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Lula, feministas e Casa do Brasil marcaram terça-feira do FSM

Um dos participantes mais esperados no Fórum Social Mundial 2011 no Senegal foi o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Seu discurso foi contundente e bastante avançado. Entretanto, nem só de Lula vive o Fórum. A terça-feira (9) foi marcada também por atividade das fundações Maurício Grabois e Perseu Abramo, pelo Fórum das Alternativas, por debate promovido pela Federação Democrática Internacional das Mulheres (Fedim), por ato de solidariedade ao Egito e pela movimentação na Casa do Brasil.

- Renan Alencar
Todos os periódicos locais estampavam dois dias antes a presença do ex-presidente do Brasil durante o evento. Lula foi recebido com bastante alegria e afeto por onde passava. Já no aeroporto havia uma recepção calorosa de vários manifestantes. Mas, além do debate do qual participou Lula, o Fórum teve uma terça-feira repleta de atividades, como era previsto.

Movimento feminista

Na manhã desta terça-feira (9), a Federação Democrática Internacional das Mulheres (Fedim) realizou ato de Solidariedade a Mulheres em zonas de conflitos, com destaque a Palestina a África. Estavam presentes mulheres a Europa, do Brasil, da Palestina e de diversos países africanos. As denúncias de violações mais fortes foram as apresentadas pelas mulheres africanas, especialmente as que vivem nas fronteiras onde há guerras civis, das quais as mulheres são as maiores vítimas pela recorrência de estupros e o assassinato sistemático de mulheres, denominado feminicídio. Depoimentos emocionantes foram dados por pessoas que tiveram suas vidas destruídas por situações de conflito armado, que expõem especialmente as mulheres.

Entre as dirigentes da Fedim presentes ao Fórum, está a brasileira Liège Rocha (pela União Brasileira de Mulheres), que é a representante da Fedim no Conselho Internacional do Fórum (CI-FSM). Além de Liège, participam das atividades em Senegal Mame Sach e Maiada Abassi. As atividades estão acontecendo na tenda da Federação, montada na “Ville de Femmes”.

No período da tarde, o movimento feminista organizou um debate sobre a participação das mulheres na Economia Solidária, em que foi constatado que, como as mulheres são excluídas do mercado de trabalho formal, acabam sendo maioria entre os envolvidos nesta atividade.

Chegou-se à conclusão da necessidade da organização das mulheres para criar instrumentos de capacitação que as tornem capazes de gerir todo o processo, desde a produção até a distribuição de mercadorias, evitando que a exploração sexista do trabalho seja transferida à economia solidária. Participaram dessa mesa um representante da Organização Internacional do Trabalho (OIT), assim como de centrais sindicais de diferentes países.

Solidariedade ao Egito

Durante os dias do fórum, a revolução no mundo árabe tem tido grande impacto no tom e também no resultado das atividades. São imensos cartazes, passeatas dentro da universidade, declarações e abaixo-assinados organizados por várias entidades. Haverá uma manifestação em Dacar, em apoio ao povo egípcio e pela saída do tirano Hosni Moubarak.

Maison Du Brésil

Outro lugar bastante badalado durante o Fórum é a Casa do Brasil. Está localizada bem à frente da biblioteca da universidade, onde está ocorrendo a maioria dos eventos do FSM. Na tenda é possível encontrar espaços com materiais de várias organizações brasileiras, ponto de encontro dos participantes do Fórum e de grande circulação de diversos estudantes. A tenda também está equipada com uma sala para exibição de filmes e documentários, além de salas de reuniões.

A Canarinho segue sendo a mais conhecida, mas…

O FSM é um evento global, que reúne e discute as mais diversas temáticas, porém não deixa de estar carregado de características e influências da região onde se realiza cada edição. Este ano não poderia ser diferente.

