EUA fracassam redondamente em Exame de Direitos Humanos na ONU
Os Estados Unidos saíram maltratados de sua primeira incursão pelo exame periódico universal do Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU), onde, no dia 5, passou por um escrutínio acurado por parte de muitos dos 47 Estados-membros do organismo e de países observadores.
Por Gustavo Capdevila, na agência IPS
Publicado 09/11/2010 19:11
Um especialista, o diretor da Rede de Direitos Humanos dos Estados Unidos (USHRN), Ajamu Baraka, considerou que, se a delegação de Washington "pretendia reclamar a liderança mundial dos direitos humanos, fracassou redondamente".
As perguntas dirigidas à delegação dos Estados Unidos giraram em torno de violações graves dos direitos humanos cometidas em territórios sob jurisdição desse país e sobre os planos de seu governo para erradicá-las. Algumas das preocupações expostas sobre a situação nos Estados Unidos foram a pena de morte, a prisão de Guantânamo na ilha de Cuba, a discriminação racial, a violência contra imigrantes, os abusos na luta contra o terrorismo, a ignorância de direitos econômicos, sociais e culturais nos campos da habitação, saúde, educação, e a demora na ratificação de tratados internacionais sobre a matéria.
A delegação de Washington, liderada pela subsecretária de Estado, Esther Brimmer, respondeu a grande parte das perguntas com explicações sobre as causas que impedem seu país de cumprir as normas internacionais. No caso da pena de morte, o assessor jurídico do departamento de Estado, Harold Koh, alegou que a legislação internacional de direitos humanos não proíbe, em geral, o emprego desse recurso extremo.
Um representante da Bélgica lamentou que a pena de morte ainda vigore nos Estados Unidos em nível federal e em pelo menos 35 Estados. O diretor do departamento legal da União Norte-Americana pelas Liberdades Civis (Aclu), Jamil Dakwar, disse que o governo de Barack Obama poderia, pelo menos, abolir esse castigo na jurisdição federal, que é de sua competência. Por sua vez, a chefe da missão do Uruguai, Laura Dupuy, recomendou a Washington retirar a reserva ao parágrafo do artigo sexto do Pacto Internacional de Direitos Humanos e Políticos, que proíbe impor a pena de morte a quem cometeu crimes quando era menor de 18 anos.
Laura Murphy, diretora da Aclu, disse à IPS que durante a sessão do Conselho numerosos países cobraram de Washington que considere, pelo menos, o estabelecimento de uma moratória à pena de morte, com vistas à sua abolição. A ativista, que acompanhou os debates do exame periódico universal (EPU) junto com representantes de outras organizações não governamentais norte-americanas, chamou a atenção para as solicitações de vários países ao governo dos Estados Unidos para que feche a prisão de Guantânamo, onde mantém detidos acusados de atos terroristas.
Essas demandas foram acompanhadas de pedidos para que sejam estabelecidas as responsabilidades dos funcionários norte-americanos de alto escalão que autorizaram a aplicação de torturas, disse Murphy. A Espanha foi um dos países que perguntou se Washington espera fechar Guantânamo em breve, "tal como declarou o presidente Obama", e também se interessou pela sorte das cerca de 50 pessoas que permanecem nessa prisão submetidas a um regime de detenção indefinida. Koh respondeu que Obama continua comprometido em fechar Guantânamo, mas acrescentou que esse assunto "se converteu em algo muito complexo", porque requer a intervenção do Congresso.
Murphy disse que nos Estados Unidos há graves problemas de direitos humanos. São aplicadas torturas tanto em Guantânamo como nas prisões dentro do próprio país, apesar de Obama ter repudiado a doutrina legal que as autorizava, assegurou. Diante das perguntas sobre o atraso na ratificação pelos Estados Unidos de tratados sobre direitos humanos, Koh expôs a teoria de que alguns países adotam e colocam em vigor esses instrumentos internacionais, para depois fazer apenas o possível para aplicá-los. Por outro lado, Washington começa a cumprir os princípios contidos nessas normas desde as esferas locais, depois nos Estados e finalmente, quando em nível nacional, chega o momento da adesão ao instrumento internacional.
O mesmo delegado defendeu o emprego de aviões não tripulados para operações de espionagem ao lançar ataques contra alvos terroristas, principalmente no Afeganistão. Afirmou que essas missões, que causam vítimas entre a população civil, apenas objetivam eliminar dirigentes terroristas. Acrescentou que esse tipo de operação se ajusta ao direito internacional vigente.
A delegação norte-americana enfrentou perguntas incômodas sobre o trato dispensado aos imigrantes. A representação do México recomendou que os Estados Unidos proíbam o uso de estereótipos ou perfis raciais na aplicação das leis de imigração. Um diplomata mexicano assegurou que são feitas detenções com base em critérios raciais que levaram inclusive, a casos em que cidadãos dos Estados Unidos foram confundidos com imigrantes ilegais e deportados para o México.
Murphy disse que as cobranças por ações específicas contra o uso de estereótipos e de racismo se estendem também ao campo da justiça penal. Os países cobraram de Washington que se ocupe da grave crise humanitária criada pelas "atrozes detenções praticadas na fronteira" contra os imigrantes, disse a diretora da Aclu.
Murphy declarou estar desiludida pelo nível da missão enviada por Washington e em particular pela ausência de legisladores. Porém, estimou que pode melhorar seu comportamento em direitos humanos e comprometeu o apoio da Aclu nessa tarefa. Agora há um clima político mais hostil em relação aos direitos humanos, mas o presidente Obama ainda conserva um grande poder para agir, acrescentou.
Em um resumo dos resultados do EPU dos Estados Unidos, Baraka disse que Washington fracassou no propósito de convencer o mundo de seu histórico positivo quanto aos direitos humanos. O que ouvimos em Genebra foi uma defesa eloquente da visão dos Estados Unidos como um país "excepcional", afirmou o diretor-executivo da USHRN. Essa visão faz crer que se trata de um Estado que goza de "status especial", que o exime de adaptar-se às normas e aos padrões de direitos humanos reconhecidos internacionalmente, afirmou.
Fonte: Envolverde