Bruno Peron: A Venezuela e a Missão Mercosul

A instabilidade política no Palacio de Los López, que culminou na suspensão temporária do Paraguai de dois dos principais mecanismos de integração sul-americanos até as eleições presidenciais paraguaias em abril de 2013, não foi somente um sopro de mau hálito. Talvez o único ponto positivo seja a decisão unânime (e retaliadora) de Argentina, Brasil e Uruguai que incorporou a Venezuela no final de julho de 2012 ao Mercado Comum do Sul (Mercosul).

Por Bruno Peron*

O Parlamento paraguaio não esperava torcer o pé numa pisada em terreno desconhecido e de que o presidente ilegítimo Federico Franco ainda tenta recuperar-se com sessões de fisioterapia executiva. Enquanto a elite paraguaia trama contra o povo daquele país, projetos florescem alhures do Mercosul.

Chávez venceu as eleições na Venezuela com 54,4% dos votos num processo eleitoral elogiado mundialmente – um dos motivos é a baixa abstenção do eleitorado e a credibilidade de seu Consejo Nacional Electoral – e logo propôs a Missão Mercosul para promover aquele país no bloco. O objetivo da Missão é estimular "ejes de desarrollo a lo largo del país", segundo a Agencia Venezolana de Noticias ("Gobierno nacional lanzará Misión Mercosur", 10/10/2012).

A Missão Mercosul contém um plano de integração nacional através de ferrovias e outras obras infraestruturais que facilitem a incorporação venezuelana ao Mercosul – e reciprocamente o acesso dos outros países-membros à Venezuela – e o desenvolvimento de vários estados venezuelanos.

Um dos propósitos de Chávez é ligar áreas banhadas pelo extenso rio Orinoco ao Caribe mediante a construção de trilhos. Embora existam impedimentos naturais ao escoamento de mercadorias pela Amazônia – faço referência aqui à parte venezuelana e brasileira da Floresta Pluvial – o discurso de Chávez é acima de tudo um alento à integração nacional na Venezuela. Declarou Chávez que "Es Mercosur hacia el Caribe, y es Venezuela hacia el Amazonas, hacia el Río de la Plata; ¡es la potencia suramericana!" ("Presidente Chávez lanza la Misión Mercosur", Ministerio del Poder Popular para Relaciones Exteriores, 10/10/2012).

Porque o Mercosul é primeiramente uma integração econômica que visa a um mercado comum entre os países-membros, empresários venezuelanos temem que seus produtos tenham desvantagens competitivas em relação aos brasileiros. No entanto, estes empresários têm menos razão para preocupar-se porque Chávez propôs um plano de transferência de créditos para investir em tecnologia de empresas que tenham pouca competitividade. O ingresso da Venezuela ao Mercosul favorece empresas venezuelanas que farão seus produtos alcançar com menos tributos regiões meridionais do continente.

Chávez convoca segmentos amplos e carentes em recursos da Venezuela como poucos outros líderes contemporâneos na América Latina. Não é à toa que governa desde 1999 em regime democrático. Em vez de limitar o acesso da população aos benefícios da integração regional – como se apressam em fazer os governantes conservadores -, Chávez fortalece a base popular de seu país na direção do projeto de transformar a Venezuela numa potência através da integração regional.

A Missão Mercosul é mais uma tentativa de levar os setores populares venezuelanos ao protagonismo nos avanços integracionistas que atravessam primeiramente a geração de rendas e a integração nacional. A Venezuela prepara-se para este mecanismo sul-americano de "Pátria Grande" assim como os demais membros têm-no feito desde o início da década de 1990.

* Bruno Peron é bacharel em Relações Internacionais (Unesp), mestre em Estudos Latino-americanos (Unam-México) e colaborador do Vermelho