Colômbia: negociação de paz antecipa clima eleitoral

Um dos efeitos das negociações de paz em Havana, entre o governo de Santos e a guerrilha das Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), é que no país se vive atualmente um clima de campanha eleitoral com dois anos de antecipação. De fato, o próprio resultado dos diálogos poderia ser decisivo para eleger o próximo presidente dos colombianos.

Por Simone Bruno, no Opera Mundi

Farc - Efe

Delegados das Farc para negociações de paz em Havana. Tentativa de acordo antecipou em dois anos clima eleitoral na Colômbia

O mais ativo nas últimas semanas, na questão eleitoral, é o ex-presidente Álvaro Uribe, que já se apresenta como um aberto inimigo do governo de Santos e do processo de paz. Ele espera repetir o cenário que o levou à Presidência em 2002, quando o fracasso do processo de paz encabeçado por Andrés Pastrana deu força à sua política bélica, aproveitando a decepção dos colombianos.

Uribe “acredita cegamente que as negociações de paz fracassarão e ele voltará ao poder cavalgando neste fracasso”, afirmou a Opera Mundi o analista político León Valencia, diretor do centro de pensamento Nuevo Arco Iris.

O ex-presidente apresentou, na cidade de Santa Marta, seu novo partido político, o Centro Democrático, ainda que, entre os pré-candidatos “uribistas”, nenhum apareça ainda com capacidade de derrotar Santos. A verdadeira ameaça para o atual presidente é que Uribe encabece uma lista ao Senado que consiga as cadeiras parlamentares suficientes para ter poder de veto sobre a Unidade Nacional (a coalizão de partidos que apoia o presidente Santos) que, de acordo com as pesquisas, chegaria em segundo, atrás do ex-presidente.

No entanto, segundo Valencia, as condições mudaram profundamente: “Os duros golpes recebidos tornaram as Farc mais realistas e Santos sabe que é obrigado a oferecer às guerrilhas uma saída política acompanhada de algumas reformas, mas que não pode lhes dar a menor vantagem militar. Além disso, a elite de Bogotá, tão decisiva para qualquer aspiração eleitoral, passou do amor incondicional a Uribe ao estupor frente às suas ambições”. Como se não fosse suficiente, a reeleição de Obama e a relação com os vizinhos fazem com que o cenário seja muito diferente daquele do início do século que viu Uribe vitorioso.

De fato, as primeiras pesquisas eleitorais demonstram que nenhum dos candidatos uribistas supera, em intenção de voto, nem sequer Clara López, candidata do Polo Democrático, partido que atravessa uma profunda crise.

Esquerda

Mas é justamente a situação do Polo a que preocupa os setores da esquerda colombiana, porque a atual lei eleitoral prevê o desaparecimento dos partidos que não superarem o umbral de 3%. Ou seja, se um partido não consegue pelo menos 450 mil votos, é destinado a não ser representado no próximo Congresso.

O partido sofreu uma profunda divisão que levou à separação de Gustavo Petro, ex-candidato à Presidência, que chegou ao quarto posto em 2010 e é hoje prefeito de Bogotá com o movimento Progresistas.

O próprio Valencia acredita que esta “é a situação mais absurda”. “Nunca houve um momento mais favorável para a esquerda na Colômbia. Mas a miopia de seus dirigentes é completa.” Segundo o analista, nunca na história do país as questões de esquerda como paz, reforma agrária, vítimas e inclusão política estiveram no centro do debate político como hoje.

Efetivamente, os líderes parecem mais empenhados em brigar entre si do que em aproveitar a conjuntura. A saída de Petro não é um caso isolado. A aliança entre o Polo e os Comunistas caiu; depois do afastamento de Petro, Antonio Navarro fundou “Peço a Palavra”, um novo movimento político, e a esquerda mais radical, com os estudantes, se agrupa na Marcha Patriótica, que poderia ser o formato político das Farc, quando assinado o acordo de paz.

Tentativa de unidade

Mas há quem procure reunir a esquerda. Iván Cepeda, que foi eleito congressista com o Polo em 2010, com uma das votações mais altas, declarou indicar ao Senado em 2012, um processo emotivo além de político, porque seu pai foi assassinado, pelos paramilitares em 1994, justo quando era senador.

Cepeda é um dos que apontam a uma grande coalizão da esquerda colombiana, porque sabe que se os vários partidos se apresentarem sozinhos, existe o risco de que em 2014 se forme um parlamento sem presença da esquerda: “O Polo Democrático deveria estar em uma ampla coalizão com setores que vão disso que chamam centro-esquerda a outros setores mais ligados a uma esquerda radical. Acredito que o Polo deve estar presente e não deve ser uma ilha neste processo […] Deve-se fazer uma consulta, um mecanismo democrático, para que haja uma só candidatura da esquerda.”

Outro partido, que depois de ter estado a um passo da Presidência, está hoje em grande dificuldade, são os Verdes de Antanas Mockus, o partido que soube interpretar, em 2010, o desencanto frente à política tradicional e à rebeldia contra a politicagem, a corrupção, o clientelismo e a violência. Desde então, o partido perdeu muita força devido a uma série de decisões equivocadas politicamente. Mas segundo analistas consultados por Opera Mundi, em 2014 há uma grande possibilidade de que o atual governador de Antioquia, Sergio Fajardo, fórmula vice-presidencial de Mockus, consiga ser nomeado candidato e chefe do partido.

De todas as formas, no momento, o candidato mais alto segundo a última pesquisa da Datexco, continua sendo o atual presidente, com 40% das preferências, seguido por Navarro Wolf, com 9,5 e Clara López com quase 5%, mas que possui a mais alta imagem favorável entre os colombianos, superando até Juan Manuel Santos. O primeiro dos uribistas é o ex-ministro Óscar Iván Zuluaga, com só 4,4%.