depois da meia-noite e foram dispersados cerca de 50 minutos depois pela polícia. De acordo com moradores, um segundo confronto ocorreu por volta das 4h de terça-feira (1/9). O terceiro e mais grave protesto teve início no mesmo dia, por volta das 18h30. Moradores atearam fogo em quatro veículos.

Os manifestantes teriam tentado invadir um batalhão da Polícia MIlitar e escreveram a palavra "justiça" no asfalto. Em outros pontos da favela, alguns moradores atearam fogo em mais 5 ônibus. Quando a PM chegou, pelo menos três carros policiais foram apedrejados. Moradores relatam que houve troca de tiros. Por volta das 20h, a Tropa de Choque  iniciou uma varredura na favela. Os confrontos cessaram por volta das 21h30. Após as 23h, a Tropa de Choque voltou a entrar na favela, com a notícia de uma nova barricada.

Segundo moradores, o principal motivo da revolta foi a suposta demora para a adolescente ser levada ao hospital vizinho. Ana Cristina só teria sido removida depois que policiais civis e militares chegaram.  "Minha sobrinha foi pega por dois guardas e jogada como se fosse um saco dentro do carro", revolta-se a tia da adolescente, Gorete Macedo, de 46 anos.

Heliópolis é a segunda maior favela do Brasil, sendo menor apenas que a favela da Rocinha, no Rio de Janeiro, e, desde junho, esse foi o terceiro protesto em Heliópolis contra ações da polícia.

Conam denuncia violência policial em SP

A presidente da Confederação Nacional de Associações de Moradores (Conam), Bartíria Lima da Costa, denuncia que têm sido constantes ações violentas das polícias em São Paulo. A presidente da Conam relata que a reação dos moradores de Heliópolis foi espontânea e avalia que reações como esta são consequência da "falta de presença do Estado" aliada a uma "política de repressão". "A polícia tem sido ostensiva , aje com violência. Em geral, chegam nas comunidades atirando", denuncia.

Bartíria reconhece que a questão da violência urbana é uma questão em todo o país, especialmente nas metrópoles, mas ressalta que os casos de desocupações promovidas pela polícia têm sido uma constante no estado de São Paulo. "Lançamos a campanha 'Despejo Zero', contra as desocupações que estão ocorrendo e chegamos a denunciar a frequência com que estas desocupações têm ocorrido em São Paulo ao Ministro das Cidades". A denúncia foi feita durante jornada da Conam em Brasília, em agosto.

Tiroteio

O tiroteio que vitimou Ana Cristina ocorreu durante uma perseguição que começou em São Caetano do Sul.  Os suspeitos entraram com o carro roubado na favela de Heliópolis, quando guardas civis atiraram no pneu do carro. O motorista perdeu o controle do veículo e bateu em um Corsa que trafegava pela via. Ao descerem do carro, os suspeitos trocaram tiros com os guardas e uma bala atingiu a adolescente no pescoço.

Uma mulher que estava no banco de trás do carro foi presa por suspeita de envolvimento no roubo. Ela afirmou à polícia que era vítima de um sequestro, mas a dona do Ka roubado afirmou que a suspeita estava com o homem que levou seu carro. Ela não tinha passagem anterior pela polícia, segundo o boletim de ocorrência. O homem que dirigia o Ford Ka conseguiu fugir. A polícia investiga ainda o envolvimento de uma terceira pessoa.

Planos interrompidos

Nascida em Cratéus – interior cearense -, Ana Cristina chegou a São Paulo, trazida pela mãe, quando tinha apenas três anos. O servente de pedreiro Bruno de Souza Alves, 20, namorado da jovem havia quatro anos e pai de Nataly Vitória Macedo, de um ano e oito meses, contou que o plano do casal era mudar-se para Carapicuíba (grande SP) até dezembro.

"Nossa casa já está mobiliada. Não fomos antes porque ela poderia perder um ano no colégio. Não sei como isso foi acontecer com uma pessoa como ela. Era uma ótima mãe", disse Bruno.

Suspeito de autoria do tiro é ex-PM

O guarda civil Edson Damião Estevam, suspeito de ser o autor do disparo que matou Ana Cristina de Macedo, foi expulso da Polícia Militar, segundo a corporação, em 1997, um mês após completar quatro anos de serviço. De acordo com a PM, o motivo da expulsão não pôde ser divulgado ontem porque o processo está num "arquivo morto" do 8º Batalhão, no Tatuapé (zona Leste de São Paulo), última unidade do ex-policial.

A prefeitura de São Caetano do Sul informou que não sabia da expulsão de Estevam da PM, mas informou que vai investigar o caso. Segundo a prefeitura, PMs expulsos, mesmo que aprovados em concursos para a Guarda Civil Municipal são automaticamente desclassificados. O guarda civil não foi localizado.

Com Folha Online e jornal Folha de S. Paulo (2/9)