Invadir embaixada equatoriana seria suicídio, diz Correa

O presidente do Equador, Rafael Correa, acredita que se as autoridades britânicas cumprirem com a ameaça de invadir a embaixada equatoriana em Londres para prender Julian Assange estariam cometendo “suicídio”.

Em entrevista à rede estatal ECTV nesta segunda-feira (20) à noite, Correa explicou ao público equatoriano que o Reino Unido seria o mais prejudicado neste caso. “Depois poderiam violar as sedes diplomáticas britânicas em qualquer parte do planeta e eles não teriam o que dizer”, argumentou ele.

O presidente equatoriano também lembrou que diversos membros da comunidade internacional condenaram e repudiaram as ameaças feitas pelas autoridades britânicas de invadir a embaixada do país por violarem o direito internacional. Além dos blocos regionais Unasul e Alba, que já reprovaram publicamente as atitudes do Reino Unido, a OEA irá se reunir para definir uma posição acerca do assunto, como indicou Correa.

No entender dos diplomatas, uma possível invasão da sede diplomática significaria uma infração do artigo 22 da Convenção de Viena, que determina que “os locais da missão são invioláveis” e “não podem ser penetrados sem o consentimento do chefe da missão (diplomática)”. Por esta razão, Correa chegou a afirmar na entrevista que vai levar “essa questão às Nações Unidas”.

O Equador mantém que recebeu uma “ameaça explícita” do governo de Londres um dia antes de conceder formalmente o asilo político ao fundador do Wikileaks quando autoridades britânicas entregaram uma carta à missão diplomática equatoriana no país advertindo a possibilidade de invadirem a embaixada baseando-se em uma lei local. Segundo o ministro de Relações Exteriores do Equador, Ricardo Patiño, o governo britânico disse que poderia "invadir nossa embaixada do Equador em Londres caso Julian Assange não seja entregue". Leia abaixo o documento enviado pelo Reino Unido aos diplomatas equatorias na íntegra em português.

O governo de Londres não negou as ameaças e nem se desculpou com o país latino-americano pela carta. Nesta segunda-feira (20), o porta-voz do premiê David Cameron afirmou que o governo está em busca de “uma solução diplomática” para a crise, mas reiterou que as autoridades britânicas não vão conceder o salvo-conduto a Assange.

“Nós não vamos garantir uma passagem segura a Assange. De acordo com nossas leis, ao se esgotarem todas as opções de apelação, somos obrigados a extraditá-lo à Suécia”, disse o porta-voz segundo a rede britânica BBC.

O jornalista australiano está alojado na embaixada equatoriana em Londres desde o dia 19 de junho e mesmo com a concessão do asilo político, não sabe como deixará o Reino Unido sem a autorização do governo britânico. Assange tenta impedir sua extradição à Suécia, onde é acusado de crimes sexuais. Seu maior temor é que, caso seja enviado a Estocolmo, ele possa ser extraditado aos Estados Unidos, onde pode responder pela revelação de documentos secretos do Departamento de Estado norte-americano, crime passível de condenação à pena de morte.

Leia a íntegra da carta enviada pelo Reino Unido na semana passada, divulgada pelo site equatoriano Telegrafo e traduzida para o português por Victor Farinelli: 

AIDE MEMOIRE

•Estamos conscientes e surpreendidos pelas informações publicadas nas últimas 24 horas nos meios de comunicação do mundo inteiro, com a notícia de que o Equador estaria prestes a tomar uma decisão e que essa seria a de conceder ao Sr. Julian Assange o asilo por ele solicitado.

• As informações a este respeito citam fontes oficiais.

• Notamos que o Presidente Rafael Correa declarou que ainda não tomou uma decisão.

• Estamos preocupados de que, caso a notícia seja confirmada, a novo panorama venha a enterrar os esforços por definir um texto em conjunto que estabeleça as posições de ambos os países, permitindo, assim, que o Sr. Assange deixe a Embaixada.

• Como foi comunicado anteriormente, devemos cumprir com as nossas obrigações legais, descritas na Decisão Marco relativa à Ordem de Detenções Europeia e à Lei de Extradição de 2003 (Extradition Act 2003), de levar o Sr. Assange à prisão e extraditá-lo à Suécia. Seguimos comprometidos a trabalhar com vocês amigavelmente para resolver este assunto. Porém, queremos deixar absolutamente claro que isto significa que em caso de receber uma petição de salvo-conduto para o Sr. Assange, despois de concedido o asilo, esta será negada, de acordo com nossas obrigações legais.

• Sob essa perspectiva, e tendo em vista as declarações dadas nas últimas 24 horas, esperamos que vocês estejam preparados para continuar levando a cabo o atual diálogo diplomático. Seguimos acreditando que é possível uma solução baseada em um texto feito em conjunto e com comum acordo entre as partes, permitindo a saída do Sr. Assange da Embaixada e sua posterior extradição.

• Temos outra reunião (videoconferência) agendada para esta quinta-feira, 16 de agosto. Tendo em vista as declarações feitas ontem (14 de agosto) em Quito, dizendo que a decisão seria iminente, devemos assumir que esta reunião será a última para o acordo de um texto conjunto?

• Devemos reiterar que consideramos insustentável o uso contínuo das instalações diplomáticas dessa forma e incompatível com a Convenção de Viena, além de já termos explicado claramente quais poderiam ser as sérias consequências para nossas relações diplomáticas.

• Vocês devem estar conscientes de que há uma base legal no Reino Unido – a Lei sobre Instalações Diplomáticas e Consulares, de 1987 (Diplomatic and Consular Premises Act 1987) — que nos permitiria tomar ações para efetuar a prisão do Sr. Assange dentro das instalações atuais da Embaixada.

• Sinceramente, esperamos não ter que chegar a este ponto, mas se vocês não podem resolver o assunto da presença do Sr. Assange em suas instalações, este caminho estará disponível como uma de nossas alternativas.

• Compreendemos que são importantes para vocês os assuntos planteados pelo Sr. Assange, e a forte pressão pública que existe no Equador sobre o tema. Ainda assim, precisamos resolver esta situação aqui no Reino Unido, de acordo com nossas obrigações legais. Temos nos esforçado por buscar um desfecho através de um texto em comum acordo, que ajude a satisfazer suas preocupações e necessidades de apresentar a situação perante a opinião pública.

• Seguimos acreditando que um texto em comum acordo, junto com a rendição voluntária do Sr. Assange, seria a melhor das soluções.

Com Opera Mundi