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Pedro Dutra: novo projeto nacional não é coisa de dinossauro

A Escola Nacional de Formação do PCdoB recebeu hoje (15) o professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Pedro Dutra Fonseca. “Não é ultrapassado, nem coisa de dinossauro pensar um novo projeto nacional de desenvolvimento”, disse. E completou: “é bastante oportuno que o PCdoB esteja pensando sobre isso; hoje é o único grupo político brasileiro que defende de forma explícita esta questão que sempre foi tabu na esquerda”.

Falando para cerca de cem pessoas que acompanhavam a aula do núcleo de Economia do curso de nível 3, em Atibaia (SP), Pedro Dutra (foto) tratou do Segundo Plano Nacional de Desenvolvimento (2º PND) e o nacional-desenvolvimentismo iniciado nos anos 1930. “Esta foi a única teoria econômica que nasceu, de fato, na América Latina”, disse, lembrando que a partir daí o Brasil passou de uma economia meramente agrário-exportadora para um país industrializado.

Polêmica

No pensamento desenvolvimentista, há um núcleo de ideias que o caracteriza, marcado especialmente por três pontos: o Brasil necessitava de mudanças e esse processo teria de ser induzido pelo Estado, afinal “o mercado não faria isso espontaneamente”, justificou Dutra; o projeto de industrialização seria pré-requisito para que se rompesse com a subordinação aos interesses internacionais; e, por último, a visão nacionalista.

Sem defender em nenhum momento a ditadura, Pedro Dutra lembrou, no entanto, que “os militares eram nacionalistas” e, apesar de haver divisões dentro do próprio Exército, Ernesto Geisel implantou, a partir de 1974, o Segundo Plano Nacional de Desenvolvimento cujo objetivo era aumentar a capacidade energética e de produção de insumos básicos e de bens de capital, diferentemente do período do “milagre econômico” (1968-1973) quando o foco estava nos bens de consumo duráveis.

O assunto ainda hoje gera polêmica, tanto da esquerda quanto da direita. “Seu anúncio foi marcado por discussões porque em plena ditadura era impossível se concordar, em linhas gerais, com a proposta de Geisel; o plano era tido como fascistóide e megalomaníaco pela esquerda. A direita também criticou porque via nele um caminho para a estatização e começou a questionar a condução do poder pelos militares. A revista Visão e o jornal O Estado de S. Paulo começaram a onda de questionamentos”, explicou.

Foi nesse contexto que o próprio ministro da Fazenda, Mario Henrique Simonsen chegou a declarar: “não leio ficção”, quando foi questionado a respeito do plano. Pegando onda nessa preocupação, setores do empresariado começam, em 1978, a pedir a volta da democracia.

Análise da crise

Na opinião de Pedro Dutra, “o plano não era um devaneio” e partiu de uma análise do governo Geisel para o qual a crise do petróleo (iniciada em 1973) “seria longa e não temporária e exigiria uma saída que desse fim ao modelo agrário-exportador e fortalecesse o país. Para ele, havia sido um erro o Brasil ter optado, no passado, por abandonar o mercado de massas em detrimento do maior consumo de bens duráveis, especialmente a partir de Juscelino Kubitschek”.

Na época, o aumento das dívidas interna e externa era atribuído aos mega-investimentos feitos pelo 2º PND. Para Dutra, isso aconteceu especialmente “devido ao cenário mundial”, mas também a falhas de execução. Porém, o plano deve ser analisado “como um projeto pensado a partir das necessidades brasileiras levando em conta a questão nacional. A concepção era a de que o país precisava enfrentar o capital estrangeiro e criar espaços próprios, de maneira que não ficasse a reboque de outros países”.

Geisel, no entanto, deixava clara sua concepção de direita. “Ele costumava dizer que aquele caminho era ‘pragmatismo responsável’. Pragmatismo porque buscava, não com base em questões ideológicas, o alinhamento com países do terceiro mundo. Até então, a linha era ‘o que é bom para os Estados Unidos é bom para nós’; e ‘responsável’ porque não era comunista.”.

Possibilidade de transformação

A partir dos anos 1980, a maior preocupação do país passou a ser a inflação, em parte causada por problemas de execução do 2º PND. “O problema é que desde então o Brasil ficou preso a isso; tudo é feito tendo em vista o controle da inflação”, criticou o professor.

Para Pedro Dutra, é preciso romper com essa linha e “quebrar o conformismo, a noção de que ‘as coisas são como são’, isso tanto na direita quanto na própria esquerda, porque é uma visão que trava o desenvolvimento. O Brasil é o que é por questões históricas e, por isso mesmo, pode ser transformado”.

Segundo o professor, a tarefa da esquerda “é justamente resgatar o sentimento de que é possível mudar. E momentos de crise, como a que vivemos, abrem grandes possibilidades para isso”.

Dividiram a mesa com Pedro Dutra os professores da Escola Nacional Dyneas Aguiar, Meire Rose e Marcelo Fernandes, do núcleo de Economia Política e Desenvolvimento.O curso segue até o dia 20 de janeiro.

De Atibaia,
Priscila Lobregatte