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Ex-guerrilheiro, Mujica prega reconciliação com militares

 A imagem seria impensável em outros tempos: um ex-guerrilheiro do Movimento de Libertação Nacional (os Tupamaros), José Mujica, que se tornou presidente do Uruguai, apertando a mão de seus antigos captores das forças armadas. “Prazer em cumprimentá-lo”, repetia, com gesto firme, durante sua posse, em 1º de março, indo além do protocolo.

Em seu primeiro discurso, Mujica reafirmou a ideia de “unidade nacional” que havia expressado na campanha eleitoral e trocou o lema tupamaro dos anos 1960, “Haverá pátria para todos ou para ninguém”, por um mais inclusivo: “Haverá pátria para todos e com todos”.

Na última segunda-feira, em discurso em uma base aérea, em frente a 350 militares do alto comando, deixou claro que esse “todos” inclui as forças armadas. “Vocês não devem carregar nenhuma bagagem do passado diante de seu povo”, disse aos militares. Ele pediu também que se tenha um “imenso respeito pelas diferenças”.

“Notamos pessoas que – com razão ou sem ela – alegam que é preciso virar a página e, ao mesmo tempo, gente do nosso povo, tão válida como a outra, que grita por justiça, também com razão ou sem ela. Tanto uma quanto a outra são parte do nosso povo”, afirmou.

O presidente uruguaio propôs aos militares que trabalhem por “causas comuns”, como a redução da pobreza e a extinção da miséria. “Eu não vejo outro caminho, soldados, além de encontrar causas comuns como nação que nos identifiquem em construções comuns, participar de processos superadores, juntando passados diferentes aos quais não se impõem nem renúncia nem esquecimento”, enfatizou.

Obras sociais

Uma das ideias do presidente uruguaio a esse respeito é que as forças armadas colaborem com a construção de casas no lançamento do Plano de Impacto Habitacional. O projeto será colocado em prática nos próximos meses e consiste em facilitar crédito habitacional para a população carente.

Por outro lado, Mujica acolheu de uma das reivindicações constantes das forças armadas nos últimos anos: a necessidade de um orçamento maior e, em especial, a melhora do salário dos soldados, já que 61% deles estão abaixo da linha da pobreza.

"Soldados da minha pátria – e no termo incluo todos -, tenho de assumir diretamente diante de vocês que reconheço abertamente um atraso na economia, sobretudo se compararmos a situação ao restante dos trabalhadores do Estado”, disse.

Reação positiva

Os militares uruguaios elogiaram o discurso. O comandante do exército, Jorge Rosales, qualificou-o como “transcedental”; o comandante-chefe da marinha, Óscar Debali, chamou-o de “esperançoso” e “muito importante para a moral” das forças armadas. E o comandante da força aérea, José Bonilla, manifestou confiança de que o presidente melhorará as condições financeiras em que vivem os soldados e expressou sua disposição em participar da luta contra a miséria.

Os militares do alto comando – alguns dos quais permanecem desde a época da ditadura amparados por uma lei de anistia – não viram com bons olhos a ascensão de um tupamaro à presidência. No entanto, o discurso de segunda-feira os surpreendeu positivamente.

Mujica, que passou 13 anos na prisão (grande parte deste tempo dentro de um poço), foi elogiado também por representantes da oposição por “olhar para frente”. Para não gerar mal-estar na esquerda, o presidente teve de explicar que não estava colocando um “ponto final”, mas sim convocando todos a “trabalhar por causas comuns”.

Fonte: Opera Mundi

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