Filme de Sílvio Tendler mostra estratégia que derrubou ditadura

O documentário de Tendler Tancredo – A Travessia, lançado em outubro do ano passado, mostra como Tancredo Neves construiu a arquitetura política que derrubou a ditadura militar no próprio colégio eleitoral que ela criou, o das eleições indiretas.

O filme começou a nascer há 26 anos, quando Tendler foi autorizado a documentar a posse de Tancredo Neves como presidente do Brasil. A posse não houve porque, a poucas horas da cerimônia,o presidente eleito não tinha condições de assumir. "Ele virou personagem de uma tragédia grega", sentencia Tendler.

O projeto sobre Tancredo fecha o que não deixa de ser uma trilogia, iniciada por Os Anos JK, sobre a presidência de Juscelino Kubistchek, e Jango, sobre João Goulart, que virou estandarte da campanha pelas Diretas. Os Anos JK fez 800 mil espectadores, Jango passou de um milhão. Tendler foi ainda mais longe e seu documentário sobre Os Trapalhões fez estratosféricos 1,7 milhão de espectadores.

Juntando material filmado e de arquivo, Tendler reuniu cerca de 40 horas sobre Tancredo Neves. Não foi um filme difícil de montar, pelo contrário. Durante todo o tempo, Tendler pensava em fazer justiça ao político, mas também ao homem. "Tancredo foi um grande estrategista político. Viveu vinte anos à sombra da ditadura. Tinha fama de conservador. Mas foi ele quem construiu a travessia da ditadura para a redemocratização. Tancredo garantiu a transição pacífica. E ele era um homem engraçado. Tanto quanto o político, queria servir ao homem."

Mineiro não é radical

Durante as sessões do filme no Festival Internacional de Documentários "É Tudo Verdade", o público não resistia. Ria e chegou a aplaudir uma declaração de Tancredo: "Mineiro que é radical pode até ter nascido em Minas, mas não é mineiro".

Seu nome virou sinônimo de negociador, e nunca foi associado a denúncias de corrupção, esse flagelo que hoje, mais que nunca, assola a política, e não apenas a brasileira. Tendler conta porque isso é tão importante no momento atual. "Há uma descrença dos jovens na política e nos políticos. Mas quando eles negam sua participação política, seu engajamento, na verdade estão fazendo uma política perigosa. Tancredo é uma boa ferramenta para o jovem descobrir a arte e a esperteza, a astúcia da política."

Trabalho de formiguinha

Tendler tem feito um trabalho de formiguinha. Ele levou o filme aos mais distantes rincões do Brasil. Só esta semana esteve em São Paulo, Ribeirão Preto, Campinas e Brasília. Os campinenses estão assistindo a uma retrospectiva de sua obra. Tendler tem muito orgulho de O Veneno Está na Sua Mesa, um documentário de 40 minutos sobre os agrotóxicos que disponibilizou na internet.

"É só entrar no YouTube, digitar o título que o filme vai aparecer, com a recomendação de que sejam feitas cópias para ajudar na circulação das informações."

Palavras como humanidade e conscientização não perderam o sentido para esse veterano batalhador. Ele sabe que, à margem das telas, Tancredo – A Travessia conta com as redes sociais para tentar criar um bochicho. Talvez, fora das vias tradicionais, Tancredo termine fazendo um milhão de espectadores – Veneno já fez 100 mil na rede. Tendler põe fé no filme. Muita gente já lhe disse que é seu documentário mais emocionante.

Vai ser difícil ficar indiferente diante da integridade do dr. Tancredo, que recorreu à figura mítica de Tiradentes em sua campanha presidencial. Como o inconfidente, o negociador, mineiro até a medula, também era "enlouquecido por liberdade".

Da Redação, com informações do Estadão

Veja também:
-Silvio Tendler na luta pela vida