Serra mentiu sobre reconstrução de cidade devastada por enchente
A cidade histórica de São Luiz do Paraitinga (SP) não retomou sua vida normal e não está reconstruída como afirmou o candidato do PSDB à Presidência da República, José Serra, em debate no dia 1º de outubro. Fotografias mostram que o cotidiano da cidade do Vale do Paraíba desmentem o que foi apresentado pelo tucano. O município assolado por uma enchente no começo do ano não retomou sua vida normal.
Publicado 16/10/2010 11:36

No último debate do primeiro turno, quando questionado por Marina Silva (PV) sobre seus planos para emergências, Serra respondeu:
“Tive a experiência como governador de enfrentar essas situações. Quero dizer inclusive que no caso da cidade de São Luiz do Paraitinga, que foi inteiramente tomada pelas águas, nós já entregamos a reconstrução. De tudo que tinha de mais importante já foi entregue. Contrariamente do que se faz na esfera federal, em que as coisas vão se arrastando”.
Serra afirmou, também, que criaria a “Defesa Civil Nacional” caso fosse eleito. Ele ignorou o fato de que já existe uma Secretaria Nacional de Defesa Civil, subordinada ao Ministério da Integração Nacional, exatamente com a função desejada pelo tucano, que é poder mobilizar com rapidez a ajuda a estados e municípios afetados por calamidade.
Para quem conhece São Luiz, mas acompanha a situação à distância, pode ter ficado satisfeito em saber que um local tão querido à população paulista está novamente em pé. Quem vive lá, no entanto, estranhou a declaração. "O que Serra está falando não corresponde à realidade", lamenta o morador Marcelo Toledo, coordenador do Movimento em Defesa dos Pequenos Agricultores. "(Ele) falou que o estado teve uma atuação, mas não vê o que está acontecendo, o sofrimento das pessoas", critica.
Há, sim, esforços de reconstrução, mas o ritmo é inferior ao desejado pela população luizense. Todos os trabalhos envolvem governos federal, estadual e municipal, que dividiram as atribuições. O casario histórico, que cabe ao Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico (Condephaat), subordinado à Secretaria de Cultura paulista, é o ponto que gera mais temor por parte dos moradores, que veem o verão se aproximar e, com ele, chuva e enchentes.
Os moradores contam que nenhum dos casarões históricos da Praça Oswaldo Cruz, a principal da cidade, teve autorização para reforma e restauração – o trabalho depende do Condephaat, que nega lentidão no trabalho. “O problema é que não precisa ter enchente do tamanho que teve em janeiro. A água está entrando muito fácil. Se o rio entrar um metro e meio ou dois na cidade, já pega toda a parte baixa. A cidade vai estar à mercê da natureza”, alerta Toledo.
A praça era o local em que se desenvolvia boa parte da vida social luizense e, sem ela, fica difícil retomar a normalidade. O cenário é parecido com o registrado pela reportagem dias depois da enchente: a maior parte do casario naquela área está destruída, ou seja, pouca gente mora no local. Muitas pessoas seguem em casa de parentes em São Luiz ou em outras cidades.
A movimentação mais forte se dá em torno da Igreja Matriz, que recebeu uma cobertura metálica para facilitar os trabalhos de reconstrução. Sem o fundamental patrimônio arquitetônico, fica difícil para a população reativar a economia local, que dependia fortemente do turismo. Vários restaurantes ainda não retomaram as atividades e muitas pousadas estão com nível baixo de ocupação – há algumas que sobrevivem basicamente da hospedagem de engenheiros contratados para a reconstrução.
A construção de moradias comuns também deixa dúvidas entre os moradores. Segundo a Secretaria de Habitação, foram construídas 150 casas e serão feitas mais cem em terreno a ser indicado pela prefeitura.
O problema é que parte das moradias não é doação: os moradores têm de pagar um financiamento de até R$ 30 mil. “Muitas pessoas querem voltar para as casas antigas porque acham que a enchente não prejudicou tanto. A pessoa não quer sair da casa dele para ficar vinte anos pagando aluguel, seguindo um monte de regras”, destaca Toledo.
Assistência
O discurso de que foi dada toda assistência necessária a São Luiz é, também, desmentido por ação movida contra o governo paulista. A Defensoria Pública detectou, após audiências com os moradores, que o pagamento de auxílio-moradia havia sido interrompido em maio sem qualquer explicação. O valor, de R$ 300 por família, deveria ser concedido até a mudança para nova moradia. O Tribunal de Justiça de São Paulo concedeu em setembro liminar à ação, definindo multa diária de R$ 15 mil ao governo estadual em caso de descumprimento da medida.
O defensor público Wagner Giron de la Torre espera, no mérito da ação, fazer com que o estado seja condenado a indenizar todas as vítimas da enchente. Ele lamenta a morosidade com que vem sendo conduzida a reconstrução de São Luiz. “Pela dimensão da tragédia, merecia uma atuação muito mais encorpada e muito mais célere por parte dos órgãos públicos. Deveria haver um mutirão emergencial de todos os níveis de governo”, sustenta.
Discursos e práticas
A prioridade dada – em discurso – por Serra à Defesa Civil não se refletiu na prática do tucano. São Paulo não realizou a etapa estadual da Conferência de Defesa Civil e Assistência Social, fundamental para a preparação da discussão para o evento nacional, ocorrido em março deste ano em Brasília.
À época, o argumento apresentado pelo governo estadual, comandado por Serra, era de que não haveria tempo hábil para a organização da etapa paulista. Mas a regra da gestão do PSDB no estado tem sido a de não dar grande importância às conferências setoriais, que ao longo dos últimos anos se transformaram em importantes fatores de definição de políticas públicas.
Fonte: Rede Brasil Atual