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Senado aprova texto-base da reforma eleitoral e adia polêmicas

Numa votação cercada de confusão, o Senado aprovou na noite desta quarta-feira (9) o texto básico do projeto de lei que estabelece novas regras eleitorais, mas a decisão sobre o uso da internet na eleição e outros pontos polêmicos da reforma ficaram para ser votados nesta quinta-feira.

O adiamento desta quarta-feira aconteceu após um debate em plenário sobre a emenda do senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) que determina a realização de nova eleição no caso da cassação de mandato de cargos executivos. A intenção seria evitar a posse de candidatos derrotados. O presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP) foi um dos mais veementes críticos da proposta. Para ele, a mudança só poderia ser feita por emenda constitucional. Segunda colocada na eleição de 2006, a filha de Sarney, Roseana, assumiu o cargo de governadora do Maranhão após a cassação de Jackson Lago (PDT). Este tema não chegou a ser votado e deve ser analisado hoje.

A sessão foi suspensa às 22h30 e remarcada para as 9h desta quinta-feira. Havia 14 destaques para votação em separado de emendas dos senadores. Destas, duas deveriam ser votadas nominalmente. Havia ainda pedido para votação nominal de outras quatro.

As emendas apresentadas em plenário pelos senadores Marco Maciel (DEM-PE) e Eduardo Azeredo (PSDB-MG), relatores do projeto no Senado, foram negociados com o relator do projeto na Câmara, deputado Flávio Dino (PCdoB-MA).

Sites pessoais e blogs estão livres para opinar

A principal emenda dos relatores permite a livre manifestação do pensamento em blogs assinados por pessoas físicas, redes sociais (como o Orkut e Facebook), sítios de interação e de mensagens instantâneas (como o Twitter), entre outras formas de comunicação na internet. Nesses formatos fica permitido fazer propaganda eleitoral de candidato, partido político ou coligação, bem como dar tratamento privilegiado a qualquer um destes.

Já as empresas de comunicação social na Internet e os provedores com conteúdos próprios terão de atuar de maneira imparcial: não poderão dar tratamento privilegiado a candidato, partido ou coligação, sem motivo jornalístico que o justifique, a partir do dia 5 de julho do ano da eleição. Em todos os casos, a proposta veda o anonimato e assegura o direito de resposta mediante decisão judicial.“Nos sítios destinados à veiculação de notícias e informações ao público, aplicam-se as mesmas regras para jornais”. A esses espaços também é vedado “veicular imagem de realização de pesquisa ou consulta popular de natureza eleitoral, que permita a identificação de pessoa entrevistada ou que contenha manipulação de dados, ainda que sob a forma de entrevista jornalística”.

A emenda prevê multa de R$ 5 mil a R$ 30 mil para o responsável pela divulgação de propaganda que contrarie as normas estabelecidas. Também o beneficiário estará sujeito a esta multa, desde que se comprove seu prévio conhecimento.

“O que está sendo incluído, é exatamente para esclarecer todo esse problema que se falou de censura. Não há nenhuma censura, não há nenhum objetivo de restrição da Internet. O que se está buscando é um nível de equidade de tratamento aos candidatos, para que não haja uma predominância do poder econômico”, argumentou o relator Eduardo Azeredo.

Porém, uma emenda apresentada pelo líder do PT, Aloízio Mercadante (SP), retira do texto qualquer restrição à web. Romero Jucá (PMDB-RR), Arthur Virgílio (PSDB-AM) e Marina Silva (PV-AC) são alguns dos senadores que já declararam posições semelhantes à de Mercadante. A emenda terá votação nominal nesta quinta-feira (10).

Debates na web terão regras iguais do rádio e TV

O projeto apresentado no Senado enfatiza que os provedores de internet e empresas de comunicação social na rede poderão realizar debates entre os candidatos. Elas, no entanto, deverão cumprir as normas previstas para debates no rádio e na televisão: “A realização de debates nas eleições majoritárias por emissoras de rádio, televisão e Internet está assegurada com a concordância e a participação de dois terços dos candidatos ou de partidos que tenham pelo menos 10 deputados federais.” O debate desta emenda gerou polêmica. Enquanto o senador Aloizio Mercadante considerou que a medida impede que "oportunistas sem votos e sem ideais inviabilizem os debates", a senadora Marina Silva afirmou ser preciso acabar com o círculo vicioso segundo o qual "partido que não tem espaço não cresce e partido que não cresce não tem espaço". O tema também é alvo de destaque a ser analisado nesta quinta-feira.

Se a emenda dos relatores for mantida, os principais pré-candidatos à presidência da República poderão participar dos debates –com exceção da ex-senadora Heloísa Helena, uma vez que o PSOL não reúne dez parlamentares no Legislativo. O texto abre brecha, porém, para que as emissoras estejam liberadas a convidar os candidatos que desejar, o que incluiria a pré-candidata do PSOL nos debates.

Outra emenda apresentada pelos relatores corrige alteração feita no Senado, que proibia a participação de candidatos em inaugurações ou lançamentos de pedra fundamental de obras públicas até seis meses antes da eleição. O prazo foi reduzido para quatro meses, uma vez que é este o prazo para a escolha dos candidatos nas convenções partidárias.

