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Tensão aumenta na Tailândia e militares enfrentam manifestantes

Tropas tailandesas dispararam contra os manifestantes antigoverno na sexta-feira, transformando partes do centro de Bancoc em um campo de batalha, enquanto os militares usavam tiros e gás lacrimogêneo para tentar isolar uma ampla área onde os manifestantes estão acampados há semanas.

Até o final da tarde, uma pessoa tinha morrido e 22 ficaram feridas nos choques do dia. Entre os feridos estava um cameraman de uma emissora de televisão francesa e um fotógrafo tailandês, ambos baleados.

Os manifestantes tomaram e vandalizaram vários veículos militares, incendiando pelo menos um caminhão e dando vivas enquanto uma coluna de soldados usando escudos observava. Nuvens de fumaça preta e marrom tomavam o ar, vindas dos veículos e pneus em chamas.

Disparos e explosões podiam ser ouvidos da embaixada americana situada perto dali, que fechou e ofereceu hospedagem para os funcionários que moram perto da área de protesto. Outras embaixadas também fecharam, assim como empresas e escolas.

Se não for contida, a violência pode crescer no tipo de conflito mais amplo que o governo tem buscado evitar. Os líderes do protesto disseram que se os militares tentarem dispersá-lo, simpatizantes em outras partes do país podem promover protestos de rua semelhantes ou tomar prédios do governo.

Independente de como o protesto paralisante de dois meses acabe, divisões profundas e tensões provavelmente persistirão em um país que está cada vez mais dividido entre seus pobres e sua elite urbana. Nos últimos quatro anos, inimizades políticas e pessoais endureceram, tornando a reconciliação ainda mais difícil.

Apesar de grande parte de Bancoc estar quieta, as estradas para a área de conflito estavam quase vazias, fechadas por soldados que construíam bloqueios de estrada com sacos de areia e arame farpado.

Tropas em equipamento de combate se agachavam atrás das barreiras, apontando seus rifles para os grupos de motociclistas que formavam uma força móvel de manifestantes. Outros soldados se agachavam ao longo de um elevado enquanto o trânsito se movia lentamente atrás deles. Soldados armados em motocicletas realizavam varreduras nas ruas em colunas.

Alguns espectadores vaiavam os soldados das calçadas e janelas dos prédios de escritórios.

Dentro da área de protesto barricada, os líderes do chamado movimento camisa vermelha se dirigiam aos milhares de manifestantes acampados lá por semanas, prometendo manter posição e resistir a qualquer incursão militar. Eles exigem a dissolução do Parlamento e novas eleições.

“Eles estão apertando um laço em nós, mas nós lutaremos até o fim, irmãos e irmãs”, disse um líder do protesto, Nattawut Saikua, aos manifestantes.

Outro líder, Kokeaw Pikulthong, fez o que pareceu ser uma ameaça velada ao governo. Em caso de uma repressão, ele disse em uma entrevista por telefone, os manifestantes poderiam ser forçados a invadir os shopping centers “para sobreviver”.

A área de protesto, que cobre cerca de 2,5 quilômetros quadrados ao redor de um importante cruzamento, está ficando imunda e infestada de moscas, com pilhas de lixo se acumulando desde que o governo cortou a coleta de lixo e a entrega de água para os reservatórios do acampamento na manhã de sexta-feira.

O vice-governador de Bancoc, Pornthep Techapaiboon, disse que os toaletes portáteis permaneceriam por razões sanitárias, mas que os funcionários que realizavam sua limpeza foram retirados após serem atacados pelos manifestantes.

Devido às novas barreiras militares, os manifestantes, que dormem em colchonetes na rua, podem deixar o lugar se quiserem, mas não são autorizados a retornar.

Nos perímetros, guardas despejavam gasolina sobre as barricadas de blocos de concreto, pneus, arame farpado e varas de bambu afiadas, ameaçando incendiá-las caso fossem atacadas. Eles espalharam óleo na rua diante de uma das barricadas e espalharam pastilhas redondas, para criar um fosso escorregadio em terra seca.

Os manifestantes fixaram explosivos caseiros nas pontas de varas, as espetando dentro de cones plásticos de trânsito e os mirando na direção dos soldados. Eles também disparavam contra os helicópteros militares que sobrevoavam o local.

