O estatuto do nascituro e a violência repetida contra as mulheres

 Por Jussara Cony

 A época em que vivemos tem a instantaneidade como marca. Polêmicas diariamente tomam conta de debates e ganham as redes sociais. Opiniões favoráveis e contrárias aos mais diversificados temas são recorrentes nessa nova plataforma de comunicação, que é, sem dúvida, uma das mais democráticas que temos (se não a mais!). Nestes últimos dias, a polêmica maior foi a que envolve o estatuto do nascituro.

Respeito todas as manifestações e posições. O debate fortalece a democracia e sei muito bem o valor de podermos manifestar nossas opiniões livremente. Por isso, por valorizar minha liberdade de opinião e a luta pelos direitos das mulheres que faz parte de minha vida há décadas, considero um grande retrocesso a aprovação do Estatuto do Nascituro (PL 478/2007) na Comissão de Finanças da Câmara dos Deputados. Por que é um retrocesso? Porque, mais uma, vez a mulher torna-se a principal vítima da violência praticada contra ela. Não há lógica nessa proposta, não há como aceitar essa concepção.

De acordo com o projeto aprovado na Comissão de Finanças, e que segue para votação em Plenário, fica dificultado o acesso das mulheres aos serviços de aborto previsto já em lei – e conquistados com décadas de lutas – como nos casos de risco de morte da gestante, de estupro e gravidez de feto anencéfalo. Há que se ter claro que, ao garantir “direitos” ao bebê em gestação e, até mesmo, aos embriões congelados, o projeto viola os direitos das mulheres/mães. Pergunto, então, será justo uma proposta que produz violência psicológica de tamanho impacto ser aprovada? Não, a resposta a mais esta forma de violência é não!

O Conselho Nacional dos Direitos da Mulher manifestou-se afirmando que o estatuto viola os direitos das mulheres e descumpre preceitos constitucionais de previsão e indicação de fonte orçamentária, objeto de discussão naquela Comissão. Mais: fere os princípios dos direitos humanos. Acredito que seja hora de enfrentarmos alguns temas suscitados por este projeto de lei com coragem e responsabilidade. Fugir de determinados temas, é fugir da realidade que o mundo vive e a política, para mim, precisa ser a representação e consequência do que a sociedade vive.

Jussara Cony é vereadora PCdoB/Porto Alegre