Carlos Lozano: A paz é possível

As intervenções de Humberto de La Calle Lombana e de Iván Márquez na instalação da Mesa de Diálogos em Oslo, Noruega, na quinta-feirada semana passada (18) colocaram as enormes diferenças e contradições políticas e ideológicas entre as duas partes, o que revela a
complexidade dos debates e discussões que ocorrerão em Havana, Cuba.

Por Carlos Lozano*

Era previsível, pois se trata de partes antagônicas que não se reúnem para trocar elogios, mas para discutir suas diferenças. Iván Márquez representa uma guerrilha que por anos tem buscado o poder pela via das armas, com uma proposta revolucionária de transformação
avançada da sociedade. Enquanto Humberto de La Calle Lombana é o porta-voz de um governo que considera inamovível o modelo atual de acumulação de economia de livre economia neoliberal, em crise nos países capitalistas mais desenvolvidos do planeta. Não há razão,então, para tanto protesto, desespero e pessimismo que fomentam os grandes meios de comunicação.

O discurso das Forças Armadas Revolucionárias da Colômiba – Exército Popular  (Farc-EP) não se afasta muito do que um partido político de esquerda ou um sindicato e organização populares defenderiam no marco da precariedade da democracia. O governo deveria pensar até onde está disposto a chegar, se é que se quer a paz, nas
mudanças políticas, sociais e econômicas para erradicar as eternas causas do conflito colombiano.

A agenda não exclui a possibilidade de que no desenvolvimento de seus pontos se tenham em conta os graves problemas nacionais, como o estão exigindo setores sociais que são excluídos do processo de paz. Não se trata de reformas maximalistas, mas sim de acordos que fortaleçam a democracia e a justiça social. São essas as causas do conflito e a
razão de ser de um novo pacto político e social para uma paz estável e duradoura.

Ao governo e ao grande capital não agradam as mudanças progressistas e de maior equidade social; sentem medo das reformas democráticas porque elas ameaçam seu enorme poder político e econômico. Ficou demonstrado nos processos de paz anteriores com as
Farc e o Exército de Libertação Nacional (ELN), todos frustrados, porque quando era inevitável abordar os temas de fundo buscaram com afã o pretexto para a ruptura. Nesta
ocasião, como existe a agenda acordada e de entrada têm que abordá-la, pretendem reduzi-la à mínima expressão.

Como tudo, como o começo foi de apresentação das posições, não há por que entrar em desespero, pois ambas as partes declararam a vontade de paz. É imprescindível a criatividade e a audácia para aplainar o caminho à solução política dialogada. O mais importante é buscar o silêncio dos fuzis e isso dependerá da profundidade das mudanças. Ambas as partes estão em pé de igualdade e de condições. O governo e os grandes meios de comunicação devem abandonar a falácia de que a guerrilha está derrotada e de que golpeando-a será obrigada a render-se.

Esse método fracassou ao longo de quase cinco décadas e só serviu para prolongar o conflito de maneira indefinida. Sobra a advertência de que o governo não seja refém do processo com inspiração a ultimato. O balanço periódico deve ser para dinamizar o diálogo, não para
acabá-lo. O tempo deve ser razoável, o necessário para abordar umaagenda que é de discussão e sobre a qual ainda não existe um só acordo.

Os grandes meios de comunicação deram um mau exemplo ao saírem do ar quando começou a coletiva de imprensa com os porta-vozes das Farc. Sinal de intolerância e de infantil retaliação.

(*) Diretor do semanário colombiano Voz
Fonte: www.pacocol.org