Alguns manifestantes usavam capacetes de motocicleta e portavam armas caseiras, incluindo arcos e flechas, estilingues e varas de bambu afiadas. Alguns se preparavam para atirar sacos plásticos cheios de molho de peixe pungente e pimentas contra os soldados.

Dentro da área de protesto, um homem que se identificou como sendo John Redshirt, um disc-jóquei de uma emissora de rádio antigoverno, observava enquanto homens se sentavam no chão em uma oficina improvisada, construindo bestas com bambu e canos plásticos.

“Nós não temos medo dos militares”, ele disse em inglês. “Se eles vierem, nós temos o direito de contra-atacar. Nós não podemos deixá-los nos matar sem fazermos nada.”

Uma enfermeira de um posto de ajuda dentro do campo, Jenny Tan, 56 anos, falou do medo da violência iminente com lágrimas nos olhos.

“Nós também tememos pelos soldados”, ela disse. “Os soldados são nossos filhos. Nós somos mães, pais, irmãos e irmãs. Nós não queremos que nenhum deles morra. É muito, muito triste. Muito, muito triste para a Tailândia.”

O confronto teve início perto do ponto onde um general antigoverno foi baleado por um atirador na noite de quinta-feira.

O general, Khattiya Sawasdipol, 58 anos, se tornou um símbolo da falta de lei e impunidade que dividiu a Tailândia enquanto os protestos colocavam os pobres do país contra seu establishment.

O canal de televisão “France 24” disse que um de seus correspondentes, Nelson Rand, foi baleado na perna na tarde de sexta-feira enquanto noticiava a agitação. Foi noticiado que um fotógrafo tailandês também foi baleado. Os bloqueios dificultavam para as ambulâncias entrarem na zona de conflito.

“Eles estão apertando o laço contra nós, mas nós lutaremos até o fim, irmãos e irmãs”, disse um líder do protesto, Nattawut Saikua, à multidão, que respondeu com vivas entusiásticos e com o som de matracas de plástico vermelhas e brancas.

Khattiya foi baleado durante uma entrevista para um repórter do “New York Times” por volta das 19 horas, uma hora após os militares anunciarem o início do bloqueio e o corte do fornecimento de água e luz para a cidade de tendas de milhares de manifestantes.

O repórter, que estava a cerca de meio metro de distância do general, ouviu um estampido alto semelhante ao de fogos de artifício.

O general caiu no chão, com os olhos arregalados, e os manifestantes levaram seu corpo aparentemente sem vida para um hospital, gritando seu apelido: “Seh Daeng foi baleado! Seh Daeng foi baleado!”

Posteriormente foi noticiado que ele estava em suporte de vida. O general irritou tanto o governo, por se juntar ao chamado movimento camisa vermelha, quanto muitos líderes do protesto, por sua recusa em voltar atrás. O governo o acusou de um papel na violência que já resultou em mais de duas dúzias de mortes desde que os protestos tiveram início em meados de março. Na entrevista na quinta-feira, ele descreveu outros líderes dos protestos como “idiotas” covardes.

Todavia, o general assumiu o controle da segurança para os manifestantes, colocando seus próprios combatentes paramilitares de camisas pretas nas entradas, em barreiras improvisadas ao redor do acampamento, e contava com a lealdade de um pequeno mas intenso grupo de manifestantes.

Apesar do governo tê-lo chamado de principal obstáculo à paz e tê-lo suspenso sem pagamento, ele estava autorizado a se deslocar livremente, expondo a impotência das autoridades aqui.

“Eu nego!” ele gritou em inglês, com uma risada, quando perguntado em uma entrevista no domingo sobre as dezenas de atentados a bomba ocorridos em Bancoc e sobre os misteriosos assassinos de camisas pretas, que provocaram uma escalada da violência em 10 de abril e que resultaram na morte de 26 soldados e civis. “Ninguém nunca me viu.”

As últimas palavras do general antes de ser baleado foram: “Os militares não podem entrar aqui”.

Fonte: The New York Times
Tradução: George El Khouri Andolfato/UOL