Ministro de Israel ameaça o governo e palestinos pedem clareza

O presidente palestino Mahmoud Abbas prometeu, nesta segunda-feira (22), que qualquer acordo de paz com Israel será submetido a um referendo, mas oficiais também informaram que as negociações ainda dependem de mais esclarecimentos sobre a postura israelense. Do outro lado, desacordos dentro do governo de Israel ameaçam a estabilidade política e determinam divergências sobre as bases fundamentais (para ambas as partes) para a retomada das negociações.

Por Moara Crivelente, da redação do Vermelho

Prisioneiros em greve de fome - Reuters

“Os Estados Unidos estão falando sério sobre alcançarmos uma solução política à causa palestina ao estabelecer um Estado da Palestina baseado nas fronteiras de 1967, com Jerusalém Leste como a sua capital”, disse Abbas em entrevista a um diário jordaniano.

Além disso, o presidente palestino também afirmou que “uma solução [sobre] a segurança precisa tirar Israel permanentemente das terras palestinas, enquanto o Estado judeu tem o direito de preservar a sua segurança dentro das suas fronteiras, com a aprovação dos países vizinhos”, referindo-se ao compromisso assumido pela Liga Árabe de normalização das relações com Israel em troca da solução da questão palestina.

A menção a um “Estado judeu” também sinaliza uma posição fundamental. O discurso oficial e nacional rechaça completamente o reconhecimento exigido por Israel de um Estado judeu, uma vez que milhares de palestinos vivem nos territórios definidos como israelenses a partir de 1948, e poderiam ficar oficialmente segregados pelas leis do país com este reconhecimento. A categoria social de “não-judeu” já é evidenciada inclusive por israelenses como altamente segregadora.

A última rodada de negociações entre Israel e Palestina foi interrompida em 2010, pelo mesmo motivo hoje considerado determinante pela posição palestina: a recusa israelense de congelar a construção de colônias judias em territórios palestinos. Atualmente são mais de 350.000 colonos israelenses vivendo na Cisjordânia, o que tem sido reiterado por palestinos e observadores internacionais como uma grave preocupação com relação à viabilidade de um Estado da Palestina independente.

Além do congelamento da construção em território palestino, o presidente Abbas também colocou sobre a mesa a exigência da libertação de prisioneiros palestinos detidos ainda antes dos Acordos de Oslo, de 1993, alguns há quase 30 anos. Israel havia indicado que libertaria “alguns” prisioneiros “gradualmente”, e o número mencionado nesta segunda pelo jornal israelense Ha’aretz é de 82 pessoas.

Entretanto, assim como do lado israelense, entre os palestinos atores importantes para o processo afirmam rejeitarem a proposta de negociações. O Hamas, partido que governa a Faixa de Gaza desde 2006, após uma ruptura política com o Fatah (partido predominante no governo nacional), já afirmou que as negociações, com a mediação dos EUA, servem para ludibriar os palestinos e convencê-los de que existe compromisso, ao invés da perpetuação da ocupação.

Do lado israelense

O primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, afirmou neste sábado (20) que retomar as negociações com os palestinos é “um interesse estratégico vital para o Estado de Israel", embora a sua falta de compromisso com uma solução “definitiva” seja patente, após décadas de perpetuação de um “status quo” favorável a Israel, inclusive em tempos de negociações consideradas determinantes à sua época.

O ministro israelense de Relações Internacionais e Assuntos Estratégicos, Yuval Steinitz, disse também neste sábado que Israel libertará um número limitado de presos palestinos devido ao acordo para reiniciar as conversas de paz, mas negou que se tenha aceitado as fronteiras de 1967 para negociar.

"Não há nenhuma opção de nós aceitarmos entrar em alguma negociação que comece por definir as fronteiras territoriais ou com concessões por parte de Israel, incluído o congelamento da construção" de assentamentos, disse Steinitz, o que reforça o ceticismo de alguns palestinos e analistas internacionais sobre a retomada das negociações.

Além disso, em meio ao otimismo disseminado pela mídia internacional, atores internos e determinantes como os representantes dos colonos no governo israelense demonstram profunda insatisfação com a notícia sobre um acordo para a eventual retomada das negociações.

O ministro da Economia israelense Naftali Bennett, do partido nacionalista ultra-ortodoxo Lar Judeu e ex-líder de organizações de colonos ameaçou, nesta segunda (22), tomar medidas que podem derrubar o governo de coalizão formado no começo deste ano, como a promessa de que o seu partido votará contra o orçamento do Estado.

A exigência de Bennett, que emite frequentemente declarações contundentes contrárias às negociações com os palestinos e a favor das medidas de ocupação sionista (colonialista) da Palestina, é a realização imediata de um referendo sobre a retomada dos diálogos.

O ministro não é o único com posturas negativas a respeito das negociações com os palestinos, e a continuidade da construção de colônias, assim como a negativa sobre o reconhecimento das fronteiras como ponto de partida são evidências da profunda divisão interna ao governo israelense sobre a postura oficial com relação à questão.

Por esses motivos, e pela histórica frustração dos palestinos com as sucessivas negociações dentro de um chamado “processo de paz”, oficiais palestinos já emitiram ressalvas sobre os atuais “esforços” de Kerry: as negociações só serão retomadas após maiores esclarecimentos sobre a postura israelense acerca das questões fundamentais.