Orlando Sena: Cine Holliúdy do Ceará

Orlando Sena faz uma breve análise do sucesso de público do filme cearense "Cine Holliúdy"e seus impactos no futuro do cinema.

O assunto mais comentado no setor audiovisual neste momento é o filme cearense Cine Holliúdy, maior bilheteria do País em relação ao número de cópias no último fim de semana (9, 10 e 11 de agosto). Com apenas nove cópias lançadas em Fortaleza, alcançou uma media de 2.702 espectadores/cópia, superando de longe os “filmes de mercado” lançados no mesmo período. Peculiaridade: o filme é legendado porque é falado em “cearencês”. Comédia de baixo orçamento, artes marciais e belas paisagens, o filme é mais uma façanha do diretor Halder Gomes, um campeão de surpresas.

A primeira vez que ouvi falar desse cearense, mestre em taekwondo, dublê de filmes de ação em Hollywood, foi na segunda metade da década de 1990. Eu estava trabalhando no Instituto Dragão do Mar, em Fortaleza, e Sílvio Gurjão, um dos alunos do Centro de Dramaturgia do instituto, desenvolveu o roteiro de No calor da Terra do Sol, na verdade Sunland Heat, de Halder, coprodução Brasil-EUA falado em inglês e “cearencês”, onde os personagens disputam seus dramas em um enfrentamente da capoeira com artes marciais orientais. O filme, de 2004, correu mundo nas telas da TV. Em 2011 Halder codirigiu com Glauber Filho, sempre no Ceará, As mães de Chico Xavier, sobre mediunidade, produção super modesta e surpreendente bilheteria, um dos filmes brasileiros mais vistos naquele ano.

E agora Cine Holliúdy, tema de reflexões e debates mercadológicos, provocando a Ancine-Agência Nacional de Cinema a estudar um modelo de distribuição localizado e com poucas copias. Sabemos que a bilheteria dos cinemas já foi a fonte de retorno financeiro mais importante da indústria audiovisual e que hoje não é mais. Não é mais uma arrecadação direta substancial, a não ser para blockbusters transnacionais, mas é a vitrine para as outras janelas de exibição, o que mantém sua importância no mercado multimídia. Filme que vai bem nos cinemas faz boa carreira no sistema de janelas da TV (on demand, assinatura, aberta), dvd, blue-ray, etc. Ou seja, com seu arranque espetacular na medida espectadores/cópia, Cine Holliúdy já garantiu bom posicionamento nas janelas subsequentes e se seguir com o mesmo pique nas próximas semanas será um filme pequeno (barato) faturando como os grandes (caros).

Ressalto dois aspectos desse case do cinema regional brasileiro. Primeiro, todo e qualquer filme tem um público na “cauda longa” do universo audiovisual da atualidade, e a inteligência da questão é localizar esse público (como fez a Downtown, distribuidora de Cine Holliúdy, lançando-o de maneira compacta e viralizando nas redes sociais). Segundo, a distribuição/exibição tradicional de filmes está mesmo chegando ao fim e o setor está inquieto, borbulhante, inventando e testando novos modelos de negócios, preparando-se para o desaparecimento total dos suportes físicos e para a exibição múltipla a partir de um ponto de emissão digital. Pois, é muito bem vindo esse Cine Holliúdy made in Ceará, a Terra da Luz.

*Orlando Sena é jornalista, roteirista de cinema efoi diretor do Instituto Dragão do Mar, em Fortaleza.

Leia também: Cine Holliúdy: um fenômeno cearense nos cinemas

* Opiniões aqui expressas não refletem necessariamente as opiniões do site.