Dunga e seus jogadores têm de provar, como todos antes deles

O Dunga fica nervoso e aparece fazendo cara feia em comercial de cerveja, mas não adianta usar esses expedientes dignos de filme do Hulk para impressionar o torcedor brasileiro, por que a prova dos nove entre a Seleção e o torcedor, desde que o futebol caiu no gosto popular, não acontece por golpes de marketing, seja de aparelho de barbear, seja de telefone, seja de bebida gasosa que, consumida em excesso, causa inchaço na barriga.

Por Jeosafá Fernandes

Por mais brilhante que um escrete nacional tenha provado ser em campeonatos continentais e intercontinentais importantes ou nas eliminatórias, o torcedor brasileiro sempre considerou esses momentos, por mais alegrias que tenham proporcionado, gloriosos treinos. Só para lembrar, elaborado na época em que a Seleção Brasileira de Futebol era a pátria de chuteiras, a máxima “treino é treino, jogo é jogo”, jamais se descolou do espírito do exigente torcedor brasileiro.

Pode ser um mau costume, porém o brasileiro, habituado a ver Seleção em todas as edições da Copa, obriga os jogadores e seu treinador a demonstrarem a cada partida o quanto estão a altura das responsabilidades que assumiram ao vestir as “amarelinhas” mais famosas do planeta.

Podem dizer que isso é amor bandido, relação bipolar de amor e ódio, conversão de esperanças que não se realizam no plano da política para o plano verde dos gramados, demarcado por quatro linhas e um ponto trágico: a marca do pênalti… mas

Nesse caso, pouco importam filosofias, sociologias e psicologias complexas: o jogador e o técnico que vestem camisa da Seleção Brasileira têm que estar preparados para o marcador mais implacável dos piores pesadelos de todo desportista nacional: o torcedor brasileiro.

O zagueiro da Holanda pode dar sopa para o Branco despachá-la da Copa com um chute cavalar. O goleiro da Alemanha pode cochilar e dar mole para o Ronaldo, num totó de bico de chuteira, fazer a bola quicar no fundo das redes.

Mas o torcedor brasileiro não dá essa moleza a ninguém: saiu a lista dos convocados, a pressão e a temperatura sobre cada jogador e sobre o técnico é tal que, ou eles fazem por merecer, ou eles derretem.

Por isso, que Dunga não espere moleza nesta Copa, nana-nina-nana, porque a identidade do brasileiro com a Seleção é construída a cada partida. Vicente Feola sabia disso, Zagalo também, Telê Santana idem e Dunga tem que aprender essa lição, ao invés de ficar abrindo boletim de ocorrências contra humoristas, que fazem o caldo do espetáculo.

Ganhar dando pontapés ou jogando aquele futebol burocrático da escola Parreira, a que Dunga se filia via o sogro do próprio, o Ricardo Teixeira, tampouco vai lavar a alma do torcedor brasileiro, ávido mais por arte do que por exibições de macheza estilo: “Eu sou o Hulk” ou “eu sou amigo do delegado”.

Por que isso ocorre? Ocorre porque o torcedor brasileiro é antes de tudo um mal-acostumado.

Foi mal acostumado, nos limites das quatro linhas por mitos como Arthur Friedenrich, Leônidas da Silva, Pelé, Garrincha, Amarildo, Gerson, Clodoaldo, Ademir da Guia, Sócrates, Junior, Zico, Falcão e tantos outros que, em ordem alfabética, daria o volume de uma lista telefônica. E foi mal acostumado, fora das quatro linhas, por técnicos como Oswaldo Brandão, João Saldanha e, o mito dos mitos, Telê Santana.

O torcedor brasileiro, vendo essas feras jogarem dentro das quatro linhas ou dirigirem o espetáculo do banco ao lado delas, constituiu parâmetros de comparação e senso estético extremamente exigentes, e quem não suportar a pressão da incontornável comparação, que pule fora, ou derreta.

Para o brasileiro, acostumado às vitórias, à plasticidade e aos efeitos cênicos e coreográficos do futebol espetáculo por nós inventado – e patrimônio da nossa brasilidade moleca – não basta vencer: tem que vencer com arte, tem que levar alegria e beleza a todos, inclusive à torcida adversária, e tem que merecer, ao final, um “Bravo”, que nesse esporte se escreve em português, e com três letras: GOL.