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Rodrigo Vianna: As alternativas à crise no jornalismo

A leitora Marúcia Cabral (que cumpre um papel muito interessante, fazendo circular entre os blogueiros informação de primeira) envia-me um texto importante, que publico abaixo: é sobre o lançamento de um jornal na Itália, subvencionado pelos próprios leitores. Chegou às bancas já com 30 mil assinantes.

No Brasil, talvez, seja difícil lançar um jornal desses, em papel. A distribuição é controlada por uma única empresa – ligada ao grupo Abril. Mas por que não conseguimos fazer algo parecido na internet? Há muito tempo, defendo o lançamento de um portal de notícias alternativo: de linha progressista, mas plural. Informativo, criativo, sem o ranço das velhas publicações de esquerda.

Já temos massa crítica e jornalistas dispostos a encarar uma empreitada dessa! Tenho certeza!

Aliás, acabo de ler no portal "Terra" a declaração de um jornalista francês, que participa de um debate sobre internet em São Paulo. Pierre Haski, editor-chefe do site Rue89.com, afirmou: "há uma crise moral no jornalismo" – Há mesmo, uma crise grave. Parte dos leitores e telespectadores já percebeu.

O Rue89 é um bom exemplo de alternativas possíveis: foi criado por profissionais que saíram da grande mídia – inconformados com a falta de espaço para fazer jornalismo de verdade.
Esse é o caminho.

Veja o que diz Pierre Haski: "Através da internet, buscamos saída para essa crise. A falta de confiança dos leitores pode ser reconstituída na internet. A conversa com os leitores pode melhorar isso. Nós tivemos muita sorte de ser o primeiro jornal eletrônico diário a ser publicado dessa forma e com esse tipo de pensamento na França", disse.

Ele afirma que o site começou sem dinheiro e um grupo de quatro jornalistas fez o primeiro aporte, de 400 mil euros. "Tínhamos quatro fundadores e outras pessoas se uniram a nós. Hoje temos cerca de 20 pessoas".

Agora, volto eu. Há "blogueiros" que não gostam dessa idéia de um portal, ou um site, que unifique esforços e recursos. Acham que o ideal é deixar tudo como está, com várias vozes pulverizadas pela internet.

Humildemente, discordo. Acho que caminho não é por aí… É preciso criar uma "contra-pauta", estabelecer uma agenda alternativa àquela imposta (ainda) pela mídia tradicional. Isso não se consegue com pequenos blogs.

É preciso disputar manchetes. Não basta dar opinião, é preciso ter equipe de repórteres na rua. Do contrário, ficamos só a repercutir, ou a criticar, o que a grande mídia nos oferece.

No Brasil já há acúmulo para dar um passo à frente. E o mais interessante: um portal como esse não significaria tirar autonomia de blog nenhum. Cada um seguiria com seu espaço individual, mas a gente poderia "engrossar o caldo", obtendo recursos para pagar também uma equipe de repórteres.

Por que, não?

A bola tá quicando na área. É preciso mandar pra rede…

Abaixo, o texto que me foi enviado pela Marúcia, sobre o novo jornal italiano. (texto publicado pela "Caros Amigos")

Il Fatto Quotidiano: por uma imprensa livre

Em poucos dias de campanha promocional via rádio e Internet, o primeiro jornal italiano auto financiado recolheu cerca de cinco milhões de euros em assinaturas

por Anelise Sanchez

Roma – No último dia 23 de setembro, os italianos vivenciaram um acontecimento inusitado. Pela primeira vez, as bancas de jornais de todo país receberam exemplares do primeiro jornal auto financiado, chamado de Il Fatto Quotidiano.

Fundado por Antonio Padellaro, ex -diretor de L’Unità – antigo órgão oficial do Partido Comunista Italiano – e aplaudido pela nata do jornalismo de esquerda, o veículo conquistou 30 mil assinantes antes mesmo da publicação de sua primeira edição. Um sinal inequívoco da fome italiana por uma imprensa desvinculada dos interesses partidários e daqueles privados.