Aqui nos encontramos com parte significativa do nosso DNA. Ao sair às ruas identificados, com objetos ou vestimentas relacionadas ao Brasil, sempre somos saudados com um animado “Brasil” e um sorriso natural e espontâneo. A Seleção Canarinho segue sendo a mais lembrada. São citados jogadores de diversas gerações, de Pelé a Neymar, passando por Ronaldo, Ronaldinho, Rivaldo, Kaka, Robinho e cia. Mas existe um brasileiro que, apesar de nunca ter jogado com a amarelinha, por diversas vezes é lembrado por nossos amigos africanos, trata-se do ex-presidente Lula. Ele é avaliado como um bom presidente e um amigo da África. Alguns já mencionam até a atual presidente Dilma Rousseff.

Foto: Renan Alencar
Lula: “Os que apostavam no fim da história, assistem a irresistível vitória da história que acreditavam estar morta”
A fala de Lula no Fórum

O ex-presidente Lula participou do Fórum e foi muito bem recebido pelos africanos. Primeiro Lula esteve na ilha de Goré, local de onde partiram vários negros para o continente americano, onde seriam utilizados como força de trabalho escravo. Já em Dacar, participou de uma atividade que contou com a presença do Presidente senegalês, Abdoulaye Wade, e do intelectual progressista egípcio Samir Amim, um dos entusiastas do processo do Fórum Social Mundial.

Durante o evento, Lula falou com o compromisso de quem não exerce mais um mandato presidencial, regrado pela habilidade que lhe é peculiar. Elogiou o momento que vive o continente africano, de consolidação de suas democracias, e fez menção aos protestos que estão ocorrendo no mundo árabe. “O caminho para a consolidação das democracias africanas será encontrado e decidido pelos povos africanos, sem ingerência estrangeira. Vemos uma demonstração disso com o que está ocorrendo no Egito e na Tunísia”. Disse também que a crise econômica vivida nos dias de hoje é resultado de seguidas irresponsabilidades dos governantes dos países mais desenvolvidos, que acreditavam que o mercado devia se auto- regular. “Os que apostavam no fim da história, assistem a irresistível vitória da história que acreditavam estar morta”.

Deu ênfase ao papel do continente africano na geopolítica atual, e lembrou que, na posição de presidente da República, visitou a 29 países africanos e que no mesmo período foram abertas 19 embaixadas brasileiras na África. Disse que nenhuma saída à crise pode ser tomada sem o consentimento dos países pobres e em desenvolvimento, sobretudo a África e seus mais de 800 milhões de habitantes. Finalizou dizendo que é altamente injusto o tratamento das potências imperialistas, da União Européia e dos Estados Unidos, aos imigrantes que durante toda a história ajudaram a construir estes países. No dia seguinte todos os jornais traziam como matéria de capa a manchete da participação do presidente Lula no Fórum.

O Senegal

Não é só o ex-presidente Lula que tem coisas boas a dizer a respeito da África. Impressiona a quantidade de obras existentes no Senegal, tanto de infra-estrutura como de habitação. É impossível percorrer a cidade e passar mais de cinco minutos sem ver um canteiro de obras. O evento está ocorrendo na maior universidade do país, a Ucad. É uma Universidade pública e gratuita, e tem mais de 50 mil estudantes, em sedes localizadas em vários pontos do país, a maioria na capital, Dacar. A base da comida senegalesa é bem parecida com a brasileira. Come-se arroz, feijão e salada em quase todas as refeições. O peixe é bem presente na dieta do país. A diferença é o tom bastante condimentado dos pratos. A moeda local é o Franco CFA ou somente Francos. É uma unidade monetária regional, utilizada por 14 países da região oeste e do centro da África, quase todas são ex-colônias francesas. A língua mais falada é o Wolof, idioma originário do Senegal. No entanto, a maioria da população também fala o francês.

O fórum segue nesta quarta-feira (9) com o início das assembleias temáticas de convergência. O destaque é a Assembleia dos Movimentos Sociais, que ocorrerá na quinta (10) à tarde. As assembleias são momentos de construção de agendas e lutas conjuntas por parte das organizações que participam do Fórum.

De Dacar, Renan Alencar
Colaboraram Lúcia Stumpf, de Dacar e Luana Bonone, de São Paulo