Intervenção contra a Síria é ponderada pela repetição agressora

Esta semana começou turbulenta na questão síria. A proposta russa de entrega do arsenal químico, na segunda-feira (9), foi aceita pela Síria, e o discurso desta terça (10) do presidente Barack Obama (encurralado por mais uma alternativa ao uso da força), sugere a suspensão da intervenção militar. Indisposta a abrir mão da agressão, a França rascunhou uma resolução do Conselho de Segurança, com o prazo de 15 dias para a proposta russa.

Por Moara Crivelente, da redação do Vermelho

François Hollande e Barack Obama - AFP

O secretário de Estado norte-americano, John Kerry, deve encontrar-se com o seu homólogo russo em Genebra, Suíça, nesta quinta-feira (12), para discutir a proposta que Serguei Lavrov fez ao chanceler sírio, Walid Muallem, para a entrega do arsenal químico da Síria. Também no banco dos intervencionistas, o premiê britânico David Cameron, entretanto, disse que o plano pode ser um “truque” para distrair o mundo de uma ação militar.

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Uma resolução do Conselho de Segurança já rascunhada antes pela França, previa exatamente a entrega das armas dentro de 15 dias, prazo em que o governo do presidente Bashar Al-Assad deveria dar explicações e informações sobre todo o seu arsenal, estimado em cerca de 1.000 toneladas do gás Sarin e de outro tipo de agente nervoso.

Na noite de terça, diplomatas franceses dedicavam-se à conclusão do rascunho a ser considerado pelo Conselho de Segurança, centrado no prazo de duas semanas, de acordo com o jornal britânico The Independent. A suspensão da intervenção militar, assim, confirma-se momentânea e ainda sem uma estrutura definida em termos de acordo.

No discurso que pronunciou, também por ocasião do 12º aniversário dos ataques terroristas às torres gêmeas, em Nova York, Obama disse foi a ameaça direta de uma intervenção dos Estados Unidos o que levou o governo sírio a optar pela proposta diplomática da Rússia, embora esta tenha sido a opção reiterada pelas autoridades sírias (em discursos para surdos) desde o início do conflito armado, em 2011.

“Por quase sete décadas, os EUA têm sido a âncora da segurança global”, disse, quando ressaltou também que não se trata apenas de diplomacia, mas da capacidade de tronar os acordos compulsórios. Por outro lado, as vítimas do imperialismo e das intervenções militares norte-americanas cansaram-se de demonstrar, de todas as formas possíveis (inclusive com estatísticas), que a virtual onipresença estadunidense não fez mais do que aumentar a insegurança, em todos os aspectos do conceito.

Para citar um exemplo neste 11 de Setembro, 12 anos após sofrer a invasão estadunidense, o Afeganistão está mais dividido, mais instável e assiste à maior propagação de grupos armados, entre fundamentalistas e paramilitares, assim como contabiliza o aumento exponencial da produção de heroína, integrada ao crime organizado internacional. Não admira que o grupo Talibã, presente em mais países da região, tenha dificuldades em manter negociações com o governo afegão, dada a possibilidade de os EUA manterem tropas no país após 2014.

O presidente Obama busca garantir algum apoio à possível intervenção, principalmente ao tentar “incitar” os cidadãos, o que já tem sido orquestrado pela cobertura desinformada, manipulada do sofrimento sírio. “As imagens do massacre são doentias: homens, mulheres, crianças deitados em fileiras, mortos por gases venenosos; outros espumando pela boca, tentando respirar; um pai abraçando seus filhos mortos, implorando-lhes para levantar e caminhar”, disse Obama, na tentativa de dar exemplos bastante gráficos dos vídeos do Youtube que recomendou aos estadunidenses.

Interessante foi que a revista The Economist (cuja capa, com corpos empacotados por trás de uma foto de Assad, declarava “Ataque-o com força”) fez a mesma descrição da “barbárie”, há uma semana (quando a intervenção militar era iminente), com matérias de linguagem estratégica que explicavam os modelos, quantidades e posicionamento dos arsenais estadunidenses que fariam os ataques “cirúrgicos” contra o governo ditador e "bandido" da Síria, sem a necessidade de envio de soldados. A história se repete, e a mídia cumpre seu papel incitador na agressão, sem tanta reflexão sobre a violação da soberania de um país e sobre o seu impacto devastador, ou fatal, sobre os civis.

O apelo para que os estadunidenses assistam aos vídeos horrendos divulgados na internet foi um ponto chave. Obama admitiu que a opção pela ação militar é impopular nos Estados Unidos (o que é evidente pelas manifestações de rua e pelos apelos e até ameaças dos congressistas para a votação sobre o tema), mas também disse que o “horror” das armas químicas significa que os EUA não podem ignorar a situação, outra vez recorrendo à ideia de polícia do mundo, claramente direcionada a uns, mas não a outros.

Neste caso, dona de um arsenal nuclear desconhecido, Israel encontra-se dividida entre os que apoiam o uso da força contra a vizinha Síria, com quem tem suas próprias contendas (além de refletir sobre o aspecto mais abrangente, de extensão da agressão ao Irã), e os que se preocupam com os efeitos da escalada para os israelenses. De acordo com o jornal Haaretz, até mesmo o lobby judeu nos Estados Unidos está dividido.