Hélio Leitão: Não à pena de morte no Brasil

 Tema recorrente no debate público brasileiro, a adoção da pena capital encontra expressa vedação no texto constitucional, sendo insuscetível de emenda constitucional, a teor do que prescreve o artigo 60, parágrafo quarto, inciso IV da Constituição Federal de 1988.

 Causa uma enorme preocupação, todavia, constatar que expressiva parcela do povo brasileiro deposita esperanças na pena de morte como instrumento repressivo apto a opor freios à onda de criminalidade que assola o país.

Recente pesquisa realizada pelo Núcleo de Estudos da Violência (NEV) da Universidade de São Paulo (USP) trouxe à luz esta realidade, sendo de destacar que em Fortaleza 57,7% dos entrevistados se disseram favoráveis à pena de morte, resultado, fácil ver, da indignação e do medo que acometem o fortalezense, vítima diária da violência.

Se é explicável a reação dos nossos concidadãos, tenha-se que os argumentos esgrimidos em defesa da adoção do assassínio oficial não resistem a uma reflexão mais desapaixonada.

Com efeito, em nenhum país onde se aplicou ou ainda se aplica a pena de morte verificou-se redução dos índices de criminalidade, provando a atualidade da lição de Cesare Beccaria e Montesquieu, para quem a certeza da aplicação da pena e não a sua severidade é o verdadeiro fator dissuasório do cometimento de crimes.

Ademais a irreversibilidade do erro judiciário em caso de aplicação da pena de morte, aliada à perda da supremacia ética por parte do Estado que assassina a sangue frio, são aspectos do problema que, bem ponderados, sepultam qualquer discurso de defesa da pena capital.

Como disse o escritor e poeta português Miguel Torga, na conferência que proferiu no “Colóquio Internacional Comemorativo da Abolição da Pena de Morte em Portugal”, realizado em setembro de 1967, deixemos que os homens morram a sua própria morte: “A tragédia do homem, cadáver adiado, como lhe chamou Fernando Pessoa, não necessita dum remate extemporâneo no palco. É tensa bastante para dispensar um fim artificial, gizado por magarefes, megalômanos, potentados, racismos e ortodoxias. Por isso, humanos que somos, exijamos de forma inequívoca que seja dado a todos os povos um código de humanidade. Um código que garanta a cada cidadão o direito de morrer a sua própria morte”.

Hélio Leitão é advogado e ex-presidente da OAB/CE

Fonte: O POVO