Venezuela defende os direitos humanos, mas CIDH defende os EUA

Na semana passada, a Venezuela anunciou sua saída oficial saída da Comissão e da Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da OEA. A decisão revoltou a imprensa brasileira. O jornal O Estado de S. Paulo, na quinta (13), estampou em seu editorial que a “Venezuela é um simulacro de democracia”. O embaixador do país no Brasil, Maximilien Sánchez Arveláiz, no entanto, argumenta que a Corte há anos vem politizando questões contra o governo de Hugo Chávez.

Por Vanessa Silva, para o Vermelho

De acordo com o texto do Estadão, “há mais de uma década, o órgão vem apontando a deterioração progressiva dos direitos humanos e das garantias individuais na Venezuela, transformando o país em um simulacro de democracia”. O estopim da decisão venezuelana foi, segundo o jornal, a decisão da Corte de condenar o Estado venezuelano a indenizar Raúl José Días Peña por ter ficado detido durante seis anos, acusado de terrorismo.

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O representante do governo bolivariano da Venezuela no Brasil, no entanto, contesta a versão apresentada pelo jornal. Em entrevista ao Portal Vermelho, ele esclarece que “há dez anos a Corte se distanciou dos sagrados princípios de defesa dos direitos humanos e se converteu em arma política para desestabilizar determinados governos na região, desrespeitando princípios básicos de direito internacional, como a soberania dos Estados e desconhecendo a resolução da Comissão de Direitos Humanos da ONU”.

Outra questão sensível para a Venezuela lembrada por ele, foi que, durante o Golpe de Estado contra o presidente Hugo Chávez em 2002, a Comissão admitiu e reconheceu o governo golpista, quando várias entidades de direitos humanos em todo o mundo pronunciaram-se contra.

Direitos Humanos na Venezuela

O jornal sugere que tal medida impacta no respeito às convenções de direitos humanos na Venezuela. Sobre isso, o embaixador tranquiliza: “somos membros plenos de Genebra e (…) estamos apoiando o Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, que está se consolidando. Somos totalmente favoráveis a ele [Conselho da ONU]”.

E ressaltou ainda que “hoje temos como marco o direito irrestrito aos direitos humanos e às lutas humanitárias. Para isso, criou-se a defensoria do povo, estabeleceu-se o poder público, o poder eleitoral. (…) A Constituição bolivariana aprofundou e ampliou as liberdades individuais e os direitos humanos na Venezuela”, garante o embaixador.

Brasil apoia decisão

Os problemas envolvendo a CIDH não são exclusivos da Venezuela. Em entrevista ao Estadão no domingo (16), o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Antonio Patriota, reconheceu que “o sistema interamericano está passando por um momento de reflexão interna que o Brasil contribuiu para lançar”. E pontuou que “desde o ano passado foi adotada uma resolução na Assembleia-Geral da OEA em El Salvador que determinou uma análise do sistema em seu conjunto, suas possíveis deficiências e falhas, para torná-lo mais satisfatório. Isso prosseguiu na assembleia de Cochabamba (Bolívia, em junho)”.

As mudanças propostas, segundo Patriota, “visam tornar mais previsível e mais legítimo o sistema, deixando menos arbitrariedade aos membros da comissão e mais claras as atribuições da comissão e da corte”. Da mesma maneira, o ministro brasileiro apoiou a decisão venezuelana: “a saída da Corte Interamericana é uma decisão soberana da Venezuela (…). Mas posso dizer que o grau de insatisfação é manifesto e em função disso está sendo feita essa revisão, com vistas a fortalecer o sistema”.

Raúl José Días Peña

Os Estados Unidos se arvoram o direito de intervir em países onde consideram que há prática de terrorismo contra seu Estado. Essa é a diretriz presente na Doutrina Bush, ou Doutrina de Agressão Positiva, formulada no pós 11 de setembro de 2001. Mas, quando Estados soberanos agem contra atos terroristas em seus próprios territórios, e se isso não é compatível com o interesse da Nação do Norte, são punidos. Foi assim com o Caso dos Cinco Antiterroristas Cubanos e é assim com o caso Raúl José Días Peña.

De acordo com os documentos venezuelanos a que o Vermelho teve acesso, Días Peña foi acusado por sua participação em dois atos terroristas com bombas contra o Consulado Geral da Colômbia e a Embaixada da Espanha em Caracas no ano de 2003. De acordo com as normas do país, ele foi condenado a nove anos e quatro meses de prisão “pelos delitos de intimação pública, danos à propriedade pública e lesões leves”.

Em 2010, Días Peña, considerado terrorista pela Venezuela, fugiu para Miami, Estados Unidos.

Em 2005, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos emitiu uma petição a favor de Peña, acusando a Venezuela de violação de seus direitos à integridade pessoal, às garantias judiciais e à proteção da honra e dignidade. Em 2007, a Venezuela respondeu a Corte esclarecendo que o caso ainda estava em andamento nos organismos competentes do Estado e prestou diversos esclarecimentos.

Mas, mesmo sem terem esgotado todas as vias nacionais antes que se intervisse nesta questão, a Corte condenou, em 26 de junho de 2012, a Venezuela pelo caso Raúl José Días Peña.

O documento venezuelano conclui que é “intolerável, para qualquer país democrático e respeitoso ao Estado de direito, manter-se calado ante um Sistema de direitos evidentemente corrompido e que atua à margem dos princípios e valores que estão chamados a proteger, e que ao contrário, terminam convertendo-se em cúmplices protetores de convictos terroristas”.