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Paul Krugman: Imposto para especuladores

Será que deveríamos usar impostos para impedir a especulação financeira? Sim, dizem as autoridades britânicas que administram um dos maiores centros financeiros do mundo, em Londres. Outros governos europeus concordam – e eles estão certos.

Por Paul Krugman, do The New York Times, na Terra Magazine

Infelizmente, as autoridades dos Estados Unidos – especialmente o Secretário do Tesouro, Timothy Geithner – são absolutamente contra a proposta. Esperemos que eles repensem a questão: este é um momento perfeito para a criação de um imposto sobre transações financeiras.

A discussão começou em agosto, quando Adair Turner, presidente da Autoridade de Serviços Financeiros da Grã-Bretanha, sugeriu o imposto sobre transações financeiras como uma forma de desencorajar atividades "socialmente inúteis". O primeiro-ministro britânico Gordon Brown aprovou a proposta, que foi apresentada na reunião das 20 maiores economias do mundo neste mês.

E por que essa é uma boa ideia? A proposta Turner-brown é uma versão atualizada da ideia que circulou originalmente em 1972, sugerida pelo prêmio Nobel de economia James Tobin. Tobin dizia que a especulação monetária – as transações que se beneficiam das flutuações de câmbio – estavam causando rupturas sérias na economia mundial. Para reduzi-las, ele criou um pequeno imposto módico para cada transação cambial.

O imposto representaria uma despesa trivial para aqueles envolvidos em comércio exterior ou investimentos de longo prazo; mas seria um grande desincentivo para os interessados em fazer dinheiro fácil e rápido com a especulação de mercado. Como Tobin mesmo dizia, o imposto iria "frear as rodas" da especulação.

A ideia de Tobin não chegou a lugar algum na época. Mais tarde, o tópico virou um dos assuntos prediletos da esquerda antiglobalização. Mas a proposta Turner-Brown, que implantaria o "imposto Tobin" a todas as transações financeiras – não apenas àquelas envolvendo moedas estrangeiras – é bastante coerente com as ideias de Tobin. Seria uma despesa trivial para os investidores de longo prazo, mas serviria para apaziguar a agitação que tomou conta dos mercados financeiros de hoje.

Isso seria ruim se a hiperatividade financeira fosse algo produtivo. Mas, depois do debate incansável dos últimos dois anos, parece haver um consenso – imagino que esse consenso exista mais especificamente entre as pessoas que não trabalham no mercado financeiro – com a declaração de Turner de que muito do que os mercados financeiros de Nova York e Londres fazem é "socialmente inútil". E o imposto sobre as transações geraria uma receita considerável, o que poderia aliviar alguns medos relacionados ao déficit governamental. Parece perfeito.

O argumento utilizado por aqueles que são desfavoráveis ao imposto é que ele seria impossível de ser aplicado porque os investidores encontrariam formas de evitá-lo. Alguns também dizem que a medida não surtiria efeito algum no comportamento destrutivo que causou a crise atual. Mas nenhuma dessas afirmações se sustenta.

Sobre a afirmação de que as transações financeiras não podem ser taxadas: o comércio moderno é extremamente centralizado. Veja o exemplo da proposta original de Tobin para o imposto sobre as negociações cambiais. Como colocar isso em prática se os envolvidos na compra e venda de moedas estão espalhados pelo mundo? A resposta é: muito embora eles estejam espalhados pelo mundo, a maioria das transações é finalizada e paga em uma instituição que fica em Londres. Essa centralização mantém o custo das transações baixo e é exatamente isso que mantém o volume de especulação alto. No entanto, a centralização também facilita a identificação e, por consequência, a aplicação de impostos.

E a afirmação de que um imposto sobre transações não sanaria o problema principal? É verdade que o imposto não impediria os maus empréstimos ou que os investidores ingênuos acabassem investindo tendo esses empréstimos como garantia.
Mas não é só de maus investimentos que a crise é feita. O que transformou esses maus investimentos em catástrofe foi a dependência exagerada do sistema financeiro no dinheiro de curto prazo.

Como mostraram Gary Gorton e Andrew Matrick, da Universidade de Yale, até 2007, o sistema bancário norte-americano tornou-se extremamente dependente em transações de recompra, nas quais as instituições vendem seus bens a investidores e prometem comprá-los de volta em um período curto de tempo — normalmente em um dia. As perdas ocasionadas pelas hipotecas deflagraram a crise porque elas inundaram o sistema — ouve uma onda de transações de recompra.

E um imposto para as transações financeiras, além de desencorajar a dependência de financiamento de curto prazo, impediria que isso acontecesse novamente. Então, ao contrário do que dizem os incrédulos, esse imposto teria sim nos ajudado a prevenir a crise atual – e ainda pode nos ajudar a evitar a próxima.

O imposto Tobin resolveria todos os nossos problemas? Claro que não. Mas seria parte do processo para "emagrecer" nosso setor financeiro inchado. Essa e outras questões provam que a administração Obama precisa se libertar da influência escravizadora de Wall Street.

Paul Krugman é economista, professor da Universidade de Princeton e colunista do The New York Times. Ganhou o prêmio Nobel de economia de 2008. Artigo distribuído pelo New York Times News Service.