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Niko Schvarz: Operários e estudantes

Talvez alguém imagine ao ler o título que vou fazer referência ao lema "Operários e estudantes, unidos e avante!", forjada nas manifestações que foram realizadas nas ruas do país [Uruguai, nota do tradutor] em tantas jornadas memoráveis, como as que frutificaram em outubro de 1958 com a adoção de dezenas de leis de benefício operário e da Lei Orgânica da Universidade.

Na realidade, é a mesma concepção (embora não seja formulada nesses termos) que dá alento às jornadas de luta que estão sendo realizadas em toda a extensão da França, para enfrentar o plano retrógrado do governo Sarkozy.

Em primeiro lugar, está a lei que posterga o acesso à aposentadoria e prolonga os anos de trabalho, o que além disso provocará o aumento do desemprego, que já afeta de modo especial os jovens. Este é um dos argumentos que os estudantes esgrimem nas ruas, tanto os universitários como os escolares, que colocam cores juvenis e o espírito de 1968 às manifestações.

E isso apesar de que muitos diretores escolares terem enviado cartas aos pais dos alunos para que não permitissem seus filhos de sair às ruas nas manifestações ou participassem dos bloqueios às entradas nas escolas.

Mas também são somadas outras motivações para criar um clima de indignação geral contra o governo. A mais notável é sem dúvida a política repressiva contra os ciganos e sua expulsão em massa do país, somada ao escândalo milionário da L'Oreal, que afeta as finanças do partido situacionista, a UMP, e diretamente o ministro do Trabalho, que é o responsável por levar adiante o tema das aposentadorias.

Também se menciona o escudo fiscal estimulado pelo governo, mediante o qual os muito ricos recuperam grande parte das contribuições impositivas e, por outro lado, os controles policiais constantes.

As últimas jornadas de greve geral e mobilizações operárias e estudantis foram concentradas às vésperas da votação da "lei maldita" no Senado. Unido à apresentação de centenas de emendas por parte dos senadores dos partidos de esquerda, conseguiu-se atrasar a votação, inicialmente prevista para a quarta-feria passada. Finalmente, a lei foi votada na sexta-feira. Em meio à discussão, os sindicatos (que estão agindo em coordenação plena com todas as centrais operárias) convocaram duas novas jornadas de greve geral, para os dias 28 de outubro e 6 de novembro.

O presidente conseguiu que se aplicasse "o voto único" para acelerar a votação, e com esse fim apresentou a emenda que anuncia uma "reforma sistemática" do sistema de aposentadorias para depois das próximas eleições gerais. Após uma forte oposição, a lei foi aprovada por 177 votos contra 153. De imediato, os sindicatos declararam que a luta continuará.

Um analista resume assim a situação: "Após uma semana de greves que deixaram meio país quase sem combustível e enfrentamentos entre policiais e piqueteiros, o apoio à greve por parte da população da França não só não diminuiu como aumentou, ultrapassando os 70% dos cidadãos do país"

Eu lembrava neste dias que um grande jornalista francês, Paul Vaillant-Couturier, criou uma seção no diário L’Humanité, do qual era diretor, sob a rubrica "Le malheur d’être jeune" (A desgraça de ser jovem) que era nutrida diariamente com notas auscultando as aspirações e sonhos dos jovens, em contraste com a dura realidade.

Li nestes dias uma série de excelentes reportagens, feitas ao vivo, com estudantes que estavam nas manifestações. "Um clamor juvenil, solidário e expontâneo flutua nos céus de Paris. O riso e o canto. No coração da multidão que percorre o Boulevard se respira uma atmosfera de paz agitada, de irmandade instantânea, de uma geração carismática. A juventude danã, a classe operária exulta. A sonhada convergência entre trabalhadores e operários foi plasmada em um par de semanas".

Mais adiante, cita cantos engenhosos: "Sarkô, está fodido, a juventude está nas ruas" (A rima está em francês: Sarko, t’es foutu, la jeunesse est dans la rue). E depois, a grande preocupação sobre o futuro, diante do anúncio de que o plano de reforma das aposentadorias vai gerar mais um milhão de desempregados entre a juventude.

Vale destacar a continuidade da luta unida na França, do mesmo modo que, por motivos em essência análogos, se mobilizaram os trabalhadores e o povo na Grécia, na Irlanda e na Espanha, além de em países da Europa Oriental (Tchéquia, Polônia e Romênia, com a ocupação de prédios do governo), em vários países bálticos e se prepara uma grande mobilização em Portugal. Além das reivindicações econômicas e sociais, a luta contra as tendências xenófobas crescentes nos governos é outro denominador comun.

Fonte: La República (Uruguai)