“O povo venezuelano está muito mais consciente”, diz Altman
Há cerca de quatro anos, Nicolás Maduro estava em Cuba com um grupo de brasileiros quando um dos integrantes apontou para ele e fez uma previsão: “Este homem será o presidente da Venezuela”. Baixinho, Maduro respondeu para o brasileiro: “Só se for daqui a 50 anos”.
Publicado 22/03/2013 10:02
Mas, daqui a 20 dias, tudo indica que o autor da previsão, o jornalista Max Altman, foi certeiro. A mais recente pesquisa de intenção de votos na Venezuela dá a Maduro 18 pontos de vantagem sobre o rival Henrique Capriles para a disputa do dia 14 de abril.
Na época da previsão, a presença, o carisma e as conquistas alcançadas pelo governo de Hugo Chávez não encorajavam mesmo palpites como esse.
Agora, se confirmadas as pesquisas, Max Altman diz a este blog que Maduro terá plenas condições de levar adiante o legado de Chávez. “Não é uma tarefa fácil”, admite, mas acrescenta que a consciência do povo venezuelano está mais consolidada do que anos atrás.
Veja abaixo a conversa de Max Altman com o blogueiro e ex-ministro da Casa Civil, José Dirceu, no Blog do Zé.
José Dirceu: A vantagem de Maduro sobre Capriles era esperada até mesmo pela oposição na Venezuela. Mas essa margem de 18 pontos chega a ser surpreendente?
Max Altman: A mim não surpreendeu porque o impacto da morte de Hugo Chávez foi impressionante, e a característica do comportamento do povo venezuelano é que dá a dimensão dessa pesquisa. Foi uma tragédia, um impacto muito forte.
O povo poderia ter agido como na morte de Getúlio Vargas aqui no Brasil; a massa saiu às ruas emocionada e depredou o prédio de redações de jornais. Mas no caso da Venezuela foi diferente. Milhões de pessoas foram às ruas para homenagear Chávez. Em nenhum momento cederam às provocações. E foram muitas as provocações da extrema direita golpista. Por exemplo, duvidando do dia da morte de Chávez, ofendendo gravemente a sua família.
Serenamente, o povo se manifestou para levar o legado adiante. Despertou em mais pessoas o desejo de sair e votar [pela continuidade]. Até certos setores que tinham uma certa simpatia por Chávez, mas estavam em dúvida em relação ao governo, se dispôs a apoiar o Maduro diante do novo quadro.
E do lado de lá, da oposição, há um certo desespero de não poder mobilizar sua tropa. Na perspectiva atual, dizem que é impossível ganhar.
Esse forte apoio a Maduro não pode pesar mais tarde, na forma de cobrança? Ele contará com a governabilidade que Chávez tinha?
São vários aspectos. O primeiro é de que o Maduro não tem é o Chávez, não tem o carisma do Chávez. Mas o conheço suficientemente bem para dizer que é um excelente quadro social ideológico. Tem todas as condições de levar adiante a revolução bolivariana, com o apoio do partido, das Forças Armas e de todas as instituições que estavam respaldando o governo Chávez.
Não é uma tarefa fácil, mas aí entra o segundo aspecto: o povo venezuelano. Tenho ido bastante à Venezuela ao longo destes 14 anos e vejo que o povo está muito mais consciente política e ideologicamente do que alguns anos atrás. E o PSUV, braço político do movimento bolivariano, tem grande capacidade de mobilização.
E o terceiro aspecto que me dá esperança de que o processo continue é que existe um apoio popular muito forte para que as conquistas sociais se consolidem e avancem em outras, na economia, na infraestrutura, na política externa…
A gente viu na grande imprensa uma forte pressão para que Maduro adotasse um caminho diferente do de Chávez. Diante desses aspectos que você citou, parece que isso não vai ocorrer.
A grande imprensa na Venezuela é igual à do Brasil,com a mesma linguagem. Tentaram desestabilizar o governo Chávez e vão fazer de tudo para desestabilizar o de Maduro. Não tenho condições de falar o que vai acontecer, mas tenho fundadas esperanças de que o Maduro possa se afirmar como uma grande liderança. Mas é preciso que se mantenha essa frente unida.
E quais os riscos de essa unidade se romper?
Não vejo essa perspectiva hoje. Uma possibilidade seria uma crise econômica muito grave, mas não é o que se prevê. A base social e constitucional do governo Maduro é muito forte. Nas últimas eleições em 23 Estados, o PSUV ganhou 20.
O Maduro tem uma base política e social em que apoiar para se avançar nesse processo. Vejo com esperança e otimismo o futuro, mesmo levando em conta que vai ser muito difícil substituir o carisma que tinha o Chávez. Mas é preciso levar adiante.
E a oposição?
A oposição não vai desistir, ainda tem força e uma representatividade muito importante, além do apoio dos EUA. Na última disputa com Chávez, Capriles teve 44%, um número significativo.
A oposição tem um peso importante na sociedade e tem os meios de comunicação. Tem dinheiro e um sistema empresarial, as entidades, a hierarquia da igreja. Vão continuar a fazer oposição, não dá para subestimar. A disputa vai continuar.
Qual a vantagem do Maduro? É esse rescaldo popular, esse suporte social forte, a organização do partido capaz de mobilizar amplamente e assim avançar nas conquistas sociais e econômicas. É preciso ir além na infraestrutura, na gestão e diminuir substancialmente a criminalidade e avançar em outros setores, como educação e saúde.
Tudo isso deve ocorrer mantendo-se todas as liberdades de imprensa, de expressão, de organização política, com manifestações pacíficas. Porque essa é uma revolução bolivariana.
Fonte: Blog do Zé