Ex-espião da ditadura brasileira é encontrado no Uruguai

O pastor sai do táxi, no centro de Montevidéu, e caminha com vagar até a igreja evangélica Centro El Shadday, que comanda desde 1998. São 20 horas, mas ainda faz sol. Aos 85 anos, ele curva seu 1,90 m, com o braço esquerdo ligeiramente inerte, sequela de um princípio de derrame. É magro e tem uma ferida na cabeça, causada por uma queda na rua, em agosto.

É a primeira vez que o vemos. Na entrada, estende a mão e o olhar, que esquadrinha demoradamente o rosto do interlocutor. Na véspera havíamos combinado ouvi-lo para uma reportagem sobre exilados brasileiros no Uruguai nas décadas de 60 e 70. Ele quis falar conosco na igreja, na hora do culto, pondo fim a 40 anos de silêncio.

De 1967 a 1980, Alberto Conrado Avegno teve intensa atividade secreta, como infiltrado da ditadura militar (1964-85) entre os exilados brasileiros no Uruguai. Interceptava e copiava cartas, produzia relatórios com nomes, endereços e planos, dando subsídios a 361 informes da ditadura apenas entre 1974 e 75. Fez viagens internacionais para cumprir "missões" do governo brasileiro. Foi detido duas vezes, no Uruguai e no Brasil, e liberado ao revelar-se infiltrado.

Identificado nos relatórios sob diferentes codinomes "Altair", "Johnson", "Mário", "Carlos Silveira" e até mesmo "Zuleica", ao longo de 14 anos ele se firmou como "único homem infiltrado no meio subversivo e peça fundamental do esquema de segurança do Brasil no Uruguai". As palavras são de um homem da ditadura, o delegado Rui Dourado, que ajudou o ex-embaixador Manoel Pio Corrêa a montar o Ciex (Centro de Informações do Exterior), máquina de espionagem do Itamaraty.

Fonte: Folha S.Paulo