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Robert Zoellick: O perigo das bolhas de ativos

Com dinheiro fácil e mercados de commodities instáveis, 2010 pode ser um ano perigoso para os preços dos alimentos

Por Robert Zoellick*, no jornal Folha de S. Paulo

Enquanto o mundo começa a se recuperar da pior crise econômica desde a Grande Depressão, a opinião dominante é que empregamos de maneira efetiva as lições do passado: injeções maciças de capital; uma dose de estímulo fiscal; e esforços para evitar as piores medidas protecionistas. Até mesmo mantivemos Ben Bernanke, um estudioso da Grande Depressão, no comando do Fed. Assim, o que podemos ter deixado escapar à nossa atenção?

O uso das velhas receitas pode ter consequências novas e inesperadas. Em 2008, quando os governos tiveram de encarar mercados financeiros paralisados pela possível quebra das contrapartes em transações, as autoridades utilizaram os instrumentos de que dispunham. Para manter o fluxo de crédito, os BCs abriram as torneiras monetárias.
Quando as ferramentas tradicionais da política monetária se provaram insuficientes, eles inventaram ferramentas novas para adquirir ativos ou conceder empréstimos garantidos por eles. E o método funcionou.

É claro que os governos sabiam que medidas dramáticas como essas teriam consequências. Os BCs têm observado os mercados em busca de sinais iniciais de um perigo tradicional -a inflação. Mas, em uma nova era de concorrência mundial, as empresas provavelmente não terão o poder de formação de preços que gerou inflação "puxada pela demanda" em décadas passadas; e tampouco os sindicatos devem ter condições de fazer as exigências salariais que contribuíram para a estagflação "puxada por custos".

Mas a retomada de John Keynes como referência não deveria nos levar a ignorar Milton Friedman: para onde irá todo esse dinheiro? Para um vislumbre do futuro, temos a Ásia, onde está emergindo um novo risco: bolhas de ativos.

A Ásia agora lidera a economia mundial, com elevações na produção industrial e no volume de comércio externo, o que em parte reflete o crescimento na Índia e na China. Essa virada econômica positiva vem acompanhada por altas nas ações e nos preços dos imóveis. O ouro está em alta, e os preços de outras commodities também devem subir. A combinação entre dinheiro fácil, mercados de commodities instáveis e safras fracas pode fazer de 2010 outro ano perigoso para os preços dos alimentos nos países pobres.
Bolhas de ativos podem ser a próxima área de fragilidade, à medida que o mundo se recupera, ameaçando uma vez mais destruir as fontes de renda de milhões de pessoas, aprisionando-as na pobreza.

Criticar retoricamente a exuberância irracional não funcionou bem contra as bolhas nos ativos ou contra a inflação nos preços dos produtos. Esperar que as bolhas estourem e depois limpar os estragos se tornou uma lição sobre o que não fazer. Mas um aperto abrupto demais nos juros, especialmente num momento em que as recuperações ainda são fracas, como nos EUA e na Europa, pode deflagrar nova crise.

Talvez a lição primordial a extrair da história é que os países cooperem em realizar avaliações que permitam distinguir entre suas situações, evitando "estratégias de saída" uniformes, e que continuem a manter a cautela quanto a protecionismo cambial ou comercial. Os debates sobre as novas estruturas regulatórias dos setores financeiros não devem impedir que os governos usem as ferramentas já disponíveis para combater esses riscos crescentes.

O G20 faria bem em colocar em sua agenda as bolhas nos preços dos ativos e novas estratégias para o crescimento. De outra forma, as soluções adotadas em 2008/9 podem deitar as sementes para novos problemas, em 2010 e no futuro.

*Presidente do Banco Mundial.