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Chico Lopes: dificuldade não desanima na luta por avanço social

As dificuldades que antevê para os trabalhos legislativos que se iniciam em 1o de fevereiro não tiram o bom-humor e nem a disposição de luta do deputado Chico Lopes (PCdoB-CE), que cumpre o segundo mandato na Câmara Federal. Ele, que destaca o fato de ser um político da época da ditadura militar, se queixa principalmente da pouca motivação da população com a política, da tentativa de desmoralização do parlamento e da inconsistência ideológica dos partidos políticos.

E destaca as dificuldades que o governo Dilma terá para aprovar as matérias que representam avanço das conquistas sociais. Ele diz que a base governista ampla não representa essa garantia, mas confia que a presidente vai se “impor” e anuncia o apoio do PCdoB na aprovação das propostas de interesse da coletividade e do País.

Vermelho: Qual a sua expectativa para esses trabalhos que se iniciam em 1o de fevereiro considerando a renovação do parlamento de quase 50% e o novo governo da presidente Dilma Rousseff?
Chico Lopes: Essa renovação, Deus queira, que seja de ideias, comportamentos, ações, porque em política a idade é o que menos importa. Evidente que eu, que sou de uma geração da ditadura e pós ditadura, percebe que tem momentos que a política influi na arte, música, comportamento, e agora nós temos um rebaixamento, desde o movimento sindical, que alguns dizem que perdeu a razão da contradição trabalho X capital. São momentos da história que a gente não pode se pegar só a isso. O PMDB, que era maioria na Casa, perdeu para o PT. Eu me pergunto se essa mudança vai ter influência no comportamento do Legislativo. Os partidos de direita diminuíram bastante, mas ele tem anunciado, por meio de suas lideranças, principalmente do DEM, que farão oposição política e ideológica. Como? A aliança do PMDB-PT, eu considero de centro-esquerda, com viés mais para centro. Os únicos partidos ideológicos que tem nessa Casa chama-se DEM e PCdoB. Esses tem posicionamento político e ideológico. Infelizmente os dois estão na mesma estrutura de tamanho e vão influenciar pouco nessa gestão. Dentro da política nessa Casa eu vejo muitas dificuldades para o governo da Dilma. O PMDB se especializou em ter postos importantes. Não tem mal nenhum porque ele apoia o governo, mas o PT, que já está a oito anos no poder e, com a reeleição, vai querer cada vez mais. Se eles não se entendem nem entre si, não é com os outros partidos que terão essa preocupação. Portanto, nós vamos ter período de dificuldades no Poder Legislativo.

Vermelho: A partir dessa avaliação da composição da Casa, qual a sua opinião sobre como isso se reflete, na prática, no trabalho do legislativo?
CL: É muito fácil saber. Nós dos partidos pequenos, especialmente do PCdoB, que tem fidelidade reconhecida pelo governo, nós somos base do governo, mas vamos ter que ter cuidado com o que vem do Palácio do Planalto. Se for (matérias) de interesse da coletividade e do País, não vamos ter problemas em aprovar, mas se o que vem não é do interesse do País e sim de grupos que atuam muito fortemente no governo, nós vamos avaliar e a orientação do Partido dar-se-á ai.

Vermelho:
Você acredita então que, apesar da maioria da base do governo na Câmara, vai ser difícil aprovar as matérias quer representam avanço nas conquistas sociais?
CL: Eu diria que sim, mas faço uma ressalva. O Presidente Lula tinha um comportamento de “deixar as coisas fluírem” e fluía tanto que as vezes ele perdia o controle. Pela formação de Dilma e pelo que estamos acompanhando, ela parece ser de outra cepa política de comportamento. Ela não vai aturar indecisão dos partidos da base do governo para aprovar ou não matérias de interesse. Pode ser que eu esteja enganado, mas estou achando difícil, ela pode não colocar isso no primeiro momento, mas ela não vai ter o mesmo comportamento do “laisser fair”.

Vermelho: Isso significa que os compromissos que ela assumiu na campanha de avançar nas conquistas sociais, ela vai se empenhar para fazer aprovar as matérias?
CL: Ela não vai se empenhar, ela vai se impor, quem tem caneta e cargo, só pena com um Congresso subalterno como esse se quiser; não é o Congresso que é subalterno, segmentos da política de subalternidade. E eu espero que ela faça isso.

Vermelho: E o PCdoB vota com ela nisso?
CL: Lógico. A gente só vota contra um projeto de Dilma se for contra o povo, como o do salário mínimo, porque a gente sabe que é só baixar os juros, diminuir a dívida externa, e nós teremos dinheiro para pagar o salário mínimo.

Vermelho: Além do salário mínimo, existem outras matérias polêmicas, que são bandeiras do Partido, e estão paradas na Casa, como a redução da jornada de trabalho, a PEC do Trabalho escravo etc, qual a expectativa com relação a aprovação dessas matérias?
CL: Eu acredito que os principais problemas desse país são reforma política e tributária. Quando falamos em reforma política, qual reforma política interessa para a democracia. Voto distrital? Cláusula de barreira? Pensamos que não. Podemos pensar em voto misto – distrital e universal, mas em qualquer abordagem, não podemos deixar de falar em financiamento público de campanha, porque se isso não acontecer, em 20 anos não teremos mais nenhum representante popular nesta Casa, porque essas eleições foram as mais caras de todos os tempos, mas todas as últimas eleições são sempre as mais caras. A gente tem que tomar uma iniciativa, porque a Justiça Eleitoral atrapalha mais do que ajuda, veja o exemplo da Lei da Ficha Limpa, que foi um avanço, mas a Justiça permitiu a volta para essa Casa de pessoas que deviam estar em outro lugar. A reforma política deve vir para melhorar a imagem do Congresso Nacional. Porque tem viés ideológico essa política de querer desmoralizar o Congresso para os desonestos transitarem com liberdade e as pessoas não acreditarem nas decisões. Para o bem ou para o mal, é aqui que se decide o destino teu, meu, nosso e da soberania nacional.

