Família de Herzog recebe atestado revisado com causas da morte

A família de Vladimir Herzog recebe nesta sexta-feira (15) uma versão retificada do atestado de óbito do jornalista, morto em 1975, durante a ditadura militar. Na certidão, revisada após determinação da Justiça, passa a constar como causa da morte "lesões e maus tratos sofridos durante o interrogatório em dependência do 2º Exército (DOI-Codi)", que substitui formalmente a versão de "asfixia mecânica por enforcamento".

O ato de entrega do novo documento à família acontece no Instituto de Geociências da USP (Universidade de São Paulo). A viúva do jornalista, Clarice, e os filhos Ivo e André receberão o documento. Vlado, como é conhecido o jornalista, morreu em outubro de 1975 após uma sessão de tortura no DOI-Codi, em São Paulo, mas a versão divulgada pelo Exército foi a de suicídio.

"É uma grande vitória. Quando você tem um atestado mentiroso e é obrigado a aceitá-lo é quase que um processo de humilhação para família", diz Ivo, filho do jornalista. "Nós estamos começando a contar as histórias dessas pessoas que construíram o país livre que a gente vive hoje."

Herzog compareceu espontaneamente ao DOI-Codi após ter sido procurado por agentes da repressão em sua casa e na TV Cultura, onde trabalhava como diretor de jornalismo à época. O jornalista foi torturado e espancado até a morte.

A morte de Herzog gerou protestos, como a famosa missa na catedral da Sé, em São Paulo, e contribuiu para que o presidente Ernesto Geisel e seu ministro Golbery do Couto e Silva vencessem a queda de braço com a linha dura da ditadura, que pedia um aperto na perseguição à esquerda, sob o argumento de que o país vivia a ameaça do comunismo.

Comissão Nacional da Verdade

A alteração no atestado de óbito ocorre após pedido da Comissão Nacional da Verdade da família para que fosse feita a retificação do documento. Em setembro de 2012, o juiz Márcio Bonilha Filho, da 2ª Vara de Registros Públicos de São Paulo, acatou a solicitação e determinou a correção.

A mudança no documento chegou a ser contestada em novembro de 2012 pela promotora Elaine Garcia, que apresentou um recurso para solicitar que o mesmo trecho fosse substituído para "morte violenta, de causa desconhecida". Seu argumento era que os termos "lesões e maus-tratos" não são adequados para documentos legais. A Justiça rejeitou o recurso em dezembro do ano passado.

Para Marco Antonio Barbosa, presidente da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (secretaria de Direitos Humanos) e advogado da família, a retificação do documento é "essencial e importante para a consolidação de um Estado democrático de direito".

Cena forjada

No ano passado, uma reportagem do jornal Folha de S.Paulo, revelou a identidade de Silvaldo Leung, fotógrafo que foi usado pela ditadura para registrar a morte do jornalista.

Segundo depoimento de Leung, a cena do suicídio foi forjada. O fotógrafo, então aluno da Academia da Polícia Civil de São Paulo, disse que não teve liberdade para fotografar o cadáver do jornalista, como normalmente fazem os peritos fotográficos, e alega que foi perseguido.

Fonte: Folha de S.Paulo