Além das emendas dos relatores, foram apresentadas 20 emendas de Plenário. A princípio, todas tiveram parecer contrário de Eduardo Azeredo e Marco Maciel. Mas os relatores aquiesceram diante da insistência de Mercadante na defesa de duas emendas que apresentou: a que permite reajuste no valor de benefícios concedidos por meio de programas de assistência social, desde que haja previsão orçamentária para tal; e a que permite a candidatos manifestarem-se por meio da internet – seja em páginas de campanha, blogs pessoais, sites de relacionamento ou mensagens eletrônicas – nas 48 horas que antecedem o pleito. O argumento utilizado foi que, como outros sites e blogs poderão fazer críticas aos candidatos, eles devem ter o direito de defesa.

Propaganda paga só para presidente

Houve muita polêmica e confusão na votação dos destaques. No primeiro deles, o presidente José Sarney, que comandava a sessão plenária confundiu-se e disse que havia parecer favorável dos relatores, embora este fosse contrário. A emenda, apresentada pelo senador Inácio Arruda (PCdoB-CE), proibia a propaganda paga na internet. O objetivo da emenda era promover tratamento igual e evitar o abuso do poder econômico na campanha eleitoral pela internet. A emenda foi aprovada, mas, depois, em nova votação, foi rejeitada.

Assim, os candidatos à Presidência da República poderão fazer propagandas em sites jornalísticos, como fazem em jornais e revistas, desde que a publicidade seja paga e que o anúncio tenha no máximo um oitavo da página. Além disso, o número de propagandas que poderão ser inseridas por cada candidato deverá ser limitado em 24 por campanha.

Mesmo com as limitações, o resultado favorece as grandes empresas de comunicação que terão na propaganda eleitoral na internet mais uma fonte de receita.

Outra polêmica envolveu a emenda apresentada pelo senador Pedro Simon (PMDB-RS), que exige reputação ilibada e idoneidade moral dos candidatos para cargos eletivos. O líder do governo,  Romero Jucá, recuou do pedido de votação em separado da emenda de Simon, que, sem saber disso, acabou pedindo votação nominal. No final, prevaleceu o texto da emenda que havia sido aprovada na CCJ e na CCT.

Pesquisas terão de usar dados do IBGE

Os senadores também aprovaram o projeto que obriga os institutos de pesquisa a usarem os dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Pesquisa, Geografia e Estatística) na elaboração de suas pesquisas. A emenda é do senador Marcelo Crivella (PRB-RJ).

Segundo o texto aprovado, os institutos de pesquisas terão de usar o "plano amostral e ponderação quanto a sexo, idade, grau de instrução e nível econômico" na mesma proporção da população fornecida pelo IBGE em suas estatísticas.

Os institutos não terão mais liberdade para fazer entrevistas de acordo com os parâmetros que desejarem. Os pesquisadores, por exemplo, terão de entrevistar a mesma proporção de mulheres da população total em suas pesquisas -o que não ocorre necessariamente entre o número total de eleitores.

Propaganda de rua continua proibida

O projeto também mantém a proibição para a propaganda eleitoral em locais públicos, como ruas e avenidas. Em casas particulares, o acordo prevê que só estarão permitidas faixas ou cartazes não colantes (banners), no tamanho máximo de 4 metros quadrados. Mesmo em propriedades privadas, estão proibidos pinturas em muros, placas ou cartazes.

Os senadores ainda decidiram acabar com o voto impresso. Se houver necessidade de auditagem nas urnas eletrônicas, o conteúdo digital terá que estar disponível para conferência até seis meses depois das eleições. Pelo acordo fechado entre os senadores, não há possibilidade de voto em trânsito se o eleitor não estiver no Estado que é seu domicílio eleitoral.

Outra emenda aceita no projeto proíbe a ampliação de programas sociais no ano eleitoral –uma vez que hoje é vedada apenas a criação de novos programas. A versão original da emenda era mais dura, proibindo também reajuste no valor dos benefícios de programas como o Bolsa Família. Mas os senadores decidiram autorizar reajustas nos programas, sem mudanças nas suas regras no período pré-eleitoral.

Mulheres terão mais espaço

Também houve acordo para ampliar a participação das mulheres nas eleições. Os partidos terão que preencher 30% das suas vagas com mulheres, que terão 10% do tempo de propaganda eleitoral gratuita e 5% do fundo partidário. Os partidos que não cumprirem essa determinação, sofrerão advertência e acréscimo no tempo das mulheres na propaganda partidária –assim como aumento dos repasses partidários para as candidatas.

Outra mudança diz respeito às dívidas de campanha. O texto acordado pelos senadores prevê que o próprio candidato ou o diretório regional do partido deve arcar com dívidas eleitorais, sem transferi-las de imediato para instâncias superiores da legenda.

Ficam liberadas, pelo projeto, doações de campanha pela internet, cartão de débito, crédito, transferência, boleto bancário ou telefone –desde que identificado o doador com a emissão do recebido pelo partido ou candidato.

Após a votação do destaques finais nesta quinta-feira, o projeto de reforma eleitoral retorna à Câmara onde, para prevalecer já nas eleições de 2010, as modificações na legislação têm de ser sancionadas pelo presidente da República e estar publicadas no Diário Oficial da União até o dia 3 de outubro, ou seja, um ano antes do pleito.

A proposta de reforma eleitoral surgiu na Câmara depois do fracasso da tentativa de aprovar uma reforma mais profunda e estrutural. A chamada "reforma política" estabeleceria o voto em lista fechada por partidos políticos e o financiamento público de campanha.

Da redação,
com agências