Camponês há 52 dias em greve de fome luta por justiça no Paraguai

O camponês paraguaio, Rubén Villalba, há 52 dias em greve de fome, corre riscos de morrer. O líder protesta contra a prisão de 14 camponeses acusados de serem responsáveis pelo massacre de Curuguaty, ocorrido em junho de 2012, quando 17 pessoas morreram. Em carta endereçada a “seus compatriotas”, Villaba exige esclarecimentos sobre o caso e pede unidade aos movimentos sociais para “libertar o país”.

Villaba

De acordo com o médico responsável pelo atendimento de Villaba, ele teve convulsões e perdeu 17 quilos. Internado em um centro hospitalar, o camponês está cada vez mais debilitado por manter sua greve pela libertação de todos os camponeses detidos após o massacre de Curuguaty. Na ocasião, 11 camponeses e seis policiais morreram durante o episódio, que não foi totalmente apurado.

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Outra reivindicação do grevista é que o juiz da causa, Jamil Halid, seja substituído, uma vez que o mesmo possui reconhecidos vínculos com os latifundiários da região, persegue trabalhadores sem terra. Halid é contra a concessão de liberdade provisória para os detidos que estão há nove meses na prisão sem julgamento ou apresentação de provas contundentes de que são eles os responsáveis pelos disparos contra os policiais mortos. Também ignora as denúncias de que ocorreram mortes extrajudiciais depois do tiroteio.

Organizações camponesas, indígenas e políticas também demandam a libertação dos 14 camponeses detidos e a realização de um julgamento justo que inclua os autores intelectuais do fato.

A falta de provas

O ex-presidente, Fernando Lugo, denunciou, em entrevista feita ao jornalista e escritor Marcos Ibañez, autor do livro “Lugo”, que o agente do Ministério Público, Jalil Rachid, encarregado da investigação do massacre, “faz parte de um crime onde as vítimas são punidas e se brinda com proteção os autores morais e materiais, cumprindo com um roteiro político”. Lembrou que o agente é “filho de latifundiário e amigo da família Riquelme”. O fiscal é filho do ex-senador pelo Partido Colorado, Bader Rachid Lichi.

Em janeiro, Jalil Rachid admitiu publicamente ter baseado a acusação feita ao grupo de camponeses apenas nas afirmações dos policiais. “Não temos a declaração dos camponeses, de alguém que tenha vindo declarar e tenha dito eu ‘vi isto’ e ‘aconteceu aquilo’; ninguém se aproximou por medo de ser processado também, porque se esteve no lugar e viu algo, obviamente fazia parte desse grupo ocupante”, declarou.

O advogado de defesa, Guillermo Ferreiro, acrescentou como prova a investigação realizada pela Plataforma de Estudos e Pesquisa de Conflitos Camponeses (Peicc), liderada pelo liberal de linha progressista Domingo Laíno.

Ferreiro disse que tanto policiais como camponeses foram emboscados por desconhecidos quando um grupo de frente da polícia estava reunido conversando com os camponeses. “A versão que todos lemos na imprensa relatava que Rubén Villalba atirou contra o chefe policial Lovera e que assim se inicia o tiroteio. Os policiais que estavam nesse grupo dizem não saber quem atirou, falam em atiradores profissionais e em rajadas. Vários se negam a afirmar ou desmentir que eram camponeses, apesar da insistência dos jornalistas”, disse em entrevista ao jornal argentino Página/12.

Ferreiro disse ainda que o promotor Rashid ocultou a evidência que lhe entregou, na qual se estabelece o uso de armas automáticas. “Essa evidência não aparece nas fotografias que apresentou como provas”. O advogado acrescentou que a perícia realizada pela própria polícia estabeleceu que das armas confiscadas dos camponeses, apenas uma deu positivo à prova do hissopo, ou seja, só uma havia disparo recentemente.

Confira a carta divulgada por Villaba:

Queridos compatriotas. Já sabemos o que aconteceu em Curuguaty. Em 15 de junho de 2012 foram massacrados compatriotas camponeses e policiais em terras públicas de Marina Kue. Neste dia, três camponeses foram executados pela polícia: Fermín Paredes, Ricardo Frutos e Arnaldo Ruíz.

Queridos compatriotas, os responsáveis deste massacre são as cúpulas dos partidos tradicionais: ANR [Associação Nacional Republicana], PLRA [Partido Liberal Radical Auténtico], Unace [União Nacional de Cidadãos Éticos], PPQ [Partido Pátria Querida] e PDP [Partido Democrático Progressista]. Compatriotas: confiamos nestes partidos que organizaram este triste massacre em nosso país? Será que estamos dispostos a entregar nosso voto a estes assassinos? Acreditam nestes liberais que se dizem de centro esquerda? Eles são capitalistas, neoliberais, eles querem privatizar todos os nossos recursos naturais e abrir as portas às transnacionais. O neoliberalismo trouxe mais miséria e morte ao nosso país. Temos que desalojar estes assassinos por meio do voto.

Temos tempo ainda para pensar: Queremos a morte ou queremos a vida? Estes cinco partidos tradicionais representam a morte. Se queremos a vida, votemos com consciência.

Nossa greve de fome é por justiça, por liberdade e pela vida.

Exigimos do Poder Judicial e do Poder Executivo o esclarecimento do massacre de Curuguaty, a liberdade dos 14 presos políticos e de todos os que foram responsabilizados pelo crime.

Neste momento, exigimos a prisão domiciliar para os que seguimos injustamente presos, entre nós, as companheiras Fani Olmedo e Dolores López com seis e oito meses de gravidez presas em Coronel Oviedo. A situação do companheiro Néstor Castro é muito delicada, com 50 dias de greve de fome na prisão “A Esperança”.

Pedimos aos partidos democráticos, progressistas e de esquerda, às organizações populares do campo e da cidade, aos estudantes, indígenas, crianças trabalhadoras, igrejas, e organizações de bairro unidade na luta para libertar nosso país.

Da Redação do Vermelho,
Vanessa Silva