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EUA fogem do tratado contra bombas de fragmentação

O tratado internacional contra as bombas de fragmentação obteve as duas ratificações necessárias para se converter em lei, mas ainda carece do apoio dos Estados Unidos, um dos maiores usuários destas armas que matam e mutilam civis muito depois do encerramento de um conflito.

Burkina Faso e Moldávia elevaram para 30 o número de nações que ratificaram a Convenção Contra as Bombas de Fragmentação, quantidade necessária para que o tratado entre em vigor.

Desta maneira, a partir de 1° de agosto deste ano ficará proibido o uso, a fabricação e o comércio de bombas de fragmentação e serão fixados prazos para a destruição das que estão armazenadas. Os Estados que utilizaram esse armamento no passado estarão obrigados a dar apoio às comunidades afetadas e ajudá-las a limpar as áreas contaminadas.

O secretário-geral da Organização das Nações Unidas, Ban Ki-moon, disse que a rapidez entre a adoção do tratado, dezembro de 2008, e sua ratificação, é prova “da repugnância mundial coletiva diante das consequências destas armas terríveis”.

O processo que levou ao tratado começou em fevereiro de 2007, quando 46 Estados começaram a redação do acordo. A convenção ficou pronta para ratificação em dezembro de 2008, depois de receber assinaturas de 107 Estados em maio de 2008, após negociações entre governos favoráveis à proibição, o Comitê Internacional da Cruz Vermelha e a ONU. Agora, 14 meses depois, atingiu a meta necessária para entrar em vigor.

“O breve prazo que levou demonstra que os governos possuem o forte desejo de que nunca mais sejam utilizadas estas terríveis armas”, disse Steve Goose, diretor da divisão de armamento da Human Rights Watch (HRW), e co-presidente da Coalizão Contra as Bombas de Fragmentação.

Estas armas explodem no ar e se espalham entre dezenas e centenas de submunições ou pequenas bombas sobre amplas extensões de terra. Como seu destino é difícil de controlar, podem causar grande mortandade na população civil.

Muitas das submunições não explodem ao atingir o solo, o que as converte em minas terrestres capazes de matar ou mutilar civis muito depois de terminado o conflito armado.

As crianças correm especial perigo, já que costumam ser atraídas pelo brilho metálico das bombas semienterradas e ignoram o risco que representam. “As bombas de fragmentação são instáveis e imprecisas e afetam a recuperação posterior aos conflitos, ao deixar inacessíveis os caminhos e a terra para os fazendeiros e trabalhadores das organizações de ajuda”, disse Ban.

Os Estados Unidos, que historicamente são um dos principais usuários dessas armas, negaram-se a assinar o tratado, junto com outras potências militares como China, Índia, Israel, Rússia e Paquistão.

O governo de George W. Bush se opôs ativamente à convenção internacional, com o argumento de que as bombas de fragmentação cumprem uma função militar importante. Os defensores do tratado esperam que o governo de Barack Obama modifique a atitude Washington.

Em fevereiro de 2009, menos de um mês depois da posse de Obama, o Congresso dos Estados Unidos apresentou o projeto de lei de Proteção da População Civil contra as Bombas de Fragmentação. Contudo, um ano depois, a iniciativa segue parada em uma comissão e não fica clara qual a posição de Obama a respeito, embora tenha promulgado, em março de 2009, a lei que proíbe a exportação de praticamente toda a produção do país dessas armas.

O emprego em grande escala mais recente desse armamento foi no conflito iniciado pela Geórgia contra a Rússia em agosto de 2008, considerado o mais recente desde os ataques de Israel contra o Líbano em 2006.

Nas últimas 72 horas do conflito de 2006, Israel teria disparado mais de 1.800 mísseis com bombas de fragmentação contendo 1,2 milhões de submunições. Dois meses depois do término do conflito, entre três e quatro pessoas morriam ou ficavam mutiladas, por dia, em consequência da explosão das bombas espalhadas pelo território libanês.

“Cada país signatário deve ratificar o tratado, e quem não assinou deve fazê-lo para evitar a perda desnecessária de mais vidas e mutilações de civis”, disse Goose, afirmando que mais da metade dos Estados do mundo concordaram em aprovar a ratificação.

“Devido a esta nova lei internacional, é especialmente importante que antigos usuários da arma (Estados Unidos, Rússia e Israel) reavaliem suas posições, que colocam o argumento questionável da necessidade militar acima do bem documentado dano humano que causam as bombas de fragmentação”, acrescentou. “Estas armas já estão estigmatizadas a ponto de nenhum país usá-las novamente, inclusive os que ainda não aderiram à Convenção”, ressaltou.

Apesar do apoio de 107 países ao tratado, a não adesão de Washington implica que a Convenção não chega a controlar metade das bombas de fragmentação no mundo. “Se os Estados Unidos a adotarem, serão proibidas mais da metade dessas armas utilizadas no mundo”, disse à IPS Lora Lumpe, representante no Congresso do Comitê de Amigos sobre a Legislação Nacional, da Campanha dos Estados Unidos para Proibir as Minas Terrestres, quando foi apresentada a iniciativa nesse sentido no Congresso, há um ano.

Além disso, com sua assinatura, Washington pode pressionar outros usuários em grande escala dessas armas a fazerem o mesmo, como Rússia e China. “O tratado contra as bombas de fragmentação é o tratado de desarmamento mais importante já redigido desde que a proibição contra as minas terrestres entrou em vigor há mais de dez anos”, assegurou Ed Kenny, da organização em favor dos deficientes Handicap International, em referência à convenção internacional de 1997 que serviu de modelo para o texto que entrará em vigor em agosto.

Entre os 30 países que ratificaram o tratado existem os que utilizaram essas bombas no passado e que as têm armazenadas. A Espanha é o único desse grupo que concluiu a destruição de todas as que tinha armazenadas. O próximo passo, após o tratado entrar em vigor, será uma reunião dos Estados que o ratificaram, no final deste ano, no Laos.

Com informações da agência IPS