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Honduras: Um triângulo que é um abismo

A repórter do The Miami Herald, Frances Robles, recebeu informação de que em Honduras havia prisões onde os presos tinham a liberdade de deixar a reclusão para cometer crimes, sendo que quem patrocinava os ilícitos eram os próprios chefes carcereiros. Frances viajou a este país centro-americano para descobrir que a situação havia se deteriorado de tal maneira que o motivo que a levou a realizar sua cobertura ficou pequeno.

Por Salvador Camarena*, em seu blog no El País

“Estamos podres desde a medula”, disse Gustavo Alfredo Landaverde a Frances em novembro passado, segundo publicou neste domingo (22) The Herald. A repórter questionava sobre a “corrupção relacionada com as drogas que infectam virtualmente todos os estratos da lei e da ordem em Honduras”. Seu entrevistado, um dos poucos que aceitou ser identificado, disse na ocasião “Estamos frente a um abismo. Estas são organizações criminosas por dentro e por fora (do sistema)”.

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Landaverde, ex subdiretor da Direção de Luta Contra o Narcotráfico, cujo chefe foi assassinado, questionava, no dia da entrevista, “por que estou vivo ainda?”, publicou Frances. Duas semanas depois, de fato, foi executado.

O trabalho de Frances escancara os dados que já anunciavam que Honduras é hoje a capital mundial do assassinato. Mas não é uma situação isolada ou singular. Uma reportagem reproduzida pela infolatam há duas semanas lembrou que o Observatório de Segurança da Organização dos Estados Americanos (OEA) alertou que o chamado Triângulo do Norte da América Central, composto por Honduras, Guatemala e El Salvador, tem loucos níveis de homicídios: “Honduras teve uma taxa de 81,83 para cada 100 mil habitantes em 2010; El Salvador, de 64,68; Guatemala, de 41,46, segundo o Observatório”.

O problema de Honduras é de tal magnitude que grupos como El Cuerpo de Paz decidiu tirar seus 158 integrantes, “como parte de uma decisão que também inclui El Salvador e Guatemala pelo perigo que a criminalidade representa nesses países”, como publicou Univision.

“Hoje vivemos em uma situação de violência inconcebível”, publicou no mês passado no diário Século 21 da Guatemala a prêmio Nobel da Paz Rigoberta Menchú. “Impuseram o terror e a brutalidade, uma cultura de menosprezo à vida. No entanto, esta violência não pode ser vista de maneira isolada mas como uma consequência de uma ordem injusta e atada a estruturas econômicas, sociais e políticas estabelecidas para excluir e discriminar mas também para favorecer. Estruturas que permaneceram com o tempo e se mantém à força para impedir mudanças. A debilidade manifesta das instituições do Estado e sua sistemática corrosão não faz com que seja possível avançar nas condições que devem fazer própria a proteção e o respeito aos direitos humanos de maneira integral”.

Quantas vozes de alerta terão que ser somadas antes de vermos uma revolução regional que inclua decididamente os Estados Unidos, por sua co-responsabilidade como país consumidor da droga, a grande destruidora das, por si só débeis, estruturas institucionais que ficaram na Guatemala e El Salvador, depois de suas respectivas guerras civis, e incluindo Honduras, onde até o golpe de Estado contra Manuel Zelaya se converteu em uma distração do governo que foi aproveitado pelos criminosos, como informa o Organized Crime in Central America, the Northern Triangle, publicado em setembro pelo Woodrow Wilson Center.

Neste informe, se destaca que as taxas criminais nos lugares críticos, aqueles que foram tomados pelo tráfico de drogas, de Honduras, El Salvador e Guatemala são 100% mais altas que em outras zonas desses mesmos países.

Além disso, aos grupos delinqüentes dessa região se somou o apetite das máfias mexicanas, pois é a rota pela qual traficam a droga: a mesma relatório assinala que enquanto em 2008 esse corredor viu passar 42% da cocaína destinada aos EUA, em 2010 já passava 60% da droga.

Ao valente Landaverde faltou incluir El Salvador e a Guatemala no abismo de sua terra natal, Honduras, como descreveu a Frances Robles.

*Salvador Camarena é jornalista