Processo de libertação dos presos palestinos deve ser humanizado

“Eu espero para ver Karim e Maher Younis, Walid Daka e todos os outros 14 prisioneiros árabe-israelenses que têm estado encarcerados desde antes dos Acordos de Oslo [de 19993] saírem da prisão. Daka, por exemplo, eu conheço, e sei quão revoltosamente injusto seria mantê-lo atrás das grades”, escreve o jornalista israelense Gideon Levy, para o jornal Ha’aretz, nesta quinta-feira (1º/8). Nas discussões sobre a retomada das negociações, a libertação dos prisioneiros palestinos toma posição central.

Prisioneiro palestino - Itzik Ben-Malki

“Há poucos atos de injustiça semelhantes à detenção continuada [dos prisioneiros palestinos]; poucos atos de discriminação maiores do que aqueles que eles enfrentaram”, continua Levy. “Depois de 30 anos, no caso dos primos Younis, e de 27 anos (Daka), o tempo da compaixão e da humanidade finalmente chegou para eles também”, enfatiza.

O discurso público sobre a libertação dos prisioneiros palestinos tem tudo, para o jornalista, menos “compaixão e humanismo”.

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“A desumanização alcança o seu pico: são todos assassinos, pessoas monstruosas com as mãos sujas de sangue; não importa o que fizeram, e há quanto tempo estão presos. Não importa o que outras pessoas fizeram enquanto combatiam pela liberdade ou crenças, inclusive o seu próprio povo (como o terror judeu de antes de 1948, ou os colonos terroristas desde então)”, contrapõe.

Para Levy, a campanha difamatória contra os prisioneiros palestinos tem um objetivo claro: “pretende lembrar aos israelenses que os palestinos não são pessoas”. E a campanha faz uso dos casos de indignação, das famílias atingidas por ataques realizados por grupos palestinos de resistência contra a ocupação, para “acender as paixões”, a revolta contra a libertação dos prisioneiros, dentre os quais muitos não foram julgados de forma conclusiva como autores de ataques.

“Este espetáculo só tem espaço para uma voz, e é a da oposição. Mesmo as famílias [israelenses] afetadas, mas que pensam de outra forma, não são consideradas”, diz o jornalista.

Alguns dos prisioneiros, ainda que julgados e condenados, já deveriam ter sido libertos há muito tempo, relembra, mas “o público os colocou todos em uma grande cesta de ódio”, e assim, “Israel criou mais um tabu para si própria”.

Os prisioneiros mencionados por Levy são palestinos que adquiriram a cidadania israelense, e que vivem em territórios só denominados “israelenses” após o estabelecimento do Estado de Israel, em 1948. O processo de aquisição da cidadania para palestinos que escolhessem permanecer em Israel foi parte do Processo de Oslo, do início da década de 1990, que deveria ter sido concluído pouco depois, o que não aconteceu até hoje.

“Quando seu pai estava no leito de morte, Daka nem sequer pôde se despedir, por telefone. Não um único prisioneiro judeu que tenha recebido tão grave punição”, diz Levy, ao informar que Daka foi condenado por sequestrar e matar um soldado, enquanto o israelense Ami Popper foi condenado por matar sete trabalhadores. Popper, entretanto, recebeu uma licença, apenas por ser judeu.

Yoram Skolnik, outro exemplo dado pelo jornalista, matou um palestino em 1993, mas já foi liberado há muito tempo. E ainda levou anos para que as autoridades israelenses determinassem a sentença de Daka (37 anos). “Até o assassino do [primeiro-ministro] Yitzhak Rabin [em 1994], Yigal Amir, pôde passar momentos com a sua esposa. Daka não pôde”, porque é árabe, enquanto Amir é judeu.

“Agora, há uma chance de consertar as coisas. Libertar 14 prisioneiros, que serviram todos mais de 20 anos, não é apenas um ato de justiça para eles, mas um passo da direção certa para a comunidade árabe-israelense, que enfrenta a discriminação também na prisão”, diz Levy.

Com Ha'aretz
Moara Crivelente, da redação do Vermelho