Alexandre Lucas: A cidade se esconde atrás da publicidade‏

Por *Alexandre Lucas

Indiscutivelmente os centros das cidades são locais de grande fluxo de pessoas por concentrarem as demandas de serviço e comércio, sendo alvo privilegiado da tirania comercial da publicidade que, de forma desastrosa e criminosa, vem destruindo o patrimônio arquitetônico e poluindo visualmente as cidades.

As fechadas dos prédios vão sendo tomadas por gigantescas placas como se quisessem sinalizar que quanto maior a placa melhor o produto ou algo similar. Esse fator contribui significativamente para apagar a memória e a temporalidade arquitetônica e favorece o esvaziamento das relações de identidade e pertencimento da cidade.

Os lambe-lambes comerciais, cartazes de diversos tamanhos afixados com cola, agridem a visão e o patrimônio público e privado das cidades. Nada parece escapar dos lambe-lambes comerciais: paredes, postes, telefones públicos, tapumes de construções, abrigos de paradas de transportes coletivos, lixeiras e árvores são alvejados diuturnamente. Os cartazes divulgam produtos e serviços, os mais variados: jogos de búzios, festas, cursos, anúncios de empregos e ofertas de produtos.

É preciso repensar visualmente os espaços urbanos a partir de outra lógica. A partir do combate frontal à poluição visual e a destruição do patrimônio arquitetônico e por outro lado incluir no cardápio visual da população outros elementos que considerem a relação inseparável e “desestática” da arquitetura, urbanismo e das pessoas.

O que abre leque para reconhecer a cidade como galeria aberta para a arte urbana. O espaço urbano é um dos locais privilegiados para pensar a experimentação e circulação das artes visuais como forma de tornar acessível a produção artística para o grande público, tendo em vista que é o lugar de trânsito da população e que interfere na relação/fruição das pessoas no sentido de repensar formas, conteúdos, realidades sociais e criar relações de pertencimento e de identidade. A arte urbana é vista como um trabalho social, um ramo da produção da cidade, expondo e materializando suas conflitantes relações sociais. O que aponta para uma questão essencial que deve ser perseguida pelas gestões públicas que é a garantia da liberdade da diversidade estética e artística da arte urbana que inclui trabalhos tanto de caráter permanentes quanto efêmeros.

Pautar essa questão está na ordem do dia. As casas legislativas municipais devem ser sacudidas para essa reflexão e provocar um grande debate com a sociedade para que possam ser pensados instrumentos jurídicos que assegurem salvaguarda do nosso patrimônio arquitetônico e que as cidades possam ser compreendidas como grandes galerias abertas para arte urbana.


*Alexandre Lucas é pedagogo e artista/educador, atualmente coordena a Célula de Artes Visuais da Secretaria de Cultura do Crato.

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