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Tammam Daaboul: pela Síria, contra a arbitrariedade

Querendo nada mais do que cumprir meu dever de imparcialidade do jornalismo prestado pelo Portal Arabesq, estive presente nesta sexta-feira (29) na avenida Paulista para cobrir a manifestação convocada contra o governo sírio organizada pela frente palestina e outras entidades islâmicas.

Por Tammam Daaboul*

Durante o meu trabalho fui cercado e abordado por três diferentes indivíduos separadamente que passaram a me intimidar com linguagem ameaçadora perguntando informações sobre mim, querendo me impedir de continuar a cobertura e até me ameaçando de sofrer “graves
consequências” caso “algum dos sírios presentes na manifestação sofra alguma consequência pelas minhas gravações”, segundo as palavras do próprio ameaçador, um
sujeito que sequer árabe ou descendente parecia ser.

Não bastando isso, um dos oradores, que não me conhece, fez referências a mim publicamente no microfone me difamando e me acusando de ser “agente infiltrado”.

Lamento que em uma manifestação que supostamente defende a democracia, a liberdade e os direitos do povo sírio haja indivíduos que exerçam exatamente aquilo que os manifestantes legítimos mais têm sofrido em ameaças, ataques e tentativas de difamação. Nenhum dos tais ameaçadores me conhecia ou conhece a minha história ou o meu trabalho e não abordaram ou incomodaram qualquer outro jornalista ou portador de câmera ou celular a não ser a mim, o que deixa claro haver comandantes e difamadores por de traz de tal comportamento.

Não sou governista ou partidário do Baath, nem pertenço ou estou a serviço de partidos ou países externos e tenho uma história familiar repleta de lutas pela liberdade e contra a corrupção, principalmente na Síria, em momentos muito mais difíceis do que os
atuais. Eu, um dos poucos sírios presentes na manifestação, tenho posicionamentos públicos registrados em artigos, palestras e meios de comunicação de grande publico como recentes entrevistas à Globo News e a Reuters onde deixo claro meu apoio às reformas e aos anseios da sociedade no meu país.

Apesar de ter toda a minha família presente em Damasco e correndo o risco de sofrer graves consequências por cada uma das minhas palavras, em momento nenhum temi a exposição da minha imagem ou calei a minha genuína luta por democracia e liberdade e, apesar disso, fui ameaçado e difamado publicamente por indivíduos supostamente “democráticos” que nem sírios eram e temem uma simples câmera em uma manifestação pública a dezenas de milhares de quilômetros da Síria. Isso só aumenta a minha admiração pelos verdadeiros heróis que gritam por liberdade com peitos nus na ruas da Síria sob chuva de balas e na mira de franco atiradores. Esses heróis, apesar de terem vivido décadas sob ditadura, podem dar uma lição de democracia a alguns membros e organizadores dessa manifestação no Brasil.

O episodio de hoje só aumentou as minhas dúvidas sobre a legitimidade desse movimento que parece ter muito pouco consolidado o conceito de democracia e liberdade que afirma defender, e lamento que tal comportamento atrapalhe a causa democrática e de pouco sirva a
luta da sociedade síria já que reforça as alegações governamentais de haver grupos políticos e religiosos extremistas externos capitalizando a legitima revolução síria para outros fins. Em conclusão, a esse movimento “democrático” só o governo sírio agradece.

Me recusei a fazer um boletim de ocorrência evitando a negativa repercussão que faria à comunidade árabe e islâmica a qual pertenço.

Para quem quiser saber a realidade de meus pensamentos e posições vejam a minha entrevista concedida ao programa “Sem Fronteiras” da GloboNews ainda no início das manifestações e não depois da quase definição da situação e da fragilização do governo quando covardes passam a fazer papel de herói.

Profundamente indignado, mas firme na luta por uma Síria livre, moderna e democrática pelas mãos dos próprios sírios.

*Tammam Daaboul é editor do Portal Arabesq.