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Luisa Barbosa: O começo do fim

Parte 1
“O capitalismo se transformou num sistema universal de subjugação colonial e de asfixia financeira da imensa maioria da população do planeta por um punhado de países “avançados”. A partilha desse “saque” faz-se entre duas ou três aves de rapina, armadas até aos dentes (América, Inglaterra, Japão), que dominam o mundo e arrastam todo o planeta para a sua guerra pela partilha do seu saque.” Lênin.
Por Luisa Barbosa Pereira*

Os que militam comigo e tem acompanhado as discussões que tenho feito nesse rico processo da nossa vida partidária sabem que neste congresso estou obcecada pelo debate sobre as manifestações recentes do Brasil e no também do mundo, sua possível marca anticapitalista, sua relação com a crise sistêmica em curso….

Entretanto, a pertinente onda leninista dessa tribuna dedebates me instigou a compartilhar também alguns dados de uma pesquisa que venho realizando, calcada na teoria leninista, sobre os grandes monopólios que dominam o sistema capitalista desde o início do século 20. Sob uma perspectiva menos aparente e mais radical, que vai à raiz dos acontecimentos em curso no sistema capitalista desde o final de 2007, tanto a atual crise mundial quanto as manifestações recentes no Brasil podem ser conectadas à formulação de Lênin sobre a fase do capital monopolista e a fusão entre capital produtivo e bancário, exposta na obra Imperialismo, etapa superior do capitalismo [1]. É esse exercício que pretendo realizar aqui.

Com base em vastos estudos de diferentes autores, Lênin vai demonstrar que o cenário mundial do capitalismo no início do século 20 deu início a um novo momento desta economia. Momento este permeado de monopólios, cartéis e trustes, que impediam a realização do principal ideário do sistema: a livre concorrência.

Lênin demonstra que os monopólios criados neste período passaram a controlar as matérias primas mais importantes do mundo e tornaram ainda mais fortes as contradições entre os cartéis e os não cartéis, esmagando os segundos. Tal concentração da produção levou ainda a fusão entre o capital bancário e o capital industriais, num cenário em que os bancos se tornam cada vez mais importantes e passaram a ter controle sobre todas as atividades, financeiro ou não, das companhias. Com isso passaram a definir também as condições de empréstimo, financiamentos e benefícios, de acordo com seus interesses. [2]

Nesse contexto, as associações capitalistas monopolistas, como cartéis, trustes e mesmo sindicatos patronais, passaram a dividir entre si o mercado mundial e a investir na exportação de capitais. Assim, realizam desde então acordos para garantirem lucros seguros e se tornarem menos vulneráveis às oscilações do mercado, competições e dificuldades exteriores ao mercado como qualidade das safras, bruscas variações climáticas, tragédias ambientais…
No período mais recente, um amplo estudo [3] realizado por pesquisadores do Instituto Federal de Tecnologia de Lausanne, Suíça, concluiu que 147 grandes corporações transnacionais controlam 40%, da economia mundial.

Os autores iniciaram a pesquisa com a análise das 43.060 principais corporações transnacionais localizadas em 116 países e identificadas como tal segundo dados de 2007 da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Os autores revelaram que um núcleo central de 1.318 grandes empresas possui conexões com duas ou mais outras empresas. Evidenciaram ainda que cerca de 3/4 do núcleo de proprietários dessas empresas são proprietários também de outras. Ou seja, as empresas permanecem no mesmo núcleo de poder onde, de forma acumulada, detêm a participação majoritária ou minoritária do outro. As principais corporações possuem ainda 80% do controle das relações comerciais. De um ponto de vista geográfico, estas grandes corporações estão localizadas nos Estados Unidos e em um número restrito de países da Europa.

Assim, apenas 147 empresas controlam 40% da riqueza total do núcleo central das 1.318 empresas citadas, ou seja, uma pequena parcela das empresas controla quase a metade de todo o núcleo! As empresas, que em sua maioria são bancos, atuam de forma interligada. Entre elas estão as norte americanas JP Morgan Chase & CO., o grupo Goldman Sachs; o Deutsche Bank e a Allianz SE da Alemanha; o grupo Lloyd da Grã-Bretanha, e a Mitsubishi, do Japão. Com muito poder, as oligarquias financeiras dominam a estrutura produtiva e a esfera da financeira.

A presente crise, que começou em 2007 e parece estar longe do fim, tem como seus componentes principais a especulação e a financeirização. Para desespero de muitos economistas e acadêmicos, é o desenvolvimento do que Lênin já anunciava na primavera de 1916, pouco tempo antes da Revolução Russa. Lênin, Marx e Engels estavam mesmo certos.

O Brasil, que infelizmente não se encontra apartado da realidade capitalista mundial, sente os reflexos da crise. Não tanto quanto gostaria Merval Pereira, Miriam Leitão e os agentes do PIG, de fato, mas a crise tem impacto direto sobre a renda da população, o preço dos alimentos e o custo de vida. Apesar da política de aumento real do salário mínimo (segundo o Dieese de 68% desde o governo Lula até hoje), do crescimento significativo do emprego formal e da retirada de 20 milhões de pessoas da pobreza, o recente anúncio de reajuste médio de 2,5% do salário mínimo será o menor ganho salarial dos últimos nove anos no Brasil. O crédito, expressão clara da financerização da economia, cresceu 563% nos últimos 10 anos (!) e tem se apresentado como estratégia principal para desenvolver o país e enfrentar a crise.

As manifestações recentes que tem ocorrido no Brasil e no mundo são também influenciadas por este momento histórico. Como já ressaltou Marx, Lênin, Engels, e a história comprovaram, as crises do capitalismo abrem oportunidades para mudanças, mobilizações de massa e até mesmo revoluções. Os exemplos são muitos. Tais manifestações estão longe de ter apenas uma motivação moral, comportamental ou ser reflexo da mobilização virtual. Estão com os pés fincados nas relações econômicas.

Notas:
[1] Lenin, Vladimir Ilich. "O Imperialismo etapa superior do capitalismo". Campinas, SP: FE/UNICAMP, 2011.
[2] Idem. p. 138-159
[3] S. Vitali, J. Glattfelder e S. Battistoni. "The Network of Global Corporate Control", Sept. 2011.

*Luisa Barbosa Pereira é militante do PCdoB Contagem.