Historicamente, a subvenção pública em favor da editoria italiana aprofunda as suas raízes no período fascista, quando o chamado Ministério da Cultura Popular apoiava politicamente o lançamento da revista quinzenal La Difesa della Razza (A Defesa da Raça). O fascismo desmoronou e nasceu a República mas, mesmo assim, o apoio estatal aos jornais sofreu inúmeros retoques, mas permaneceu vivo.

Nas últimas décadas, o objetivo do governo era garantir o pluralismo e favorecer a circulação de idéias mas, na verdade, a mídia do país foi dominada por jornais que firmaram-se graças a uma declarada filiação política partidária.

Tudo começou em 1981, após a promulgação de uma lei que previa um auxílio econômico estatal aos editores de jornais e periódicos considerados órgãos de partido. Mais tarde, em 1987, a normativa sofreu algumas alterações. A principal delas estabelecia que o financiamento seria destinado aos jornais de facções políticas que tivessem no minimo dois deputados eleitos no Parlamento.

Foi o início de um matrimônio indissolúvel entre imprensa e poder que, em pouco tempo, gerou mais de 386 periódicos que reivindicavam o próprio direito de obter o financiamento.

Em 2000, a lei tornou-se mais restritiva, elevando a dez o número mínimo de parlamentares para obter ajuda econômica como jornal de partido e especificando que a subvenção também poderia ser destinada à publicações editadas por cooperativas de jornalistas ou fundações sem fins de lucro.

Sendo assim, não é difícil entender o crescimento substancial do número de cooperativas editoriais que criaram jornais “ad hoc” para beneficiar-se de tal subvenção que, desde 2008, não é mais propocional à sua tiragem.

Estima-se que, anualmente, o estado italiano desembolse quase 700 milhões de euros para financiar a imprensa, incluindo a católica. Segundo os últimos dados divulgados pelo Departamento da Informação e Editoria, só em 2007 o jornal Avvenire recebeu exatamente 6.174,758 milhões de euros.

A corrida para apoderar-se de uma polpuda fatia desta subvenção inclui jornais de direita e de esquerda, sem excluir aqueles que defendem com unhas e dentes a livre empresa e condenam o assistencialismo, como Il Foglio e Libero.

Hoje, com a crise da mídia impressa, muitos jornais italianos não sobreviveraim sem este apoio econômico, principalmente depois que o ministro da economia Giulio Tremonti anunciou cortes de 83 milhões para esta verba em 2009 e de 100 milhões em 2010.

Por este motivo, o lançamento do jornal Il Fatto Quotidiano representa uma novidade absoluta para o mercado italiano, pois recusará qualquer financiamento público, inclusive aqueles indiretos, como o reembolso de despesas como energia elétrica e tarifas postais do qual se servem grandes grupos editoriais privados. A idéia é sobreviver apenas com verbas representadas pelas assinaturas e as vendas nas bancas de jornais, publicando aquilo que para uma grande parte da imprensa não faz notícia.

No panorama italiano é difícil encontrar os chamados editores puros, dedicados exclusivamente ao setor da informação, mas Il Fatto é propriedade de uma pequena cooperativa de sócios, entre eles aqueles que compõem a sua redação e que possuem a mesma quota acionária. “É a única maneira de escrever com total liberdade intelectual, tratando temas que outros descartam por razões políticas, problemas de noticiabilidade o imposições provenientes do alto”, explicou Padellaro antes do lançamento da publicação.

Em poucos dias de campanha promocional via rádio e Internet, o novo jornal recolheu cerca de cinco milhões de euros em assinaturas e, no editorial do primeiro número de Il Fatto Quotidiano, Padellaro sublinha que, para quem lhe pergunta qual será a linha política do jornal, a resposta é uma só: a Constituição da República.
 

Fonte: Blog Escrevinhador