Contra decisão judicial, empresas atacam Santuário dos Pajés

O Santuário dos Pajés enfrentou na manhã de 10 de novembro o maior atentado de sua história. Mesmo com decisão contrária da desembargadora federal Selene Maria de Almeida, as construtoras Brasal e João Fortes entraram na região com seus imensos tratores, dezenas de caminhões, além de 450 policiais (segundo a própria PM poderiam chegar até 800), helicóptero, Batalhão de Choque, bombeiros e imprensa.

Em audiência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias, indígenas classificaram de ilegal a ação policial no Santuário, local de construção do setor habitacional Noroeste, em Brasília. Segundo os participantes da audiência realizada na manhã do mesmo dia 10, centenas de policiais chegaram ao local para garantir as três empresas retomassem os trabalhos de construção do novo bairro.

A deputada Erika Kokay (PT-DF), que solicitou a realização do debate, concorda que a ação policial se apoia em decisão judicial frágil. Segundo ela, a desembargadora do Tribunal Regional Federal deu apenas à empresa Emplavi o direito de atuar em seu lote. No entanto, disse a deputada, uma decisão de juiz de primeira instância abriu a possibilidade de outras empresas atuarem no local.

"Estão ferindo a hierarquia, estão utilizando um instrumento judicial roto, insuficiente e inseguro, porque não se pode reformar uma decisão de segunda instância por um juiz de primeira, de plantão, para justificar uma operação policial.”

Na opinião da deputada, o governo do Distrito Federal está utilizando um artifício “que é absolutamente inapropriado para justificar uma operação policial e justificar a sua submissão aos interesses empresariais".

Segundo Erika Kokay, a sentença do juiz de plantão autorizou também o uso de força policial contra quem tentasse atrapalhar a operação. Por isso, os indígenas chegaram a pedir a interrupção da audiência para que os deputados fossem ao local fazer a intermediação com a polícia e o governo distrital. Porém, os parlamentares acharam mais adequado continuar o debate e tentar marcar uma reunião com o governador Agnelo Queiroz para discutir o assunto.

50 hectares

O presidente da Associação Cultural Povos Indígenas, índio tupinambá Awamirim, disse que a permanência dos índios no local não é incompatível com os empreendimentos imobiliários. "O Noroeste só vai ser sustentável, bairro ecológico, se reconhecer o Santuário dos Pajés na sua integridade de 50 hectares. Vai ser um benefício aos moradores, eles vão poder acordar e respirar um ar puro e saudável".

Para resolver o impasse, Awamirim sugere a transferência das quatro quadras licitadas para outras regiões do próprio setor Noroeste que ainda não foram vendidas. Erika Kokay concorda que, ao invés de tirar os indígenas do local, o governo deveria indenizar as pessoas que compraram imóveis na região.

Os participantes da audiência cobraram a criação, pela Fundação Nacional do Índio (Funai), de um grupo técnico para avaliar se há evidências do uso tradicional da terra pelos indígenas que justifiquem a sua demarcação. Os representantes dos governos federal e distrital convidados para a audiência não compareceram.

Laudo antropológico

Erika Kokay explicou que a comunidade reside na área desde 1975, o que pode ser comprovado por fotos e documentos da Companhia Imobiliária de Brasília.

A deputada informou ainda que o laudo antropológico da área, encomendado pela Funai na década de 1990, já foi elaborado.

“Nele reconhece-se que a área é tradicional e recomenda-se que o processo de demarcação seja iniciado. A direção da Funai, porém, afirma publicamente que o estudo é inconsistente e em seguida se negou a se pronunciar sobre a demarcação ou encaminhar o laudo para os órgãos legais”, explicou Kokay.

Ação civil

Kokay lembrou que, em 2009, uma ação civil pública do Ministério Público Federal determinou que o órgão indigenista responsável constituísse grupo de trabalho para realizar os estudos iniciais para demarcação e delimitação da terra indígena Santuário dos Pajés. A ação, segundo ela, também impede a execução de obras no local que possam impactar, reduzir, subtrair ou restringir o modo de vida da comunidade.

A deputada afirma que, após as ações para o início das construções na área, surgiram denúncias de abusos em confrontos entre seguranças particulares e manifestantes contrários às obras.

A principal divergência é sobre o tamanho da área. As empresas alegam que os indígenas têm direito a 4 hectares. Documento da Funai, no entanto, aponta dimensões que variam de 12 a 50 hectares.

Fonte: Agência Câmara de Notícias