Vermelho:
Existe áreas em que você atua com mais desenvoltura e interesse, como a defesa do consumidor, a educação … Você vai continuar atuando nessas áreas?
CL: Estou pensando em dar uma reformulada para avançar mais. Os primeiros quatros anos foram para aprender e vejo que a disputa é muito mais acirrada do que se pensa. As vezes o bom-senso não funciona. Tem o princípio da maioria. Acho que um reforma no regimento interno da Casa é importante para tirar a ditadura dos líderes. É um Colégio (de Líderes), de pessoas importante, que as vezes assumem bandeiras que não correspondem a vontade da base.

Vermelho: E quais são essas novas áreas em que pretende atuar?
CL: Esse ano, o Estatuto das Cidades completa 10 anos. E aqui eu quero fazer uma homenagem muito grande ao senador Inácio Arruda (PCdoB-CE), que quando foi deputado, dinamizou esse código e conseguiu sua aprovação. Eu tenho vontade de fazer uma avaliação do Estatuto, se as cidades melhoraram, porque essa questão do Rio de Janeiro pode ser no Ceará. É que os códigos, os planos diretores, as obras não contemplam a realidade. Não temos forma própria para mudar natureza. Se fazemos uma casa no rio, não podemos esperar outra coisa do que vem. O rio tem vários caminhos, normalmente ele só usa um, mas se precisar ele usa todos os caminhos. Quero fazer uma avaliação com profundidade e quero participar, até pelo meu perfil de municipalista, a preocupação com a especulação imobiliária, que tem avançado muito, e o Programa Minha Casa, Minha Vida, que vai precisar de terreno.

Vermelho: E qual a sua sugestão para tratar da reforma urbana?
CL: Uma das estupidez da época foi fechar o BNH (Banco Nacional de Habitação). A Dilma devia criar outro banco de desenvolvimento. A Caixa presta serviço, mas a busca do terreno é feita pelas imobiliárias, a briga é de foice.

Vermelho: E quais as outras áreas que despertam o seu interesse?
CL: Pois é, tem o plano decenal da educação, que fala sobre valorização do professor, mas não diz como será, fala em plano de cargos e salários, como se viesse resolver os problemas. O problema é de salário. Não adianta estar na penúltima referência e ganhar dois mil reais. Cadê a lei do piso? Ele não se limita a ser base, quer ser teto. Estou preocupado e quero participar desse debate. Se o plano não levar em consideração salário, não se vai resolver problemas da educação. Porque todo mundo quer ser auditor fiscal?

Vermelho: Porque ganha bem.
CL: Eu quero pegar também a parte positiva do plano, que é a questão do financiamento da educação.

Vermelho: Falando sobre financiamento, o governo acena com a proposta de corte do orçamento, como você avalia essa proposta?
CL: Eu acredito que na primeira reunião de bancada (do PCdoB) não vai se discutir tudo, mas o Partido tem opinião de que cortar orçamento não vai resolver. Nós achamos que o governo tem que atuar na política macroeconômica, de baixar juros, mudar o câmbio flutuante, ao invés de cortar na educação, na saúde, logo esse ano que queremos aprovar a Emenda 29( que garante mais recursos para saúde). No governo do Lula, nós aprovamos política de isenção fiscal para a indústria automobilística – a cidade está cheia de carro, que nem tem mais onde colocar.

Vermelho: Com relação ao apoio do Partido ao candidato Marco Maia (PT-SP), você acredita que evitando disputas melhora o andamento dos trabalhos legislativos?
CL: Não é questão de melhorar ou piorar. O PCdoB se rege por ciência política. Uma candidatura do Aldo, preparado política e intelectualmente, respeitado com uma das maiores lideranças dessa casa, representaria um avanço, porque o parlamento leva pancada de todo jeito – justas e injustas – e não responde. A obrigação nossa é defender parlamento como um poder, mas há um medo muito grande do poder se indispor com a grande imprensa. Nesse sentido, Aldo, por ser jornalista e comprometido com as liberdades democráticas, nos daria mais segurança, mas isso não aconteceu porque as lideranças dos partidos fecharam com Marco Maia. Nós somos da base do governo, aliado do PT há mais de 30 anos e uma das propostas de Marco Maia é defender o poder. Eu acho que foi bom para não ter briga tão desgastante e vamos apoiá-lo e ajudá-lo no sentido de fazer uma boa administração para melhorar a imagem do Poder.

Vermelho: A que você atribui essa desconfiança e até deboche da população com relação ao parlamento? Essa imagem negativa do parlamento é real ou criada pela mídia?
CL: Ela é real no sentido de que, dos 513, a maioria é de bem, independente de ser de direita, esquerda ou centro, tem um comportamento na defesa da política e do poder, mas existe uma minoria, que faz lobby, “isso e aquilo” e a imprensa noticia e generaliza. Já que não querem noticiar o comportamento dos de bem, tudo bem, mas os "danadinhos", que chegam aqui por causa de uma montanha de dinheiro e se metem em confusão, digam, porque não interessa um poder legislativo desmoralizado, não interessa nem a direita, só os golpistas, que continuam existindo, porque ele (o parlamento) é quem decidi o destino da nação, para o bem ou para o mal, e faz isso muito mais para o bem.

De Brasília
Márcia Xavier