Banzo

O poeta e militante antirracista Eduardo de Oliveira despedi-se da vida na tarde da quinta-feira (12). Notável militante, notável combatente! Ajudou a formar gerações de lutadores pela igualdade racial, com seu jeito firme, persistente e, ao mesmo tempo, doce e suave. Prosa Poesia e Arte homenageia sua memória e reproduz o pema Banzo, que traz como dedicatória

(Ao meu irmão Patrice Lumumba)

Por Eduardo de Oliveira

Eduardo de Oliveira

Eu sei, eu sei que sou um pedaço d'África
pendurado na noite do meu povo.
Trago em meu corpo a marca das chibatas
como rubros degraus feitos de carne
pelos quais as carretas do progresso
iam buscar as brenhas do futuro.

Eu sei, eu sei que sou um pedaço d'África
pendurado na noite do meu povo.
Eu vi nascer mil civilizações
erguidas pelos meus potentes braços;
mil chicotes abriram na minh'alma
um deserto de dor e de descrença
anunciando as tragédias de Lumumba.

Eu sei, eu sei que sou um pedaço d'África
pendurado na noite do meu povo.
Do fundo das senzalas de outros tempos
se levanta o clamor dos meus avós
que tiveram seus sonhos esmagados
sob o peso de cangas e libambos
amando, ao longe, o sol das liberdades.

Eu sei, eu sei que sou um pedaço d'África
pendurado na noite do meu povo.
Eu sinto a mesma angústia, o mesmo banzo
que encheram, tristes, os mares de outros séculos,
por isto é que ainda escuto o som do jongo
que fazia dançar os mil mocambos…
e que ainda hoje percutem nestas plagas.

Eu sei, eu sei que sou um pedaço d'África
pendurado na noite do meu povo.
Balouça sobre mim, sinistro pêndulo
que marca as incertezas do futuro
enquanto que me atiram nas enxergas
aqueles que ainda ontem exploravam
o suor, o sangue nosso e a nossa força.

Eu sei, eu sei que sou um pedaço d'África
pendurado na noite do meu povo.

Eu sei, eu sei que sou um pedaço d'África
pendurado na noite do meu povo.
Eu vi nascer mil civilizações
erguidas pelos meus potentes braços;
mil chicotes abriram na minh'alma
um deserto de dor e de descrença
anunciando as tragédias de Lumumba.

Eu sei, eu sei que sou um pedaço d'África
pendurado na noite do meu povo.
Do fundo das senzalas de outros tempos
se levanta o clamor dos meus avós
que tiveram seus sonhos esmagados
sob o peso de cangas e libambos
amando, ao longe, o sol das liberdades.

Eu sei, eu sei que sou um pedaço d'África
pendurado na noite do meu povo.
Eu sinto a mesma angústia, o mesmo banzo
que encheram, tristes, os mares de outros séculos,
por isto é que ainda escuto o som do jongo
que fazia dançar os mil mocambos…
e que ainda hoje percutem nestas plagas.

Eu sei, eu sei que sou um pedaço d'África
pendurado na noite do meu povo.
Balouça sobre mim, sinistro pêndulo
que marca as incertezas do futuro
enquanto que me atiram nas enxergas
aqueles que ainda ontem exploravam
o suor, o sangue nosso e a nossa força.

Eu sei, eu sei que sou um pedaço d'África
pendurado na noite do meu povo.

Eduardo de Oliveira nasceu em 1926; em 1958 foi o primeiro negro a eleger-se vereador na capital paulista; foi poeta, professor, conferencista, político, militante do movimento negro antes de 1964 e desde que o movimento ressurgiu, em plena ditadura militart em 1975. Foi autor dos livros Banzo, (1965), do qual este poema foi extraído, Gestas Líricas da Negritude (1967), Evangelho da Solidão (1970).