Síria: no "vermelho" a queda de braço endoimperialista

O termômetro da tensão na fronteira turco-síria já chegou no "vermelho", enquanto continua agressiva troca de acusações mútuas entre Síria, Turquia e Rússia, por causa da aterrissagem forçada do Airbus A320, da AirSíria, semana passada, no aeroporto de Ancara, capital da Turquia, sob a acusação do governo turco de que transportava "material não civil" de Moscou para Damasco.

Por Serbin Argyrowitz, no Monitor Mercantil

Este episódio veio somar-se ao quase diário lançamento de morteiros do território sírio contra o território turco e a firme resposta da artilharia turca, que prossegue há dias, sem ter sido respondida sequer uma das perguntas que acompanham esta troca de fogo, porque – até o momento – não ficou claro quem encontra-se por trás destes ataques de ambos os lados da fronteira, considerando que nas regiões de onde estão sendo lançados os morteiros atuam numerosos grupos de insurgentes sírios armados, aos quais o governo turco já tem oferecido refúgio, enquanto, simultaneamente, tem recrudescido a ação do PKK curdo da Turquia.

O episódio com o avião sírio e as evoluções posteriores sinalizam um claro recrudescimento da escalada da queda de braço endoimperialista com objetivo a garantia de maior apoio e parcela de controle sobre a valiosa geoestratégica e energeticamente região do Grande Oriente Médio. E pela primeira vez, tanto indireta, quanto diretamente, a Turquia enfrenta a Rússia.

O governo de Moscou desmentiu categoricamente o governo de Ancara, enquanto o ministro russo de Relações Exteriores, Sergei Lavrov, afirmou que "a carga no Airbus A320 era legal e não continha armas, mas equipamentos para sistemas de radares". Além disso, a Rússia acusou a Turquia de "ter posto em risco a vida de cidadãos russos" (17 dos 37 passageiros que viajam no avião eram russos).

Simultaneamente, a oportunidade para elevar os tons e recrudescerem as pressões contra a liderança do governo sírio apressaram-se a agarrar os EUA e a França, que caracterizaram a reação das autoridades turcas rigorosamente justificada e apropriada, com o presidente da França, François Hollande, tendo elogiado a "autocontenção da Turquia contra as contínuas provocações sírias".

A esclarecer

A Turquia insiste, até hoje, que o Airbus sírio transportava, ilegalmente, equipamentos e materiais militares que são proibidos em vôos da aviação civil, endereçando suas acusações também contra a Rússia, considerando que a carga ilegal havia saído de fábricas russas. Mas à Turquia resta esclarecer sua posição, pois esta não foi a primeira vez que aviões sírios e russos transportando equipamento militares sobrevoaram o território turco a caminho da Síria, segundo fontes de serviços secretos sírios.

Também, o governo de Ancara continua "reaquecendo" o episódio e não divulgando detalhes sobre a carga do avião, declarando que "continuam as investigações", embora tanto o Ministério de Relações Exteriores da Síria, quanto o correspondente da Rússia têm, persistentemente, pedido ao governo de Ancara que apresente seus "achados no avião".

O governo sírio classificou como ato de pirataria a aterrissagem forçada do avião e declarou que o comportamento turco está sendo hostil, inimigo e transgressor dos cânones internacionais da aviação civil. Também acusou as autoridades turcas de maltratarem a tripulação do avião, a qual, por sua vez, afirma que a Turquia está mentindo e até o momento não mostrou sequer um de seus achados de equipamentos e materiais militares que sustenta ter achado e confiscado.

Reações internas

A decisão da Assembléia Nacional da Turquia (Parlamento), que deu sinal verde ao governo para realizar operações terrestres do exército turco dentro do território sírio, assim como o recrudescimento das tensões entre Ancara e Damasco estão provocando fortes reações da oposição política turca.

O Partido Republicano (GHP) questiona até que ponto o governo do Partido de Justiça e Desenvolvimento deseja uma invasão da Turquia em território sírio, considerando suas declarações, por um lado de "autocontenção", e por outro de que "os planos de apoio da Turquia estão preparados".

Kemal Okouyan membro do Comitê Central do Partido Comunista da Turquia, em artigo publicado em jornais do país, registra que, "após de fornecimento de informações e ajuda com armamentos aos combatentes sunitas, a Turquia começou a pressionar com sua artilharia, consideravelmente, o exército sírio. Com os frequentes tiros de sua artilharia, a Turquia tenta assumir a iniciativa na guerra não declarada, a não ser que o exército sírio responda. Se a Síria responder isto, então, será utilizado como argumento para a invocar o apoio da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), da qual a Turquia é país-membro, fato que, além dos eventuais entreveros terrestres, incursões aéreas e decretação de zona proibida, resultará em diferentes estratégias operacionais".

Finalmente, Okouyan adverte que o povo da Turquia deve se tornar obstáculo contra os planos do governo, declarando sua franca oposição à guerra.

Ação de mercenários

A aterrissagem forçada do avião russo por dois caças-bombardeiros F-16 de Turquia constitui prova irrefutável sobre em quão frágil equilíbrio encontram-se as relações entre forças periféricas e potências imperialistas neocolonialistas, e quão fácil é existir uma "centelha" que provocará a explosão total que poderá arrastar em sua vertigem muito maior número de players dos que pode-se imaginar hoje, embora nenhum dos imperialistas neocolonialistas e muito menos nenhuma das forças periféricas estejam dispostos a envolver-se, diretamente, no banho de sangue que está ocorrendo em território sírio.

Quanto mais que, a cada dia que passa, torna-se claro que dentro do território sírio têm entrado e encontram-se em ação plena inúmeros mercenários estrangeiros e combatentes fundamentalistas islâmicos, os quais já começam revelar seu descontentamento mesmo quando seus financiadores, como são as petromonarquias do Golfo Pérsico, atrasam suas remunerações, assim como a Turquia, utilizada como esconderijo e campo de repouso.

A divulgação da criação de frente composta por organizações islâmicas que atuam dentro do Síria, e várias destas reconhecendo, abertamente, que suas fileiras são compostas por combatentes estrangeiros mercenários, não entusiasmou os "combatentes da liberdade" (os insurgentes sírios).

Mas também não agradou os grupos monopolizadores, cujos planos para controle geoestratégico da região e de sua incalculável riqueza são baseados na invasão da Síria e, em seguida, do Irã, o Éden das potências imperialistas neocolonialistas.