Sem categoria

Israel só conhece o idioma da força, diz palestino libertado

Depois de 26 anos preso, o geógrafo Tawfic Abdallah, casado com a brasileira Lamia Maruf, foi libertado nesta terça-feira (18) junto com outros 446 presos palestinos. Em Ramallah, ele foi aplaudido pela multidão diante do presidente Mahmoud Abbas e abraçou amigos e parentes.

“Estou muito feliz. A gente sempre tem esperança”, disse a prima, Jelile Abdallah. Tawfic foi condenado à prisão perpétua por participar do sequestro e assassinato do soldado David Manós, em 1984. Livre, ele ainda não sabe se poderá viver no Brasil com a mulher e a filha, mas tem uma certeza: continua não acreditando na negociação com Israel.

O Estado de S.Paulo: Como foram as primeiras horas de liberdade após 26 anos de prisão?
Tawfic Abdallah: Estou contente, mas muito triste também, porque deixo meus amigos em prisões israelenses.

O Estado de S.Paulo:
E o que o senhor pretende fazer agora?
Tawfic Abdallah: Quero, talvez, ir ao Brasil. Não tenho certeza, mas minha mulher… o governo israelense a deportou há 14 anos, quando ela estava em uma prisão israelense. Quero ir, depois de um mês ou umas duas semanas, para a Jordânia. Depois disso, para o Brasil. Ou talvez Lamia venha para a Jordânia.

O Estado de S.Paulo: Sua filha Patricia virá a Deir Balut para vê-lo?

Tawfic Abdallah: Sim, ela chegou hoje pela Jordânia.

O Estado de S.Paulo: Alguns analistas defendem que o acordo para trocar Gilad Shalit por 1.027 prisioneiros palestinos poderia ser um sinal de que uma negociação futura é possível. O sr. Concorda?

Tawfic Abdallah: Não. Há 20 anos, havia negociação entre o governo israelense e a Organização para a Liberação da Palestina (OLP). O governo israelense não libertou nenhum prisioneiro palestino que matou israelenses. Mas, se matou palestinos, o governo liberta. Agora, sou membro do movimento Fatah, mas eu lutei contra os soldados israelenses.

Fui libertado numa negociação de troca, que o governo não queria, porque lutei contra a ocupação. O Hamas sequestrou o soldado Shalit no seu tanque e, depois disso, houve muitas negociações entre os israelenses e o Hamas para trocá-lo por prisioneiros. Israel só conhece um idioma: o da força.

O Estado de S.Paulo: Qual sua opinião sobre a iniciativa do presidente palestino, Mahmoud Abbas, de ir à ONU e pedir o reconhecimento de um Estado?

Tawfic Abdallah: Com negociação não acho que teremos um Estado palestino. É impossível. Abu Mazen (Mahmoud Abbas) acredita somente na negociação. Eles dizem que voltarão a negociar, mas o governo israelense se recusa a dar qualquer coisa a Abu Mazen. Porque o Hamas capturou um soldado deles, eles libertaram 1.027 prisioneiros de prisões israelenses. O que podemos entender disso?

O Estado de S.Paulo: Analistas palestinos afirmam que o Fatah trocou a estratégia de luta armada por resistência pacífica. O sr. Concorda?
Tawfic Abdallah: Os governos israelenses nunca acreditaram na paz negociada. Todos, de (Yitzhak) Rabin a (Binyamin) Netanyahu. Até agora, temos assentamentos (judaicos), 400 mil colonos judeus nos territórios palestinos, desde (os Pactos de) Oslo até agora. O que podemos esperar das negociações?

O Estado de S.Paulo: O que o sr. achou da posição do Brasil e da presidente Dilma Rousseff na ONU de apoiar a criação de um Estado palestino?
Tawfic Abdallah: Agradecemos ao governo brasileiro e ao povo brasileiro por apoiar o povo palestino.

O Estado de S.Paulo: O sr. foi acusado e preso por matar um soldado israelense. O sr. se arrepende?
Tawfic Abdallah: (Pausa) Não sei.

O Estado de S.Paulo: E o sr. possui alguma religião, acredita em Deus?
Tawfic Abdallah: Acredito, mais do que você possa imaginar.

Fonte: O Estado de S.Paulo