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Confissões de mafioso arrependido incriminam Berlusconi

A agenda política italiana, a judiciária e talvez o destino do primeiro ministro Silvio Berlusconi estarão em suspense nesta sexta-feira (4). A corte de apelação de Palermo, transferida por razões de segurança da Sicília para um tribunal-bunker em Turim, na outra extremidade do país, ouvirá o testemunho ,afioso arrependido Gaspare Spatuzza, dentro de um recurso do processo do senador Marcello Dell'Utri. Este, colaborador histórico de Berlusconi, foi condenado em 2004, em primeira instância, a nove anos de prisão por associação mafiosa.


Spatuzza, ex-capanga dos irmãos Graviano em Palermo, sustenta que Dell'Utri e Berlusconi foram interlocutores políticos da Cosa Nostra durante a campanha de atentados de 1993, em que ele foi um dos executores: o de 14 de maio em Roma (sem vítimas), o de 27 de maio em Florença (cinco mortos, 48 feridos), os de 27 de julho em Milão (cinco mortos) e Roma (alguns feridos).

Declaração é uma "bomba atômica"

Conforme o criminoso arrependido, os dois políticos queriam criar um clima de caos propício à chegada ao poder da Forza Italia, partido que estavam em vias de criar. Em troca disso, a Máfia gozaria de uma política mais clemente.

Depois do atentado frustrado de 31 de outubro contra o estádio olímpico de Roma, Gaspare Spatuzza testemunhou que seu chefe, Giuseppe Graviano, teria dito: "Tudo foi bem combinado com os políticos, conseguimos tudo que queríamos".

"Ele confirmou para mim o nome de Berlusconi", afirma Spatuzza na transcrição de um interrogatório que chegou aos jornais. "Depois ele me falou também de um conterrâneo da Sicília e indicou-me o nome de Dell'Utri". As confissões foram classificadas como "bomba atômica" pelo presidente da Assembleia Nacional, Gianfranco Fini.

Preso em 1997, condenado à prisão perpétua por vários assassinatos, entre eles o de um padre, Gaspare Spatuzza faz parte dos condenados "que mudaram de lado", esparando uma redução de sua pena. Para explicar seu arrependimento ele alega "motivos religiosos". Na prisão, passou em seis exames de teologia e em 2007 enviou uma carta ao papa desejando-lhe feliz aniversário.

"O mais distante" da Máfia?

Não é a primeira vez que Berlusconi e seu braço direito, que se conhecem desde o início dos anos 60, são acusados de ligações com a Máfia. Um primeiro inquérito, da procuradoria de Florença (Toscana), arquivada sem conclusão em 1998, não conseguiu provar estes contatos antes das eleições de 1994, que levaram ao primeiro governo de el Cavaliere (apelido de Berlusconi). Os detalhes fornecidos por Spatuzza reabriram as investigações.

Em um comunicado divulgado neste domingo (29), Berlusconi denunciou o que qualificou como "o ataque mais cnacreditável e ignobil" que já sofreu. "Se existe uma pessoa que por narureza, por sensibilidade, mentalidade, origem, cultura e ação política é muito distante da Máfia, sou eu", asseverou. "Se existe um governo que travou a luta contra a Máfia, um de seus objetivos mais claros e coerentes, é o meu", agregou o primeiro ministro.

"A pessoa mais distante da Máfia"? Aconselhado por Dell'Utri, Berlusconi empregou como cavalariço, entre 1973 e 1975, um mafioso chamado Vittorio Mangano, para que ele, segundo el cavaliere, protegesse sua família. Vittorio Mangano morreu de câncer em 2000, uma semana depois de ser condenado à prisão perpétua por duplo homicídio.

O rápido enriquecimento de Berlusconi também tem despertado indagações. Segundo o jornalista Marco Travaglio, autor de O cheiro do dinheiro, essa fortuna teria em parte uma origem mafiosa.

"Juro que os estrangulo"

Foi no segundo governo de Berlusconi que o severo regime de prisão para mafiosos conhecido como "41 bis" se tornou definitivo. O Ministério do Interior indicou que, depois de sua vitória eleitoral em abril de 2008, "foram presos oito mafiosos por dia", entre eles 15 dos 30 fugitivos mais procurados.

O retorno das ligações entre Máfia e política aos holofotes Serviu de pretexto para uma nova "tirada" de Berlusconi, no sábado, contra "aqueles que projetam uma imagem negativa da Itália".

"Se eu encontrar o autor de O polvo (uma série de TV que faz sucesso) e quem escreveu esses livros sobre a Máfia, juro que os estrangulo", disse o primeiro ministro. "Brincadeira", esclareceram seus assessores.

Fonte: Le Monde