Sem categoria

PC do Uruguai: 90 anos de história em plena vitalidade

Em 2011 o PC do Uruguai comemora 90 anos de fundação, ocorrida na onda revolucionária mundial após a vitória revolucionária na velha Rússia, como também ocorreu no Brasil. De lá para cá, foram feitos 29 congressos – o último neste final de semana –, além de diversos de caráter extraordinário, expressão da vitalidade dos comunistas uruguaios, em uma trajetória sem solução de continuidade, a não ser a feroz perseguição da ditadura militar nos anos 70-80.

Por Walter Sorrentino*

PCU - Camilo Wuhl (PCU)

Mais uma vitória eleitoral do povo uruguaio e os consequentes desafios marcaram o debate deste Congresso. Pepe Mujica, o presidente eleito pela Frente Ampla o ano passado, dá sequência ao governo de Tabaré Vásquez que vencera em 2004. Com diferenças variadas entre si, o fato é que a experiência de governos progressistas sul-americanos tem no Uruguai um posto avançado e os comunistas fazem parte disso.

Leia também:

Hoje o partido tem um senador, dois deputados, três suplentes de deputados, 20 parlamentares municipais, dois prefeitos e encabeça um Ministério, o do Desenvolvimento Social. Dirige a cidade de Montevidéu, com Ana Olivera, integrando a Frente Ampla.

Esta frente teve em 2004 52% dos votos e elegeu Tabaré Vásquez presidente, com a maioria correspondente na Câmara e no Senado. Com a eleição de 2009, há condições para avançar. Para o PCU, a política econômica foi ambivalente no mandato de Tabaré, mantém-se a mesma no tocante ao pagamento de serviços da dívida, o custo da manutenção de reservas internacionais e não gravar a riqueza das classes dominantes. Mas Pepe Mujica tem mais diálogo político, é menos inacessível e tecnocrata que Tabaré. O novo presidente tem por “modelo” Lula e sua obra no Brasil.

O congresso se voltou aos desafios presentes. Centralmente, eles são reconhecidos em torno da contradição principal entre “um país produtivo com justiça social e aprofundamento democrático ou mais dependência”. A mudança fundamental requerida, para eles, é a da política econômica do governo, para o que se necessita aprofundar o bloco radical-político-social das mudanças, hegemonizado pelos trabalhadores. O governo teve políticas que contradizem esse programa. Trata-se, portanto, de um governo em disputa entre o programa popular e os interesses das classes dominantes. Por exemplo, a questão da dívida externa não está equacionada e a política externa do governo anterior foi também ambivalente: ao lado do Mercosul priorizou também o Tratado de Livre Comércio com os EUA. Essa batalha estratégica foi vencida – o TLC não passou, mas vingou o Tratado de Proteção de Investimentos com os EUA.

A plataforma imediata de atuação compreende a redistribuição de riqueza, o Estado como produtor, recursos para as mudanças (incluindo auditoria da dívida externa), ampliação de direitos para o povo.

Como no Brasil, eles adjudicam grande importância para as questões de partido. Um partido de quadro e de massas, que se quer extenso e forte, atuando na frente político-institucional, mas também no movimento social, que busca ter vida militante mais intensa, essa é a questão cardeal. O centro da preocupação é travar intensa batalha ideológica contra as tendências pragmáticas tendentes a rebaixar o papel estratégico do partido.

O PC uruguaio elaborou em 1958 a “teoria da revolução uruguaia”. Com notável consistência e coerência, desde então vem aprofundando a luta pelo aprofundamento democrático que permita abrir caminho ao socialismo. É um partido de princípios, com sólida formação estratégica e forte protagonismo político, combinado com mobilização social e de base militante. Seus efetivos crescem, são muito renovados, e o problema de partido para eles mereceu um dos congressos extraordinários citados.

Teve uma experiência pioneira visando unir a esquerda nos anos 60, constituindo a Frente de Izquierda de Liberación. Seguiu-se a Frente Ampla, em 1971, integrado pelos comunistas e uma extensa coalizão de partidos e movimentos. Em 1989 os comunistas alcançaram com a FA o marco maior de representação, com quatro senadores e 11 deputados.

Na coalizão, os comunistas têm sua própria plataforma, o Democracia Avanzada, que aumentou a votação em 2009. Hoje na FA se registra falta de vitalidade e iniciativa. Metade institucional do FA é constituída obrigatoriamente pelos movimentos e isso é algo também em permanente disputa ou questionamento pelas forças menos avançadas. Os comunistas são a maior força dirigente da central sindical unitária do país. Eles registram que atuar na coalizão eleitoral, subsumidos ao governo mesmo sob independência partidária, traz para os comunistas muitas pressões, não desconhecidas, na forma de luta por cargos no governo e pragmatismo ideológico. Os comunistas têm algo como 8% dos votos nas primárias do FA e 4% dos votos nacionais.

O FA é sem dúvida uma experiência que precisa ser mais estudada pela esquerda brasileira.
O 29º Congresso se dedicou à memória de José Luis Massera, eminente cientista matemático, membro da direção nacional do PCU até sua morte em anos recentes. Ele atuou ombro a ombro com Rodney Arismendi, maior líder do partido, que encabeçou a elaboração da teoria da revolução uruguaia, falecido precocemente em 1989. Inclino-me em homenagem da memória deles e do bravo Partido Comunista do Uruguai. Igualmente, do povo heroico que soube conquistar sua independência sob a liderança radical de Artigas, em meio a duas potências da época, Brasil e Argentina, em 1825.

*secretário de Organização do PCdoB, representou o partido durante o 29º Congresso do PCU